quinta-feira, 18 de setembro de 2025

Pirenéus a dois... ou uma nostalgia com mais de 40 anos... (4)

No périplo iniciado uma semana antes, depois de três dias pelos Pirenéus aragoneses e outros tantos na Baixa Navarra... o dia 15 de setembro era um dia de emoções. Estávamos a pouco mais de 10 km de Saint Jean-Pied-de-Port... e eu queria ir mostrar à minha pequena arraiana os meus...
Olhares sobre o Caminho Francês em Navarra
15.09.2025, 09h20 - Quando saímos do vale do Nive... subimos acima das nuvens...
Sobre Esterençubi e o vale do Nive... os deuses tinham-nos enviado um nevoeiro mágico... para um dia místico. Mas logo os céus se abriram e o Sol iluminou as montanhas. Havia muito para recordar, relativamente à primeira etapa do meu Caminho Francês... já lá vão 9 anos! Pela mesma estrada que na véspera subi de bicicleta, seguimos a linha de fronteira em direcção poente... e saímos das nuvens.
Liberdade plena... junto à enigmática Torre de Urkulu (1419m alt.)
Cruz de Thibault
E de repente o nosso dia enche-se de peregrinos... todos vindos do nevoeiro... como vultos na paisagem 💖
A Cruz de Thibault foi o primeiro local onde "entrámos" no Caminho de Santiago. Por entre o nevoeiro que ia e vinha... revivi aquele mágico dia 28 de abril de 2016, em que, com o Zé Messias e o António Banha, saímos de Saint Jean rumo às estrelas. Como que senti as emoções nos rostos das centenas de peregrinos que se cruzaram connosco, de todas as nacionalidades e de todas as idades... e não resisti à tentação de percorrer um pequeno troço do Caminho, até à Fonte de Rolando ✨💫
Fuente de Roldán... e os peregrinos seguiam o seu Caminho. Quase lhes lia os pensamentos...
Teremos forças... seremos capazes? Temos 800 km pela frente... 🤔
Mas tinha de voltar ao carro e acordar das memórias...
Continuavam a passar peregrinos. Espanhóis, alemães, muitos japoneses ou coreanos... um português de bicicleta... "Ainda falta subir muito?", perguntou-me. Disse-lhe que não muito... não lhe disse que o alto de Lepoeder ainda estava a quase 5 km... e continuámos a caminho de Saint Jean-Pied-de-Port.
Mas antes... antes esperava-nos a Virgem de Biakorri ... que em basco significa "dos ventos que correm"...
9 anos antes ... 28.04.2016 ... quando a Virgem de Biakorri abençoou o meu Caminho Francês de Santiago
Há 9 anos, optei por começar o meu mais longo Caminho naquele dia 28 de abril. Entreguei as minhas lágrimas à Virgem de Biakorri - ou de Orisson - pelos 13 anos que então se cumpriam sobre a passagem para outro nível do meu querido Zé "Malhadinhas", pai da minha estrela. Dediquei-lhe o meu esforço e a minha saudade. Agora, nos meus "olhares" sobre o Caminho, tinha a minha estrela comigo!
Pouco depois estávamos no Refuge d'Orisson, a primeira paragem na nossa primeira etapa do Caminho Francês
E às 12h35 estávamos em Saint Jean-Pied-de-Port... sobre o Nive. A cidade fervilhava de vida... de uma Vida em que predominam os peregrinos, rumo a Espanha, rumo a Santiago; o túmulo do Apóstolo está já ali... a mais de 800 km...
abril de 2016... foi aqui que dormimos.
E naquele dia 28 de
Porta de Santiago, por onde entram os peregrinos vindos de mais longe, Le Puy-en-Velais, por exemplo, pela Via Podiensis.
Almoçados em Saint Jean-Pied-de-Port, vivida a nostalgia de olhar para as minhas próprias memórias e de as transmitir à minha estrela... havia que seguir para Espanha... para Roncesvalles. Não a pé, como no Caminho... mas pela estrada de Valcarlos e pelo Puerto de Ibañeta.
Real Colegiata de S.ta María de Roncesvalles... cuja ala esquerda é Albergue de Peregrinos... onde dormi em 2016
com os meus dois companheiros de Caminho.                 
