segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Valverdi du Fresnu - Elhas - Sa Martín de Trevellu e regresso

ou 25 km na rota da Fala de Xálima ... adaptada

A fala de Xálima é uma variedade linguística do galaico-português, usada numa área conhecida por vale de Xálima, na encosta sudoeste da Sierra de Gata ... paredes meias com a "minha" Malcata. A fala abrange três dialectos, falados nas três povoações do vale: o valverdeiru (fala de Valverde del Fresno), o lagarteiru (fala das Ellas) e o manhegu (fala de San Martin de Trevejo).
Valverde del Fresno (Valverdi du Fresnu), 25.Out.2021, 11h15
O meu quase meio século de terras raianas claro que muitas vezes me levou a qualquer daquelas três povoações ... mas nunca as tinha ligado às três num mesmo percurso pedestre.
E sob o pretexto de ir abastecer o carro a Valverde (quase 0,40 € mais barato do que em Portugal...), desenhei uma caminhada baseada na PR-CC 184, a Ruta de "A Fala", mas adaptei-a para percurso circular a partir de Valverde e associando-lhe alguns outros trilhos e percursos locais.
Comecei tarde, passava das dez horas, onze em Espanha. O carro ficou à guarda da velha Igreja de Nossa Senhora da Assunção e saí pela Praça do Santo Cristo, rumo a leste, cruzando pouco depois o Arroyo de Malnombre; para a seca extrema que temos vivido, até me admirou a água que ainda corre no arroyo.
Arroyo de Malnombre ... e a caminho da Ermida do Espírito Santo
Ermita del Espiritu Santo, próximo de Valverde, 12h00
A paisagem espectacular da Serra do Espiñazo acompanhou-me sempre, a norte. A pouco mais de 2 km de Valverde, a localização da Ermida do Espírito Santo responde aliás a critérios telúricos, míticos e quase mágicos. Valverde ia ficando para trás, as Ellas apareciam ainda na sombra da manhã. Mais a leste, uma placa indica "Tumbas antropomorfas" ... mas desviando-me na respectiva direcção as referidas tumbas não me apareceram à vista ... nem qualquer outra placa ou referência às mesmas.

A caminho das Ellas, cruzo o rio Erjas
... que mais a sul é o nosso Erges
Cruzado o Erjas, começo a subir para as Ellas, com a Fuente del Alamo na base da empinada ladeira, em calçada. E passava já da uma quando cheguei à praça central da terra dos lagarteirus, geminada com os nossos Fóios, com quem todos os anos alternam a festa do magusto raiano.

Na Fuente del Alamo, à entrada das Ellas. Ao fundo, Valverde del Fresno ficou para trás.
Ellas: largo central e Igreja de Nª Srª da Assunção ...
e uma placa em lagarteiru
Das Ellas e passados portanto dois dos três pueblos d'A Falla de Xálima, subi o velho caminho que leva às "Torris de Fernán Centeno" e ao Puerto de Santa Clara. As Torris de Fernán Centeno (ou torres das Ellas) são os rochedos, na Serra do Espiñazo, de onde consta que as hordas de bandoleiros guiadas pelo celebérrimo Fernán Centeno, El Travieso, senhor de Peñaparda e do castelo de Rapapelo, assolavam no séc. XV grande parte destas terras, chegando a tomar os castelos das Ellas e de Trevejo.
Ainda os telhados das Ellas e Valverde ao fundo. Mais ao fundo, a Serra da Marvana e, mais ao fundo ainda, a Gardunha
Ao longo do carvalhal mágico do Camino del Puertu
Já quase a 900 metros de altitude, o carvalhal dá lugar à rocha, começando-se a ver o vale de San Martín ...
... e o "meu" Xalmas surge imponente, dominando o vale a que deu o nome
Sobre San Martín de Trevejo ... ou Sa Martín de Trevellu, em manhegu
Este troço ao longo do Camino del Puerto é verdadeiramente espectacular. Sozinho entre as alturas do Espiñazo, que várias vezes percorri, dos Llanos de Navasfrias ao Puerto de Santa Clara, e o vale dos três pueblos d'A Fala, primeiro pelas sombras de um carvalhal mágico e depois à vista e pelo meio dos barrocos graníticos ... quase me pareceu ver as ruínas do lendário castelo de Rapapelo, de que não restam vestígios, atrás das quais se acoitavam as "tropas" do não menos lendário Fernán Centeno.

