sábado, 13 de agosto de 2022

Picos de Europa ... versão Caminheiros Gaspar Correia

Ao longo de vinte anos - entre 1982 e 2002 - calcorreei por várias vezes os Picos de Europa, em família, com amigos, e, maioritariamente, com grupos de alunos. Depois ... passaram-se quase outros vinte anos ... até que as peregrinações entraram na minha vida e que, em Julho de 2021, decidi atravessar os Picos de Europa a pé, no meu primeiro Caminho de Santiago a solo. E a travessia dos montes cantábricos a pé ... fez nascer a ideia de levar a minha "família" caminheira - os Caminheiros Gaspar Correia - aos Picos de Europa. Em diversas actividades de verão, entre 2005 e 2017, já os tinha levado por três vezes a Somiedo, mas também aos Pirenéus, a Sanabria e às terras de Miranda, ao Gerês ... e a uns "olhares" sobre os Caminhos de Santiago. Chegara a vez de os levar aos Picos...
Barragem de Riaño, rio Esla, 5.Agosto.2022, 16h50 - Há um ano também passei por aqui ... a pé
Começada a montar a logística desde há largos meses, a 5 de Agosto partíamos de Lisboa para uma longa jornada que nos levaria às terras leonesas de Cistierna, Riaño, Portilla de la Reina ... terras que há um ano fizeram parte do meu périplo pedestre ... e que agora eu via passar muito mais rapidamente. Éramos meia centena de "gasparito(a)s", de idades e com capacidades diferentes, uns da velha guarda do grupo, outros recentemente "adquiridos", mas todos unidos pelo sabor da Amizade e da vontade de conViver. Meia centena certa ... porque o motorista do autocarro também fez parte da "família" 😀

1ª "aventura" em terras leonesas, 6.Agosto.2022 - Valles de Lechada e del Naranco, entre Llánaves e Portilla de la Reina
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O Hotel San Glorio, no pequeno pueblo de Llánaves de la Reina, a 1400 metros de altitude, recebeu-nos para as primeiras duas noites e para a primeira jornada pedestre. Os caminheiros mais afoitos percorreram o PR 22 - Valles de Lechada e del Naranco; os menos aventureiros tiveram uma jornada mais curta, pelo PR 23 - Arroyo de Orpiñas. E todos terminámos em Portilla de la Reina ... no bar do Albergue onde há um ano terminei etapa, no meu Camino Vadiniense.
Recuando vinte anos no tempo, no dia seguinte levei os "gasparitos" ao Puerto de San Glorio e a descer a pista de Cosgaya, rumo ao precioso vale de Camaleño e ao rio Deva. E um ano depois do meu Caminho Lebaniego, voltava às terras de Liébana ... em "excursão gasparita" 😄

Puerto de San Glorio e Collado de Llesba (1685m alt.), 7.Ago.2022, 11h20 ... com todo o maciço oriental dos Picos de Europa diante de nós ,,, no monumento em homenagem ao urso pardo cantábrico
Desde o Collado de Llesba descemos a cabeceira do rio Cubo, através de frondoso bosque do qual agradecemos as sombras. Sim, porque o calor acima do normal não é só em Portugal...

Descida da pista de Cosgaya, do Collado de Llesba ao vale de Camaleño, 7.Ago.2022
Cosgaya, 16h15 - Tínhamos descido cerca de mil metros de desnível ... ao encontro da estátua de Pelágio
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O autocarro esperava-nos em Cosgaya, na estrada do vale do Deva. Tínhamos entrado na Cantábria ... e as próximas 4 noites seriam no Hotel Infantado, em Ojedo, a menos de 2 km de Potes, capital de Liébana e autêntica vila medieval, à qual dediquei o dia seguinte ... além, claro, do Mosteiro de Santo Toribio de Liébana, meta do Camino Lebaniego ... o "meu" 1º Caminho de Peregrinação completamente a solo. Voltar ali, um ano depois, embora num contexto diferente, muito mais turístico e muito menos peregrino, foi apesar de tudo um momento intenso ... sentido, partilhado ... Vivido. E tal como então, descemos a pé da Ermida de San Miguel a Congarna e ao rio Deva, para então sim passarmos o resto do dia em Potes.

