quarta-feira, 4 de abril de 2012

Dois dias no coração do Gerês puro e duro (2)

Depois de termos subido ao Pé de Cabril e à Calcedónia, no domingo, segunda feira era o dia da travessia do Gerês, no sentido noroeste - sueste. Eu tinha de partilhar com a minha "família" caminheira mais alguns dos paraísos perdidos no coração do Gerês "puro e duro", até porque...
«Onde houver silêncio e tempo escritos em jeito de virgindade... aí estaremos»
Luís Miguel Vendeirinho           
Segunda 2 de Abril: Leonte - Conho - Roca Alva - Fafião

Leonte, 2.04.2012 - Vai começar a 2ª jornada
A partir da nossa base em Lobios - o Hotel Lusitano - tinha delineado algumas alternativas: subiríamos pela Costa de Sabrosa ou pela Freza, rumo ao Curral do Conho, para depois seguir pelas Fichinhas e Porto da Laje, ou pela Roca Alva e pelo trilho da Vezeira de Fafião. Em ambos os casos, o facto de não conhecer pessoalmente alguns troços de ligação não me assustava ... nem aos meus seguidores. Todos confiávamos plenamente nas cartas e no meu velho e fiel "amigo" OziExplorer... J.
Foi pela segunda das alternativas que optámos; a distância um pouco menor a percorrer, aliada ao igualmente menor desnível inicial, foram os principais factores ponderados. E assim, antes das oito da manhã estávamos de novo em Leonte. A subida para o Prado do Vidoal foi-se fazendo a bom ritmo. Do outro lado do vale, o Pé de Cabril vigiava-nos, talvez com a saudade de o termos escalado na véspera.
Subida da Costa de Mourô,
com o Pé de Cabril a dominar a encosta contrária
No Vidoal, fomos informados por um grupo de escuteiros que ali havia passado a noite ... que a chuva tinha sido abundante! Mas a atmosfera estava agora límpida, contrariamente às previsões. E que maravilha de dia iríamos ter!

Prado do Vidoal (ou de Mourô)
Pouco depois das 9 horas estávamos na Freza. Mesmo com a seca e com alguns vestígios de incêndios ... a panorâmica para o Camalhão e para o vale da Teixeira é soberba. Alguns dos Caminheiros que me acompanhavam tinham lá estado em 2008, noutra grande jornada por aquelas terras mágicas, da Pedra Bela à Teixeira e ao Arado.
Vale do Camalhão e da Teixeira, vistos da Freza
A Chã da Fonte deixou-me apreensivo. A bela água que nos havia saciado em Junho de 2011 ... nestes primeiros dias de Abril nada corria! Chuva abençoada, que venha rápida!
À vista já do Borrageiro, da Lomba do Pau ao início da descida para o Curral do Conho foi rápido. Para mim e para a minha "cabrita de montanha", a visão do Conho avivou-nos as recordações de há menos de um ano, quando 2 vacas e seus bezerros foram nossas companheiras por uma noite ali passada.
Ao longo da Lomba do Pau
Curral do Conho
Chegava a hora de optar pelas Fichinhas, Sombrosas e Porto da Laje, ou pela Roca Alva. A possibilidade de almoçarmos e descansarmos um pouco naquele autêntico paraíso perdido, fez-me optar pelo percurso da Roca Alva. E em boa hora o decidi ... já que se sucederam as exclamações de encanto e admiração, relativas àqueles prados e àquela fabulosa envolvência.
Roca Alva à vista e Cutelo de Pias, ao fundo à direita
Estávamos, decididamente, no paraíso! E logo ali nasceu a ideia de voltarmos, um pequeno grupo, para a fabulosa experiência de uma noite na serra! O aconchego, o carinho, o cuidado postos na preservação da cabana da Rocalva, na protecção das árvores ali replantadas, tudo cativou e emocionou os meus 12 companheiros desta fabulosa jornada.
A chegar ao Prado da Roca Alva, com o Cutelo de Pias ao fundo
Prado e cabana da Roca Alva: um paraíso perdido, a 1275m de altitude, no coração do Gerês
Cabe aqui também uma palavra de grande homenagem e de grande reconhecimento ao trabalho desenvolvido pela Associação Vezeira de Fafião, cujos membros e amigos, em regime de voluntariado, muito têm contribuído para que as suas terras não morram. Pena é que o Parque Nacional da Peneda-Gerês e o ICNB, bem pelo contrário ... se limitem aos gabinetes e à emissão de normas ridiculamente absurdas.
E seguimos rumo a Fafião, pelo trilho da Vezeira
Com alguma pena, dada a beleza do paraíso onde nos encontrávamos, deixámos o prado da Roca Alva poucos minutos antes da uma da tarde. Passando muito próximo do Cutelo de Pias, seguíamos agora o trilho da vezeira, precisamente uma das tradições recuperadas pelas gentes de Fafião e de outras aldeias. A vezeira consiste na junção dos rebanhos duma aldeia para serem pastoreados em terrenos comuns, os baldios. É baseada no agrupamento dos proprietários de gado, seguindo regras transmitidas de geração em geração; o papel principal dos vezeireiros era conduzir o rebanho, à vez.
Descida para o prado do Vidoirinho
Atravessado o prado do Vidoirinho chegámos à estreita cumeada entre os vales dos rios do Laço e do Conho. Ao fundo, a leste, víamos o estradão do Porto da Laje. E ultrapassámos o ponto onde, na autonomia de Junho passado, tinha descido para o vale do rio Conho! Daí à ligação para Fafião era portanto um troço novo também para mim ... e continuámos ao longo de uma paisagem assombrosa.

