“El milagro del Camino está en que convierte en mágicas las cosas
normales”
Qual é o milagre do Caminho? Qual a magia? O que é que faz com que, passados
quase 8 anos sobre o meu
1º Caminho
... eu sinta cada partida como a primeira ... cada Caminho com a mesma
sensação de coisa nova, de descoberta, de maravilha permanente ... de milagres
Vividos.
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Ponferrada, 2.Mar.2022, 14h10 Comecei ... onde acabei o
Camino Olvidado
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Estou apenas no terceiro dia deste
Caminho de Inverno ... mas
sinto-me nele como se estivesse há anos ... como se não existisse Tempo nem
Espaço ... como se todos os Caminhos que já percorri fossem um só, prólogos e
epílogos de si mesmos. Nestes três dias ... já houve histórias e estórias ...
episódios a contar ... Vivências. Aliás ... o simples facto de estar a
escrever no Caminho já é, só por si ... uma história do Caminho.
Habitualmente, no que aos
Caminhos de Santiago
diz respeito, só tenho escrito estas minhas crónicas
a posteriori, após
o regresso. Desta vez, contudo, aqui estou a escrever ... no
Albergue de Vilamartín de Valdeorras, em terras galegas desde quase logo que saí, hoje, da leonesa Puente de
Domingo Flórez.
Cheguei a
Ponferrada à uma da tarde de quarta feira, de autocarro,
como disse no
Prólogo. Almocei no terminal e rapidamente me dirigi para o Castelo Templário. Foi
ali que acabei em 4 de Agosto passado ... era ali que teria de começar. E para
começar bem ... primeira história do Caminho: ao dirigir-me à Oficina de
Turismo, para selar a Credencial ... a funcionária estava a fechar a porta.
Claro que, vendo que se tratava de um peregrino, a voltou logo a abrir e, toda
solícita, afixou o carimbo na mesma Credencial do ano passado. Por segundos
teria perdido essa possibilidade ... e pouco depois das duas começava o meu
Caminho.
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Descendo o curso do Sil, Ponferrada ia ficando para
trás...
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E dir-se-ia que estava, afinal
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... num Caminho de Primavera...
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Estaria realmente num Caminho de Primavera? Bem, havia algumas nuvens
ameaçadoras ... e a previsão meteorológica dava chuva e frio. "
Venha ela", pensei para os meus botões ... e a chuva veio mesmo, primeiro tímida,
depois já mais a sério. O meu destino era
Villavieja, uma pequena aldeia próxima do Castelo de Cornatel, passando antes por
várias povoações. Pois ... já vos conto... 😂
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Toral de Merayo, 15h30 ... pois ... era lá que eu devia
ter procurado comprar mantimentos... 😄
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Mas Toral de Merayo ficou para trás, eu sabia que havia mais
povoações...
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E haver havia ... mas e lojas onde comprar alguma coisa? Também sabia que em
Villavieja não encontraria nada, mas pelo menos em
Priaranza del Bierzo, sede de concelho ... esperaria encontrar.
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Ao fundo são os montes do Cebreiro ... e vêem-se lá
vestígios de neve
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Priaranza del Bierzo ... onde,
como sede de concelho ... esperava poder comprar o meu jantar... 😏
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Santalla del Bierzo, 17h00 ... e
mais um pueblo sem tiendas...
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Passada
Santalla ... perdi a esperança. Preocupado? Eu não! Na
mochila tinha muitos cubos de marmelada, carinhosamente doada pelos meus
"Manos velhos" mais antigos 💕; rapidamente a ementa do meu jantar e pequeno
almoço ficou traçada ... e ainda não sabia eu que seria também a ementa do
almoço do dia seguinte... 😜😂. Histórias e estórias do Caminho!...
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Subida para Villavieja e para o Castelo de Cornatel (lá em
cima, à direita)
E há velhos guerreiros petrificados nestas paragens berzianas
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Villavieja del Bierzo, final da
primeira etapa, excepcionalmente terminada pelas 18h00
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A última hora e meia de caminho foi debaixo de chuva. E no
Albergue de Villavieja
já sabia que havia outro peregrino; a encarregada disse-me, quando telefonei a
avisar da minha chegada. E lá estava ele, o Claudio, um italiano que ... já
foi a Jerusalém a pé! Tínhamos as excelentes instalações do albergue municipal
só para os dois ... mas ontem e hoje tive e tenho os albergues só para mim;
por um lado estamos completamente à vontade, por outro lado perde-se a
vivência e troca de experiências.
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Castelo de Cornatel, 3.Março.2022, 8h55 - Tinha começado a 2ª
etapa do Caminho de Inverno
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E tinha começado a 2ª etapa ... num verdadeiro dia de inverno! Dormi bem ...
mas o Claudio, que dormiu junto a uma janela, disse-me que tinha chovido toda
a noite ... e saímos do albergue a chover. Prometemo-nos mutuamente caminhar
cada um ao seu ritmo, porque se estamos a fazer o Caminho a solo ... é a solo
mesmo. Voltámo-nos a encontrar em
Puente de Domingo Flórez.
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Nas Médulas de Carrucedo ... mas eu diria também no reino
dos líquenes ... com muita chuva 😊
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Se a primeira etapa tinha sido bonita, a segunda não lhe ficou atrás ... mesmo
marcada pela muita chuva que caiu ao longo de quase todos os seus 20 km,
atravessando a zona mineira (desde os romanos) das
Médulas de Carrucedo, que em versão turística tinha visitado com a
minha estrelita e amigos em
Setembro de 2020 ... quando os marcos e as setas amarelas me disseram que um dia havia
de ali passar no Caminho! E esse dia chegou ... foi ontem ... no Inverno!