Um ano depois ... voltei! Mosteiro de Santo Toribio de Liébana, onde se venera o Lignum Crucis
Ermita de San Miguel, sobre o vale de Camaleño, de onde descemos a pé a Congarna e à estrada do Deva
Potes, 8.Ago.2022 ... a vila medieval ... uma das jóias arquitectónicas da Cantábria, na confluência dos rios Deva e Quiviesa
Com base no Hotel Infantado, os dois dias seguintes eram dias de "aventura": a "aventura" do teleférico de Fuente De, descendo depois a pé até Espinama, e a "aventura" em 4x4, no dia 10 ... subindo o que há um ano subi a pé, no meu Camino Vadiniense, antes da ultra famosa Ruta del Cares.

Subida no teleférico de Fuente De (1823m alt.) para o percurso dos Puertos de Áliva, 09.Ago.2022
Chalet Real de Afonso XIII, ao longo da descida para os Puertos de Áliva
Não estamos sós na montanha ... e no Hotel Áliva, onde faríamos a pausa de almoço
E pelos Puertos de Áliva vamos descendo o vale do Nevandi, rumo a Espinama
Espinama, 17h00, com mais 11 km percorridos desde a estação de El Cable
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Espinama trazia-me mais memórias do Camino Vadiniense. Foi a base daquela que considerei a etapa rainha, a subida às Horcadas de Valcavao, de onde seguiria para as terras leonesas de la Reina. E a subida a Valcavao ... seria a primeira parte da "aventura" TT do dia seguinte. Distribuídos por 8 jeeps, a "malta gasparita" só diferia da malta de há vinte e mais anos ... pela média de idades... 😂
Às 8h30 da manhã saímos assim com a Picostour para 55 km 4x4 ... começando por voltar a Espinama e a Fuente De, onde começam as pistas de montanha. Mas, mais uma vez ... a mim parecia-me ver passar tudo rápido...
10.Ago.2022 - Subida em 4x4 às Horcadas de Valcavao (1780m alt.), com Santa Marina de Valdeón ao fundo, no vale.
No dia 25 de Julho de 2021 - Dia de Santiago - fiz esta mesma épica subida ... mas a pé.
Descida para Caín, ainda nos jeeps, passando pelo Chorco de los lobos. Em Caín íamos começar a Ruta del Cares
A Ruta del Cares, também chamada a "Garganta Divina", é um dos percursos pedestres mais famosos da Península Ibérica ... e um dos mais concorridos. Várias vezes o percorremos, eu e a caminheira que acompanha a minha vida, em família ou com alunos e amigos ... mas agora há 20 anos que não apontávamos os nossos horizontes para ali ... e 20 anos levaram a memória de um piso relativamente técnico em vários troços, particularmente na parte final do sentido em que o fizemos, de Caín a Poncebos. Mas os 49 "gasparitos" chegaram todos às cañas fresquinhas do bar "Garganta del Cares".
Garganta del Cares, ou Garganta Divina, entre Caín de Valdeón e Puente Poncebos
No final, em Poncebos, esperavam-nos as cañas ... e os 4x4 para o regresso a Potes
E que belo final de dia de "aventura", 10.Ago.2022, 19h55
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Além da "aventura" pedestre e TT, cruzámos três regiões autónomas no mesmo dia: Cantábria, Leão e Astúrias! E o regresso à Cantábria, de novo nos 4x4, foi ao longo do Desfiladeiro de La Hermida, o mais longo de Espanha, que no dia seguinte repetiríamos de autocarro, já que o dia 11 era o da subida à aldeia de Bulnes, aldeia que não tem qualquer acesso rodoviário, pelo que só se chega a pé ... ou de funicular, construído em 2001. E assim, todos subimos no funicular, à descoberta daquela aldeia "perdida" e do seu miradouro para o pico mais conhecido e mais emblemático dos Picos de Europa, que aliás recebeu o nome da aldeia: o Naranjo de Bulnes, ou Pico Urriellu, com 2518 metros de altitude.

Na aldeia isolada de Bulnes e, ao fundo, o Pico Urriellu, o Naranjo de Bulnes ...
... e no Miradouro da Lallende, em Bulnes de Arriba, sobre o desfiladeiro do rio Texu
Desde Bulnes, um pequeno grupo voltou a descer no funicular, enquanto os mais afoitos desceram a pé pelo único caminho de acesso à aldeia até 2001, ao longo do desfiladeiro do rio Texu, afluente do Cares. Numa tarde de Sol e de calor demasiado para as montanhas ... neste grupo houve até banho, nas águas límpidas mas geladas que descem para o Cares.