Panorâmicas de cortar a respiração
E a jornada prossegue, rumo à Cabana Pradolã
Faltam pouco mais de 5 km para Fafião, encontramos nova cabana completamente restaurada pela Vezeira, a Cabana Pradolã. A partir daí, acompanhamos a imponente cumeada dos Bicos Altos, do outro lado da Corga de Carnicente.
Panorâmica para os Bicos Altos, na descida para Fafião
Já em estradão, os últimos quilómetros não deixaram por isso de ser espectaculares. Em Junho de 2011, tinha descido o vale do Rio Conho até à ponte de Servas ... mas, mais a sudeste, só do trilho da Vezeira se consegue apreciar a espectacularidade do abrupto canyon que o rio ali abriu.


Desfiladeiro do Rio Conho
E já só nos faltava cruzar o Rio Fafião, onde felizmente ainda abundam lagoas de águas límpidas, convidativas a um mergulho. Depois ... depois era a penosa subida que nos conduziu a Fafião, passando pela sua silha dos ursos, outra relíquia perdida no tempo; os cortiços das abelhas eram protegidos dos ursos por muros de pedra altaneiros, à prova daqueles gulosos comedores de mel.

Piscinas naturais no rio de Fafião
Silha dos ursos de Fafião
E, em fim de jornada, entramos em Fafião
Pouco passava das 4 da tarde quando terminámos esta fabulosa jornada. Em Fafião, casualmente, o Sr. Argentino Matos acabou por se tornar um nosso anfitrião. Membro da Vezeira e irmão de um dos seus principais impulsionadores, Almerindo Matos, falou-nos de tradições seculares e do bem meritório trabalho da Associação. Não podíamos desejar melhor e mais apropriado fim de actividade!
Com o Sr. Argentino Matos, da Vezeira de Fafião
De Fafião a Braga foi um salto ... para ontem regressarmos à velha Lisboa. Como outros, estes dias e estas jornadas ficam eternamente gravados na minha memória, no baú das recordações de uma vida vivida no seio de Amigos verdadeiros. À espectacularidade do Gerês "puro e duro", aos paraísos perdidos que atravessámos, aliou-se união, amizade, alegria de viver, conviver e partilhar. Aqui fica o meu muito obrigado a todos os que me quiseram seguir!
Aqui fica também, como habitualmente, o álbum completo de fotos e o percurso desta fabulosa travessia.
  

E também o vídeo destes dois dias fantásticos...

2 comentários:

JORGE FIGUEIREDO SANTOS disse...

Notável! Fui verificar ao 140467... mas ainda não, porque há ali fotos a ver em tela maior...

Lírio disse...

Olá Callixto!

espero que consiga enviar esta mensagem...tenho tentado mas não sei porquê, não segue!!

O Gerês como sabemos tem muito para ver, e um dia não chega para tudo! Mas o percurso não podia ser melhor escolhido para levar uma família de caminheiros!! Muitos Parabéns :)
Só de ver as imagens já tenho saudades :)

Um grande abraço!!