Um abrigo natural em plena serra, pelos vistos
já utilizado. Se fosse necessário...
Quase aos mil metros de altitude, surge a "rampa" que me há-de permitir ligar o Camino del Puerto ao de El Soto
Para trás ficam os barrocos e as alturas das Torris de Fernán Centeno
Para a frente e para baixo, o vale de San Martín de Trevejo, com o Xalmas a dominar, à esquerda
Estava agora a descer das alturas. O "meu" Xalmas domina o vale, espraiando-se pela encosta coberta de carvalhos e castanheiros. O castañal de los Ojestos está ainda maioritariamente verde, quando nesta altura seria de esperar já o matizado das cores outonais; teremos de esperar umas semanas.
As ladeiras sul do Xalmas e o castañal de los Ojestos, ainda maioritariamente verdes
E chego ao sítio de El Soto, a meia serra, ainda a norte de San Martín de Trevejo
Nesta encosta sul da Serra, houve sempre famílias de pastores que, até há cerca de cem anos atrás, eram esquecidos pelos homens e pouco atendidos pelos ministros de Deus. No início do século XX, o padre das Ellas, Dom Eusébio Obregón, ele próprio serrano e que amava a sua terra, com a ajuda dos Franciscanos que haviam retornado ao convento de San Martín de Trevejo, decidiu fazer algo pelos pastores. Com o dinheiro de uns e o trabalho gratuito de outros, conseguiu levantar uma Ermida, logo colocada sob a invocação da Virgem Maria ... e assim nasceu a Ermida da Divina Pastora.
A Ermida da Divina Pastora,
no lugar de El Soto
E uma janela para o Castañal de los Ojestos
Descida para San Martín de Trevejo, através de um
estreito sendero próximo do Molino de los Frailes
Eram quatro e meia e estava a entrar em Sa Martín de Trevellu, pelo Convento Franciscano de San Miguel. Os manhegus contam que São Francisco de Assis, quando voltava de uma viagem que havia feito a Lisboa e a caminho de Ciudad Rodrigo, passou por San Martín de Trevejo, onde parou para descansar. A lenda popular diz que ficou tão impressionado com a beleza da paisagem que ordenou aos seus seguidores que ali construíssem um Convento, hoje Hospedaria Conventual Sierra de Gata.
Convento Franciscano de San Martín de Trevejo, 16h30
San Martín de Trevejo é o pueblo que melhor conserva a típica arquitectura e características urbanísticas e tradicionais. Passear pelas suas ruas e praças é sempre uma viagem no tempo, aprendendo também o manhegu, talvez o mais cerrado dos três dialectos de A Fala.

Igreja de San Martín
Ruas típicas de San Martín de Trevejo
San Martín de Trevejo (ou Sa Martín de Trevellu) ... uma viagem no Tempo...
Faltavam-me 9 km para o regresso a Valverde del Fresno. Eram cinco da tarde espanholas. Uma bela caña à saída de San Martín deu-me alento ... e foi em boa média que os percorri, tanto mais que agora o percurso era praticamente plano, a sul das Ellas e do percurso que me havia levado aos três pueblos do vale de Xálima e que, num belo dia de Outono, me havia mostrado as paisagens magníficas de toda esta jornada, principalmente ao longo do velho Camino del Puerto.

Os campos a poente de San Martín e o Río de la Vega sob a Puente del Molino Grande
De novo as Ellas, agora ao Sol da tarde ...
E aproximo-me de Valverde del Fresno, entrando pelo Caminho Real e a Puente Real sobre o Arroyo de Malnombre
Antes das sete estava de novo junto à Igreja de Valverde ... onde o Duster me esperava com a "barriga" cheia a preço espanhol 😊. Foi sem dúvida uma bela caminhada, a somar aos curtos passeios que já tinha feito em mais uma das habituais estadias no meu retiro raiano ... nomeadamente ao meu "santuário" das Fontes Lares (fotos aqui).
Valverde del Fresno, 18h50 - Estava de regresso,
com 25 km nos pés
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ver o percurso no Wikiloc)