Descida de Bulnes para Poncebos, ao longo
do desfiladeiro do Texu, afluente do Cares
Ponte medieval de la Jaya, sobre o Rio Cares, no qual desagua o Texu
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O dia 11 reservava-nos ainda uma curta visita a Cangas de Onís e o alojamento no Parador Nacional, situado no antigo Mosteiro de San Pedro de Villanueva. Como em vários troços destes dias pelos Picos andámos em Caminhos de Santiago ... nada melhor do que umas conchas de vieira com recheio de caranguejo, para entrada do luxuoso jantar 😍
Cangas de Onís, 11.Ago.2022, 17h50
        Covadonga e Lagos
Antes do dia de regresso, o oitavo dia tinha-o dedicado a Covadonga e aos respectivos lagos de montanha. Para subir aos lagos no nosso autocarro é necessária, no verão, autorização especial, que naturalmente levávamos. Assim, começámos por subir directamente aos "velhos" lagos Enol e Ercina, onde também já não ia há 20 anos e junto aos quais fizemos a última caminhada desta "ronda".

Lago EnolCovadonga, 12.Ago.2022, 10h20
Lago de la Ercina, 12h20
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Estátua de Pelágio, Covadonga
Ao fim da manhã descemos para os lugares Santos de Covadonga, onde se iniciou a Reconquista Cristã da Península.
Basílica de Santa María La Real de Covadonga, 13h35
A actividade de verão dos Caminheiros Gaspar Correia estava a chegar ao fim. Faltava ... Oviedo, capital de Astúrias ... meta do Caminho de San Salvador ... ponto de partida do Caminho Primitivo. Percorri um e outro em 2017, a última vez que tinha estado em Oviedo. Foi assim com alguma emoção que cheguei à grande Catedral de San Salvador ... que vi peregrinos a chegarem ou sentados na praça. O Caminho faz parte de nós ... e nós fazemos parte do Caminho.
12.Ago.2022, 17h35 - Catedral de San Salvador de Oviedo ... origen del Camino
E como o Caminho tem os seus desígnios e mistérios, a minha entrada na Catedral de San Salvador teve um episódio ... que só acontece no Caminho! A entrada na Catedral de Oviedo é paga. Casualmente, eu tinha vestido naquele dia uma tshirt alusiva ao Caminho de Santiago; o funcionário perguntou-me, por isso, se eu era peregrino; respondi-lhe que naquele dia não, embora já tivesse feito os Caminhos do Salvador e Primitivo ... e ele disse-me para entrar com bilhete de peregrino, a custo zero. E assim fui rever a Catedral que, desde o início do Séc. IX, é a Origen del Camino; e assim fui rever, na Câmara Santa, a Cruz de los Ángeles. Histórias e estórias dos Caminhos... 🙏
Oviedo marcou o final das actividades propriamente ditas. O dia 13 foi o coming home, a viagem de regresso. Mas o final do último jantar, no Gran Hotel España de Oviedo, teve momentos emotivos. Acerca desses momentos, eu queria dizer cem palavras, mil palavras ... mas fiquei sem palavras; não há palavras para o que senti e sinto. Como tão bem cantava o Patxi Andion...
     Palabras
     No he dicho grandes cosas...
     porque no me habrian salido
     Ya sabes ... cosas de viejos...
Sem palavras ... direi portanto as cem, as mil ... direi todas as palavras sem voz ... todas as que o coração sente. Sem palavras ... direi apenas bem hajam a todos os que me acompanharam ... direi apenas obrigado ... um grande Obrigado ... obrigado por existirem e por fazerem parte da minha família caminheira🌟💖
Direi também que, tal como na Cruz do Salvador (ou da Vitória) ... todos nós somos o Alfa e o ómega ... tudo o que somos e fazemos ... o início e o fim ... até porque o fim é sempre um início ... um começar de novo.
O Universo é Inteligente ... e a Vida é Bela ☯️☮️

(Escrito no final de Agosto, terminado e publicado em 28.Agosto.2022)

2 comentários:

Anónimo disse...

Um grande obrigada por tudo o que me proporcionou nesta jornada impressionante. Um grande obrigada por me fazer sentir o calor humano, a solidariedade e o carisma da Família Gasparita. Bem haja!

Carlos Marques disse...

Não são precisas muitas palavras, basta um grande "muito obrigado". O que nos proporcinaste é muito valioso e vem reforçar o espírito de amizade que emana desta família gasparita.
Grande abraço (mais um), todos são poucos.