sábado, 29 de junho de 2019

(Re)Viver as Fontes Lares ... com um filho da terra

Longe vão já os tempos da minha descoberta da Malcata, percorrendo os velhos trilhos da Pelada, do Espigal, da Quinta do Major, da Marvana, as margens do Côa e do Bazágueda, as Mesas ... e tantos e tantos outros lugares, numa Melodia a 4 Estações, que um dia cantei em vídeo. Estar em Vale de Espinho sem uma ou mais jornadas pedestres ... seria insólito. Por pequenas que sejam as saídas, há um local a que volto com frequência: as minhas "sagradas" Fontes Lares ... o meu "santuário".
Trilho do Ribeiro da Presa, a caminho das Fontes Lares, 25.Jun.2019, 14h15
Mais um regresso às Fontes Lares, na terça feira passada, não seria motivo de uma entrada nestas minhas fragas e pragas, como algumas outras visitas anteriores ao "santuário" não o foram. Mas, dois factos ditaram que acabasse por incluir esta "peregrinação" nas minhas "memórias": terça feira ... forças ocultas levaram-me a construir algumas "esculturas", que deixei a assinalar o caminho onde ele quase se perde na serra; e depois, a publicação dessa curta "aventura" nas redes sociais despertou a saudade de um filho da terra ... que quis ir comigo àquele lugar mágico. E assim, com 3 dias de intervalo ... fui por duas vezes às "minhas" Fontes Lares!
Apesar da beleza, a velha quelhe das pedras
está praticamente intransitável
Panorâmica para sudeste, com as colinas da Malcata ao fundo
Muitos dos velhos caminhos que eu próprio conheci vão sendo gradualmente tomados pelo mato. A velhinha "quelhe das pedras" está praticamente intransitável, tomada por fetos e silvas. Hoje, com o Carlos Malhadas, optámos pelo percurso mais aberto dos Linhares ... ou Nheres, como dizem os valespinhenses. Mas mais acima, cruzado o caminho que leva às Guizias, o caminho para as Fontes Lares também praticamente se perde na serra ... e nas memórias de quantos o percorriam.
"Mariolando" o trilho para as Fontes Lares, 25.Jun.2019 ... para que o caminho não se perca...
Construídas as "esculturas" - as mariolas a assinalar o caminho - cheguei à velha casa do T' Zé Tomé, paredes meias com a que foi da família materna da minha "estrelita arraiana". Ambas em ruínas ... mas a "minha", a "sagrada" casa das Fontes Lares ... cada vez mais tomada pelo mato.
Nas ruínas da velha casa do T'Zé Tomé ... e no mato
em que se transformou a velha casa das Fontes Lares
Hoje, com o Carlos Malhadas, claro que tinha de lhe mostrar o que resta do interior da velha casa ... onde repousam as "minhas velhas botas, cardadas", que palmilharam "léguas sem fim"...
A Natureza vai reconquistando aquilo que,
em tempos, foi conquistado pelo homem...
Dois pares de velhas botas Meindl  jazem há
5 anos por entre as ruínas das Fontes Lares
Fontes Lares: histórias, memórias, nostalgia, vida ... Sonhos...
O Carlos já não ia às Fontes Lares há alguns anos ... e adorou. Com um potente bordão artesanal a apoiar uma ou outra passagem, não ficou para trás em nenhum ponto do percurso. Tenho esperança de chegar aos seus 81 anos com o mesmo vigor ... e alguns mais...

No barroco "sagrado" a solo, terça feira (25 de Junho) e com o Carlos Malhadas, hoje (29 de Junho)
De novo pelo caminho do Seixel e da Có Pequena, como terça feira, regressámos a Vale de Espinho, entrando pelo Areeiro. A minha "estrelita" ficou admirada quando me viu entrar ... pouco depois das dez da manhã... 😊. Ir e vir às Fontes Lares é uma caminhada curta - 8 km, sensivelmente ... mas tal como o Caminho não é o chão que pisamos, também os caminhos não se medem pelos quilómetros percorridos. Obrigado Carlos, foi um prazer!

(Clique para ver o álbum completo)
Clique para ver o percurso no Wikiloc

quinta-feira, 13 de junho de 2019

De Cascais a Lisboa ... e à Bobadela (em noite de Santo António)