Mas os "olhares" sobre o Caminho Francês não terminariam sem um local e duas cidades da(o)s mais marcantes naquela que foi (e que provavelmente será sempre) a minha maior "aventura" pedestre, espiritual... mística...
Refiro-me ao Alto del Perdón e às cidades de Pamplona e Puente de la Reina. Na manhã do dia 16, em que iríamos "montar a tenda" em Pamplona, saímos de Burguete ao encontro do rio Arga em Zubiri... onde me lembrava bem da bonita ponte medieval.
16.09.2025, 09h30 - Puente de la Rabia, ponte medieval sobre o Arga, em Zubiri 
Como tínhamos tempo, optámos por contornar a capital de Navarra para ir recordar, primeiro, o Alto do Perdão e Puente de la Reina, que, embora depois de Pamplona, são pouco distantes. E assim, a meio da manhã... estávamos naquele emocionante lugar... donde se cruza el camino del viento con el de las estrellas... ✨. E se havia vento... a marcar nos rostos as emoções, as dúvidas, a alegria do Caminho!
Alto del Perdón, 16.09.2025, 10h25
Memorial Fosas de la Sierra del Perdón
Este Memorial, "Fosas de la Sierra del Perdón" foi inaugurado em 2017... não existia portanto quando do meu Caminho Francês... e veio trazer àquele local um peso maior ainda do que o mesmo já transmitia. O Memorial simboliza o reconhecimento e a reparação das 92 pessoas ali assassinadas em 1936 e 1937, como resultado da repressão desencadeada após o golpe militar franquista.
Ei-los que chegam com o vento...
... ei-los que partem com o vento!
E em Puente de la Reina, sobre o Arga, 11h25
Na nossa "peregrinação" - ou melhor, nos olhares a recordar na minha memória e a transmitir à minha estrelita - agora sim faltava apenas a capital de Navarra, Pamplona. E tínhamos dia e meio para lhe dedicar, com a "tenda" montada no Hotel Pamplona Plaza. Não... as características não são nem de perto nem de longe tão "sonantes" como o nome; o melhor ainda era o pequeno almoço...
Porta de França e Rua Mercaderes, Pamplona. É pela Porta de França que entram os peregrinos... e são sempre muitos!
Catedral Metropolitana de Sta. María La Real
e o imponente Ayuntamiento de Pamplona
Plaza del Castillo, um dos centros nevrálgicos de Pamplona...
... onde se situa o célebre Café Iruña... onde almoçámos, pois claro...
E sem deixarmos de cumprimentar o Sr. Ernest
Hemingway, velho amigo do Café e da cidade
Da Cidadela de Pamplona ... podíamos dizer um adeus a Navarra e a estas... férias das férias...
Um adeus também ao Rio Arga
Como não poderia deixar de ser... o último dia deste périplo foi longo. Não tão longo como o primeiro, 10 dias antes, mas de qualquer modo uma jornada de cerca de 900 km... coming home. Mais uma vez não me cansei... eu até vim sentado... e a parceira dormiu metade do caminho... 😂
Algures entre Vitoria e Burgos, 18.09.2025, 09h20 ... cerca de 8 horas depois estávamos em casa 😊
E agora que também desta viagem ficaram as memórias... penso que lhe poderia chamar...
« Pirenéus, Vozes Antigas... Entre Cumes e Memórias »
Foram... são... Caminos que nos cruzan... Mendi eta oroimen artean
(Entre a montanha e a memória).
O périplo terminou… mas os Pirenéus permanecem.
Entre cumes e memórias, fomos recordar, reviver, conhecer.
Ali, onde o vento fala aragonês e basco — ou euskera
ali, onde as pedras guardam histórias,
onde os trilhos rezam em silêncio e os rios cantam liberdade…
não percorremos apenas caminhos:
fomos percorridos por eles, como quem reencontra vozes antigas,
entre pedras e pastores, entre cidades e serras,
numa peregrinação em que a geografia também fala em alma.
Escrito a posteriori, em casa

1 comentário:

Anónimo disse...

Mais um caminho a cruzar trilhos de memórias guardadas...tranças de emoções sempre comemoradas...👍🥰👏