Qhapaq Ñan em quíchua quer dizer “Estrada do Rei” e é o nome oficial de uma extensa rede de estradas que começa na Colômbia e atravessa o Equador, Peru, Bolívia, Chile e Argentina, serpenteando entre montanhas, rios e planícies. Não se sabe se as estradas foram totalmente construídas pelos incas; achados arqueológicos indicam que os caminhos já eram utilizados há cerca de dois mil anos, mas receberam certamente muitas melhorias durante o apogeu do império, o que garantia locomoção mais rápida e orientação de destino segura. O Caminho Inca de
Machu Picchu, na verdade é só uma parte da
Qhapaq Ñan, considerada Património da Humanidade pela UNESCO.
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Praça central de Ollantaytambo, no Vale Sagrado do Urubamba, 7.Setembro.2019, 8h00 |
Às seis da manhã de sábado, 7 de Setembro, lá estava o Washi na "nossa"
Casa Andina, para nos levar para os 4 dias da aventura inca. Agora em direcção noroeste, descemos o curso do Urubamba. Depois de uma paragem num belo recanto rural junto à linha do comboio, parámos também em
Ollantaytambo, a cidade inca mais bem preservada do Peru, com muita animação, muita cor ... e com uma
Igreja de Santiago! Decididamente ... Santiago vigia os meus passos.
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Igreja de Santiago e outro aspecto |
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da Praça central de Ollantaytambo |
A primeira etapa é a mais fácil, com pouca altimetria. À noite, sentado na tenda ... escrevi:
Huayllabamba, Sábado 7 de Setembro
São nove horas no Peru, três da manhã em Portugal. Eu e a Madalena estamos dentro de uma tenda montada num autêntico miradouro natural, sobre o pequeno povoado de Huayllabamba ... no primeiro dia do Caminho Inca. O nosso guia Washi está na tenda ao lado da nossa; os carregadores e o cozinheiro nem sei onde dormem ... só sei que são 5 carregadores e 1 cozinheiro ... para nós dois!
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Piskacucho, 7.Set., 8h55 - 6 carregadores (um cozinheiro)
e o Washi (que tirou a foto) ... para nós dois durante 4 dias |
Além das nossas coisas, eles carregam tudo o que é necessário: tendas (incluindo aquela em que almoçámos), mesas, bancos, tachos, panelas, frigideiras, fogão ... tudo! E é impressionante ver o que estas almas carregam às costas ... e a velocidade a que mesmo assim eles caminham. Estamos apenas no primeiro dia do Caminho Inca ... mas já ambos temos a sensação de estarmos a viver um filme, um sonho, uma aventura neste mundo tão diferente do nosso. Este povo vive ao sabor do ritmo da Natureza, sem pressas, sem stress, dando-nos também uma lição de respeito por essa mesma Natureza, da qual dependem. Todo o lixo é separado, orgânico, papel, plástico (que evitam usar), tudo ... e tudo é transportado para onde será reciclado. Na montanha, na Natureza ... apenas ficam as pegadas que deixamos.
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Piskacucho, 9h30 - Cruzando o Urubamba, começávamos o Caminho para a cidade perdida de Machu Picchu... |
Saímos de Cusco às seis da manhã, seguindo o curso do rio Urubamba, ou Vilcanota, e seguindo também o percurso do Inka Rail, o comboio de Machu Picchu. A principal povoação atravessada, Ollantaytambo, foi a última cidade inca colonizada pelos espanhóis ... e nela fui encontrar uma Igreja de Santiago! E às nove da manhã estávamos no Km 82 do comboio, em Piskacucho. Era aí que começava a aventura: 4 dias seguindo o Caminho Inca para Machu Picchu. E logo aí ... sentimo-nos num outro mundo. Turistas sedentos de pôr os pés ao Caminho, como nós; carregadores a tirarem os materiais das carrinhas e a porem às costas sacos e mochilas gigantes, seguramente não menos de 20 a 25 kg; a fila para o registo de entrada no Caminho ... de entradas previamente reservadas, com meses de antecedência; a passagem pelo Centro de Interpretação do Caminho Inca, onde o nosso guia Washi nos deu as primeiras explicações sobre a fauna e flora que poderíamos encontrar, desde os pumas aos ursos, serpentes, orquídeas e colibris. E depois ... iniciámos o Caminho, com o rio Urubamba à nossa direita, correndo para o Amazonas ainda distante. A meio da manhã ... os carregadores ultrapassaram-nos velozmente, para poderem ter pronta a logística do almoço no local previamente combinado ... findo o qual desmontam tudo ... para de novo nos ultrapassarem e montarem o acampamento seguinte! Quanto ganham ... não fazemos ideia. São autênticos heróis!