- 7ª etapa do projecto CostaPé 2019 -

Pedro Pimenta é um nome bem conhecido no meio pedestrianista português. Depois de largos
anos a dinamizar o CLAC - Clube de Lazer, Aventura e Competição - e de ter incentivado e envolvido milhares de pessoas a fazerem da caminhada um hábito, Pedro Pimenta lançou um projecto pessoal, o CAMINHOS - EstacaZero, projecto que identifica como um movimento e um estado de espírito ... e é nesse movimento que deu início, em Janeiro passado, a um ambicioso projecto: percorrer e mapear para percurso pedestre a totalidade da costa portuguesa. Entre Monção e Vila Real de Santo António, em etapas realizadas em fins de semana e/ou feriados, o projecto CostaPé 2019 estima percorrer mais de 970 km de uma das mais bonitas costas marítimas europeias, com uma diversidade geográfica e paisagística ímpar. Ora, no passado fim de semana prolongado, o CostaPé 2019 chegou a Cascais. Para cada etapa, o Pedro convida quem quiser a juntar-se ao projecto. A agenda não deu para outras ... mas na noite de Santo António proporcionou-se que pudéssemos acompanhar - eu e o meu "mano" Zé Manel Messias - a 7ª etapa daquela "aventura", entre Cascais e Lisboa.
À partida de Cascais, 12.Junho.2019, 23h00 (Foto: Pedro Pimenta)
Às onze da noite estávamos assim a partir da baía de Cascais; éramos 5, para esta etapa nocturna do CostaPé 2019. Noite limpa, de início com um vento que fazia prever algum desconforto térmico, mas que amenizou à medida que progredíamos. O percurso foi, em sentido inverso, o que fiz em solitário há menos de 3 anos ... quando me lancei num certo desafio k100 non stop...

As horas passam ... a Lua avança para poente ... enquanto nós vamos ao encontro do amanhecer
Estoril, Parede, Carcavelos, Oeiras, Paço de Arcos, as fortificações que o meu Tio Carlos descrevia, o Farol da Gibalta, sucediam-se ao longo da nossa marcha. Tudo bastante deserto ... as farras hoje eram em Lisboa. Excepcionalmente, hoje havia comboios toda a noite; víamo-los passar vazios para Lisboa ... e regressar apinhados de gente, vinda dos arraiais e da sardinha assada.
Às quatro da manhã estávamos na Torre de Belém ... que não tem direito a uma merecida iluminação.
Torre de Belém e o Padrão dos Descobrimentos, na madrugada de Santo António  (Foto superior direita: Pedro Pimenta)
Lá ao fundo, de onde o Tejo traz as águas, pelas cinco da manhã o céu começou a clarear. Aproximávamo-nos da velha Ponte 25 de Abril, que igualmente passou a noite sem iluminação. Uma hora depois estávamos no Cais do Sodré, já com o Sol a despontar; com 30 km percorridos, a sétima etapa do CostaPé 2019 estava completada ... com a foto d'"os 5 magníficos" a oficializar o facto.

Cais do Sodré, 13.Junho.2019, 6h00, 30 km percorridos ...
e o Costapé chegou a Lisboa  (Fotos de baixo: Pedro Pimenta)
Já só faltava ... regressar a casa e pôr os sonos em dia. O Zé Manel, a Sónia e o Joaquim ficaram-se pelo Cais do Sodré; também lá, o Pedro ia para o metro. E eu ... apetecia-me acompanhar a elevação do astro rei, que ainda nem tinha propriamente nascido. E se regressasse a casa ... também a pé? Da ideia à acção mediaram poucos segundos ... e em menos de três horas percorri os restantes 16 km até à Bobadela; pela enésima vez ... estava no Caminho de Santiago e de Fátima, o Caminho do Tejo.

Do Cais das Colunas (6h15) ao Parque das Nações (7h35) e ao Trancão (8h25) ... a caminho de casa
Antes das nove da manhã estava em casa, com 46 km percorridos. Foi ... uma noite de Santo António diferente. Obrigado, companheiros! Já não falta tudo para Vila Real de Santo António...