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Eu não tinha pedido chuva? Pois tive-a quase toda a jornada! Ou bem
que é inverno ou bem que não é...
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Puente de Domingo Flórez à
vista. Última povoação leonesa ... e fim da minha 2ª etapa.
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Em
Puente de Domingo Flórez tinha
reservado uma cama no
Albergue "Casa Rosa". Um albergue de donativo é sempre apelativo ... e o Agris surgiu
positivamente do céu, quando passei à porta à procura. "
Es José Carlos? Pues Casa Rosa es aquí, bienvenido" ... esta é música celestial para qualquer peregrino! E lá dentro ... estava
o Claudio, o italiano que já foi a Jerusalém! O Agris e a Rosa são um casal de
letões, que fizeram o Caminho com os filhos (actualmente com 14 e 18 anos) ...
e ficaram, gerindo este Albergue em
Puente de Domingo Flórez.
O Agris e o Claudio logo me ofereceram
una cerveza ... e logo brindámos
à Paz neste Mundo conturbado, à saúde, à amizade ... à Vida. Tudo no Agris me
fez lembrar Bodenaya e o David Carricondo, no Caminho Primitivo. Só faltaria
... uma ceia comunitária ... até porque eu continuava a cubos de marmelada...
😂. Também nas Médulas tinha encontrado tudo fechado, talvez pelo dia de
chuva. Bem, o Claudio deu-me umas fatias de queijo ... mas para comprar pão só
às cinco da tarde. Sem problema ... para jantar o Agris já me tinha dado a
indicação de onde comer bem e em conta ... e o jantar foi mais que divinal, no
restaurante "
La Torre", com um excelente menu a preço peregrino; finalmente uma refeição que se
chame refeição 😀
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Peregrino precisa de comer... 😍 (Menu Peregrino, 12 € tudo isto)
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Depois deste opíparo e merecido jantar ... dormi como um anjo. E hoje às 7h30
da manhã, tal como combinado, tinha um lauto pequeno almoço preparado pelo
Agris, no albergue, incluído no preço. No preço? Não ... no donativo! Ontem
quando lhe perguntara quanto é a dormida e pequeno almoço, respondeu-me: "
lo que dice tu corazón". E assim fiz!
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Magia em estado puro. O Despertar dos Mágicos, próximo de
Quereño, 4.Março.2022, 8h20
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E se o dia de ontem foi um dia de chuva de inverno ... o dia de hoje foi um
dia de Sol de inverno! Não há palavras para descrever tanta sensação junta; as
únicas palavras são de agradecimento à Vida, a Santiago, ao Universo!
Atravessei o
Sil logo no começo desta terceira etapa e entrei na
Galiza. Hoje, à medida que caminhava, vieram-me à memória os versos da
"
Caixinha de Música" do Sebastião Antunes ... mas não senti felizmente nenhuma "
brisa estranha com sabor a fim" ... nem tive "
uma visão tão estranha"; pelo contrário, graças à
Inteligência do Universo ... o Sol nasceu e iluminou e deu cor à paisagem que
ia passando diante dos meus olhos, enquanto os pássaros cantavam em meu redor,
contentes com a água que ontem o Universo lhes deu e com o Sol que hoje os
aquecia. Este planeta não pode morrer! Os senhores da guerra ... esses podem
morrer...
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E de repente, próximo de
As Nogueiras, surge-me a Virgem
Maria "Bienvenido a tu casa" ... mas não consegui saber o
porquê deste "Santuário". As ruínas, segundo uma placa, seriam de
um forno.
Também sem saber o porquê ... espontaneamente
rezei uma Ave Maria
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E o Sil (Ribeira Sacra) corre esplendoroso. Ao fundo,
Sobradelo
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Ponte de Éntoma, sobre o rio do mesmo nome, afluente do Sil
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Junto a esta ponte ... mais uma história do Caminho. Estava-me a preparar para
a foto acima quando passaram duas senhoras, mãe e filha. Demo-nos os "
bos días", claro, e tinham já passado a ponte quando oiço a mais nova gritar "
ayuda, ayuda". A mãe tinha caído! Lá ajudei a levantar a senhora, cuja filha me disse ter
90 anos. Felizmente não se magoou; seguiram caminho, certamente para casa.
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Uma jornada através do Paraíso...
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O Sil à passagem por
O Barco de Valdeorras. Que dia ...
que imagens ... que maravilhas!
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Pazo de Arnado, do Séc. XIX, nos terrenos de um antigo priorado da Ordem de
Santiago
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Já próximo do final desta 3ª etapa, o Sil chega a
Vilamartín de Valdeorras
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Antes das três da tarde, estava a chegar a
Vilamartín de Valdeorras e ao
respectivo
Albergue Municipal, com 27 km percorridos. Mais um excelente albergue, quase à beira do
Sil ... e mais uma vez sozinho no albergue. A encarregada veio
abri-lo, após contacto telefónico ... e cá estou ... com cozinha e máquina de
lavar e secar roupa, lençóis mesmo lençóis, cobertores, aquecimento ... por 8
€. É assim o Caminho. Amanhã é outro dia ... e o Caminho ... como a Vida ...
Vive-se um dia de cada vez.
Quando vou escrever a próxima crónica? Não sei. Quando o Caminho me disser.
Até pode ser só quando chegar a casa... 💖
Bom Caminho!
(Escrito e publicado em Vilamartín de Valdeorras, 04.03.2022)
1 comentário:
Um hino à vida! E o sonho comanda a vida e, que bom que é quando a vida não é um sonho, mas uma realidade! Uma reportagem admirável a todos os títulos! Vou ler o resto. Um abraço.
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