Há 4 dias, no último dia de Agosto, tínhamos feito a
abordagem à montanha. Em
Imlil, entrámos no Atlas. Nos três dias que se seguiram … chegámos ao céu! O
Toubkal – aquele que nos vê do alto dos seus 4167 metros de altitude – abençoou-nos com um tempo magnífico, com a grandiosidade destas montanhas imponentes, com a sensação de termos vencido o desafio que nos propusemos. Ontem, ao meio dia de um dia sublime … atingíamos o cume da África do Norte!
Ao olhar para estas paredes imponentes de rocha, à volta do pequeno planalto onde ainda me encontro ao escrever estas linhas, tem-se a sensação de que são intransponíveis. Mas não, os trilhos estão lá, serpenteiam por entre ravinas imensas de cascalho e rocha. O caminho está lá … o caminho que um dia entrou no meu imaginário, o caminho que estes dez amigos que aqui estão comigo quiseram trilhar … o caminho do desafio, do conhecer os limites, neste que também foi e é o
Caminho ...
o Caminho dos céus.
Descrever o que foram estes três dias é complicado. O acordar em
Imlil foi como um renascer, um despertar para as forças que nos empurrariam para o início da "aventura". As pernas estavam preparadas. As mochilas também. E o dia nasceu com o Sol a pontificar no azul de um céu que tentava arranjar espaço por entre as montanhas de que estávamos cercados. Um pequeno almoço bem servido e repleto de risadas espontâneas, do sangue a ferver no entusiasmo da partida.
|
As primeiras a partir são as mulas ...
... e agora vamos nós, atrás das mulas
|
Mal começamos a caminhar ... começamos a trepar. Primeiro ao longo de frondoso bosque, mas a trepar. Tínhamos quase 1500 metros de desnível a vencer, dos cerca de 1780 de
Imlil aos 3200 do refúgio que iria ser o nosso "acampamento base".
|
Começou a grande jornada, rumo a Aroumd (também chamada Aremd, ou Armed, a 1840m alt.) |
As pessoas, as mulas, as casas, os caminhos, os sentidos, o ar, a terra, os cheiros, as conversas, o silencio, o som das águas do
Assif n'Isougouane, o ribeiro que iríamos acompanhar todo o dia ... tudo nos transportava para um reino fabuloso e longínquo ... afinal tão perto e tão longe.
|
O vale de Mizane, ou Assif n'Isougouane: águas que vêm dos céus... |
O Nuno, o nosso guia, já é mais que um guia, é um amigo que conhece o terreno. Somos apenas 11, mas a preocupação com a progressão de todos é bem patente desde a primeira hora. E subimos, subimos sempre. A paisagem é esmagadora. Aqui e ali há bancas a vender sumo de laranja espremida na hora. E chegamos ao marabout de
Sidi Chamharouch, uma pedra branca, símbolo muçulmano da procriação, acreditando-se também que o santo cura doenças mentais e outros males de espírito.
|
Marabout de Sidi Chamharouch, 2330 metros de altitude |
Água (muita), barras energéticas, mais sumo de laranja natural ... e mais subida. Sucedem-se cascatas de água cristalina. Passamos os 2500 metros, passamos os 3000 metros, a respiração começa a sentir a altitude. Um passo atrás do outro, de rocha em rocha, de pedra em pedra.
|
Refrigeração de último
|
|
modelo tecnológico...
|
|
Para cima, sempre para cima...
|
|
3000 metros de altitude |
Sufocados pelo cumes que ladeiam o vale, a nossa jornada prossegue. No ar, soavam os sons estridentes das gralhas. Apesar da altitude, o frio não se faz sentir. De repente, o vale abre-se um pouco, divisam-se edificações que mais parecem fortalezas saídas de um filme dos anos 50. São os refúgios do
Toubkal, a 3200 metros de altitude: o "nosso"
Refuge des Mouflons e o "velho"
Refuge du CAF, o Clube Alpino Francês.
|
Chegamos ao "acampamento base" do Toubkal, a 3200 metros de altitude |
|
Já merecíamos um descanso!... |
Ambos os refúgios têm uma autêntica "aldeia" de tendas à volta. Supostamente, o
Refuge des Mouflons, mais recente, tem muito melhores condições. Mas ... é só supostamente. Electricidade ... só das 18:30h às 22 horas; água quente idem. É certo que luz e água quente a estas altitudes é um luxo ... mas descobrimos que o
Refuge du CAF tem luz, água quente e aquecimento 24 horas por dia; um dos nossos "aventureiros" migra para lá ... pagando menos do que a tabela no
Mouflons...
Jantamos às 18:30h, quase à luz de velas, um "banquete" humilde, mas com a atenção de um chefe sempre sorridente. E nós ... também sorríamos. Soltámos gritos de união. Estávamos ali, naquele lugar, escrevíamos os nossos nomes na vida de cada um e do próximo, trocávamos histórias e estórias, sorrisos, carinhos momentâneos mas eternos. Estávamos fortes, crentes na missão que nos havíamos proposto: subir quase mais mil metros acima de onde estávamos!
Agora sim com algum frio, era chegada a hora de repousar ... ou de tentar repousar.
1 comentário:
Grande, Callixto!
Fico satisfeito que tudo tenha corrido bem!
Bela reportagem, gostei!
Um abraço
Enviar um comentário