segunda-feira, 10 de junho de 2019

Regresso a Montesinho ... com os Caminheiros Gaspar Correia

Em Março passado, publiquei nestas minhas crónicas o regresso às terras de Montesinho … 25 anos depois dos tempos áureos das "expedições" com alunos. Fomos, em Março,
Aldeia de Vilarinho, 8.Junho.2019, 13h05
fazer a prospecção para a actividade que propus para Junho aos "meus" Caminheiros Gaspar Correia … pelo que agora, 3 meses depois … levei a minha "família" caminheira a terras de Montesinho.
Foram 3 dias de caminhadas e de muito convívio e amizade. Sábado, depois de uma longa jornada de autocarro desde Lisboa, à uma da tarde estávamos na aldeia de Vilarinho … a aldeia que há cerca de um mês assistiu ao regresso do urso pardo a território nacional (depois de em Fevereiro também ter sido registada a passagem de um urso na zona de Pitões das Júnias), depois de 176 anos em que foi dado como extinto em Portugal. Tratou-se de indivíduos errantes, provenientes da população cantábrica ocidental, que ao que parece já regressaram às suas terras de origem. Nós, pelo menos … não os encontrámos… 😊
Ribeira de Ornal e Rio Baceiro
8 de Junho
A primeira caminhada tratou-se de um percurso simples, entre Vilarinho e as margens da ribeira do Ornal e do rio Baceiro, marcadas por intensa vegetação, com azinheiras e carvalhos, em densos bosques que muito nos protegeram do calor que se fazia sentir.
Capela de Santo Amaro e os densos bosques
que ladeiam os vales da ribeira de Ornal
Ribeira de Ornal
No meio dos densos bosques de Vilarinho e no velho moinho de água do rio Baceiro
O primeiro dia terminou com uma curta visita a Bragança, base para as três incursões na Natureza deste fim de semana prolongado.
Da Serra Serrada à Lama Grande e ao vale do Sabor
9 de Junho
Domingo era o dia grande. Íamos levar a "família caminheira" ao coração da serra de Montesinho, como que à volta da aldeia do mesmo nome. E se em Março tínhamos visto Montesinho em tons de Inverno ... agora íamos ver Montesinho no esplendor das cores da Primavera. Aliás...
"Nenhuma outra área protegida expressa tão bem o contraste das estações do ano como Montesinho"
("National Geographic" - Revista nº 45, Dezembro 2004)
Sobre a barragem da Serra Serrada, Montesinho, 9.Junho.2019, 9h50
O autocarro levou-nos à barragem da Serra Serrada, a 1250 metros de altitude. A partir dali, de acordo com a opção de cada um, o grupo subdividiu-se em dois: 21 caminheiros desceram o curso da Ribeira das Andorinhas, enquanto eu conduzi os restantes ao planalto da Lama Grande. 25 anos depois ... em 3 meses voltei por duas vezes àquela casa abrigo criminosamente votada ao abandono.
Imagem da Senhora dos Viajantes
Como eu gostava de voar...
Lameiro e Casa da Lama Grande (1380m alt.) ... criminosamente abandonada
Com as cores da Primavera à sua volta, a Casa da Lama Grande lá continua tristemente a agonizar, guardando recordações de quando a Conservação da Natureza em Portugal não era letra morta ... de quando a Educação Ambiental se praticava, se ensinava, se aprendia ... se Vivia!
Mas, com pena de não ficarmos naquele paraíso, da Lama Grande rumámos ao vale do Sabor e à barragem das Veiguinhas, sobre a qual almoçámos. O dia esteve espectacular: Sol, uma brisa de altitude a amenizar a temperatura e uma luminosidade fantástica. Os deuses estavam connosco...

Da Lama Grande ao vale do Sabor e à Barragem das
Veiguinhas, com as cores e a luz da Primavera
Passada a barragem das Veiguinhas, rumávamos a sudeste, pelo meio de formas pétreas para todas as interpretações e ante a paisagem magnífica do vale do Sabor, com a Serra da Nogueira ao fundo.

O vale do Sabor e as Pedras Negras, com a Serra da Nogueira em pano de fundo
Antes das duas da tarde estávamos sobre o vale da Ribeira das Andorinhas. O grupo que fez o percurso mais soft já estava na aldeia de Montesinho, cerca de 200 metros abaixo de nós. Menos de uma hora depois estávamos também a entrar na aldeia. O seu famoso Café Montesinho ... desta vez estava aberto. Tinha sido, para todos, uma belíssima jornada de serra e de convívio.


Descida da serra para a aldeia de Montesinho, com
17 km de uma bela caminhada nas alturas
Rio de Onor
10 de Junho
Tal como na prospecção de Março, a terceira e última caminhada deste fim de semana prolongado foi dedicada a Rio de Onor, ao rio e à aldeia. Iniciámos a caminhada na estrada de acesso, descendo em direcção ao rio e a um exemplar centenário de carvalho negral, para depois acompanharmos quase sempre o curso daquele, rumo à aldeia, atravessada pela fronteira.
Exemplar de carvalho negral centenário, a sul de Rio de Onor
Ao longo do vale do Rio de Onor, rumo à aldeia que uma fronteira traçada nunca separou
A sul situa-se Rio de Onor, a norte Rihonor de Castilla ... ou Ruidenore de ambos os lados, nome que recebe a aldeia em dialecto rionorês, um dialecto de base astur-leonesa que apresenta alguns traços do português transmontano e do sanabrês e que ainda hoje é falado na aldeia.
Rio de Onor, lado português, 10.Junho.2019, 10h50
As relações entre os vizinhos de ambos os lados da fronteira são relações de amizade e de família. Os casamentos mistos sempre foram frequentes, como frequentes são as deslocações de um e do outro lado da fronteira para trabalhar nos campos de lavoura. Só entre 1975 e 1990 existiu uma corrente que dividia ambas as aldeias; na sequência do 25 de Abril de 1974, existia o temor de que as tropas de Franco entrassem em Portugal por este ponto fronteiriço. Particularmente a parte portuguesa, Rio de Onor é uma das aldeias melhor preservadas do Parque Natural de Montesinho, com casas típicas serranas em xisto com varandas alpendradas, muito bem recuperadas.
Riohonor de Castilla ... ou a aldeia de arriba de Rio de Onor
De regresso à parte portuguesa, junto ao velho moinho de água
E estávamo-nos a despedir de Rio de Onor e do Parque Natural de Montesinho  (Foto de Raul Branco)
Pouco depois das onze e meia da manhã estávamos a deixar Rio de Onor. O almoço seria ainda em Bragança ... uma boa e típica posta de vitela deu-nos alento para os 500 km de regresso. E para trás ficavam as memórias de mais uns dias excelentemente vividos no seio da "família" caminheira Gaspar Correia ... e com os "manos velhos" com quem, em Março passado, eu e a minha companheira do Caminho da Vida preparámos esta actividade em terras de Montesinho.
Clique para ver o álbum completo