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No troço inicial, o Caminho Inca de Machu Picchu segue o vale do Urubamba e a linha férrea que conduz a Aguas Calientes |
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Durante o primeiro dia ... a Madalena e eu fomos incas.
pintou-nos as faces. Caminhantes de outros |
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Com um produto natural retirado de umas plantas, o Washi
grupos olhavam-nos admirados e invejosos... |
Piskacucho está apenas a 2670 metros de altitude ... pouco mais de metade do Winikunka, onde estivemos ontem. O dia estava ameno; ao fim de algum tempo já caminhava de manga curta. Entretanto o Washi ... pintou-nos a face aos dois com um corante natural que retirou de uma planta. Agora ... também nós éramos verdadeiros quíchuas! Uma primeira paragem no pequeno povoado de Mesccay introduziu-nos no conceito dos sanitários existentes: 1 Sol (cerca de 27 cêntimos) em troca de um pedaço de papel higiénico e da utilização das instalações rudimentares.
Com pouco mais de duas horas de andamento, estávamos frente às ruínas incas de Llaktapata e do respectico Templo do Sol. Sentimo-nos recuar no tempo ... e sentimo-nos pequenos ante a imponência dos dois vales que tínhamos à frente: à direita, o Urubamba, à esquerda o seu afluente Huayllabamba, que iríamos seguir até ao final desta primeira etapa ... não sem que, à hora do almoço, nos sentássemos à mesa na tenda montada para o efeito, para nos deliciarmos com as primeiras iguarias do Caminho, acompanhas com chá ... de coca, pois claro.
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Ruínas incas de Llaktapata e respectivo Templo do Sol (em cima, à esquerda) e o imponente vale do rio Huayllabamba |
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Subida ao morro sagrado, sobre as ruínas de Llaktapata e o vale do Huayllabamba |
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Estávamos, definitivamente, no Paraíso (pequeno povoado de Tarayoc, no vale do Huayllabamba) |
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Primeiro almoço de campo, no vale do |
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Huayllabamba ... e com todas as mordomias... |
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O que não tínhamos, naturalmente, era qualquer rede WiFi;
blackout total. Apaixonada pelo ténis ... perdi a conta às vezes
que a Madalena se queixava que não poderia saber os resultados
do US Open, nem do seu muito admirado Rafael Nadal... 😜
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O rio Huayllabamba desce das alturas. São duas da tarde e estamos a 2700 metros de altitude |
E continuando o que escrevi à noite, na tenda...
À medida que subíamos o vale, suavemente, as montanhas apontadas ao Céu acompanhavam-nos, ora descobertas, ora com nuvens claras a cobrir-lhes os cumes. Outros grupos de caminheiros e respectivos guias - menos do que esperava encontrar - e carregadores, muitos carregadores ... a passarem por nós como se levassem plumas. Já próximo do final da etapa, uma paragem para observação de aves ... e várias aves brindaram-nos com o seu voo, como bandos de araras, ou com o seu trabalho de polinização, como os colibris, ou beija-flores. Estávamos encantados ... e o nosso guia encantado com o nosso encanto. Washi ... serás recordado para sempre como um amigo, um companheiro que está a fazer connosco este Caminho mítico. Bem hajas!
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Não há palavras para descrever tamanha beleza, tamanha |
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interacção com uma Natureza exótica, bela, preservada! |
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Huayllabamba, 7.Setembro.2019, 15h30 ... chegávamos ao primeiro acampamento |
Antes das quatro da tarde estávamos no nosso acampamento em Huayllabamba, com pouco mais de 13 km percorridos, numa etapa fácil, com pouco desnível. Amanhã sim ... a etapa será bastante mais dura. Estamos a 3020 metros de altitude ... amanhã subiremos mais de 1200 metros...! Mas amahã ... é amanhã. Um dia de cada vez, a Vida vive-se ao ritmo e ao sabor do Universo ... do céu estrelado e da Lua que temos à frente.
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Miradouro natural ... num hotel de todas as estrelas... |
A tenda já estava montada quando chegámos, com os nossos pertences dentro e dois colchões para colocarmos os nossos sacos cama. O Washi fez a siesta na tenda dele. Às seis horas chamaram-nos para umas pipocas, um chá de coca e umas bolachas com doce. E logo a seguir o jantar. Sim, porque de hoje até terça feira funcionamos à luz de frontais ... e o Sol põe-se pouco depois das cinco e meia.
Para terminar ... não posso deixar de dedicar este primeiro dia deste meu Sonho de um dia fazer Machu Picchu ... ao meu saudoso Zé "Malhadinhas". Se fosse vivo, faria hoje 88 anos. Parabéns, onde quer que esteja; pai da minha "estrela" ... talvez esteja por entre as estrelas...
1 comentário:
Deslumbrante e apaixonante reportagem, com imagens de sonho!!!Parabéns e obrigado Callixto
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