quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Travessia Vale de Espinho - Meimão - Santo Estêvão - Sortelha

As fugas para o nosso retiro raiano proporcionam-me sempre fugas para os grandes espaços que tanto adoro ... fugas para pôr à prova estas septuagenárias pernas, que espero bem que continuem por mais uns anos - de preferência muitos - a deixar-me calcorrear serras e vales, prados verdejantes e barrocos ... "por fragas e pragas..." 😊
A jornada de hoje correspondeu a todos estes items: calcorreei serras e vales, prados verdejantes, barrocos, alguns com formas fantasmagóricas! Há muito tempo que idealizava ir à aldeia histórica de Sortelha a pé desde Vale de Espinho. Já fui bem mais longe: Alpedrinha, Penha Garcia ... para não falar em Santiago de Compostela. Mas Vale de Espinho - Sortelha foi ficando para trás,
Vale de Espinho, 28.fev.2024, 06h30
À luz da Lua branca das ribeiras, começo a "peregrinação"...
particularmente por se tratar de um projecto que dificilmente possibilitaria ida e volta. De Vale de Espinho a Sortelha são no mínimo 28 km ... mas um projecto por estrada claro que não me interessaria. Ida e volta, pelos caminhos da minha paixão, rondaria os 62 km, o que, não sendo impossível (já fiz muito mais), levaria a terminar já de noite, nesta altura do ano. Assim, apenas com um esboço de percurso no pensamento, saí do "ninho" passavam vinte minutos das seis da manhã, ainda noite; o termómetro marcava 2ºC ... feels like -3º ... mas a neve há muito que se tem afastado destas terras, até porque o dia ia estar de um esplêndido Sol de inverno.
Ao cruzar o Côa, no pontão a caminho do Vale da Maria, a Lua, cheia há apenas quatro dias, iluminava-me o caminho. Não cheguei a usar o frontal, até porque rapidamente começou a clarear o dia, à medida que subia para o Cabeço da Moira ... onde já várias vezes fui ver o Sol nascer.

Cabeço da Moira, 07h20 (1076m alt.)
Cruzamento do Espigal, 07h35
Espigal, 07h50, junto à Fonte e à antiga Casa Abrigo da Portucel
No Espigal fiz a primeira pequena paragem (uns meros 5 minutos), com sensivelmente 8 km percorridos a bom ritmo. E a média aumentou ao longo da cumeada, passando próximo dos geodésicos do Homem e do Alísio, talvez o troço mais monótono da travessia, até porque esta cumeada poderia bem chamar-se ... a cumeada das eólicas ... a suposta energia limpa. Só a poluição sonora seria suficiente para não a considerar limpa, mesmo que outras formas de poluição não tivesse; ao contrário de quase todo o resto do percurso ... ali não ouvi aves a cantar ou a esvoaçar...
Com 17 km em pouco mais de três horas, às 09h30 tinha o Meimão à vista, lá no fundo do vale da Ribeira do Arrebentão
Não foi a primeira vez que fui ao Meimão ... nem mesmo a pé desde Vale de Espinho, como agora ... mas hoje apeteceu-me dedicar esta "peregrinação" e estas fotos à mãe da minha "pequena arraiana", que ali nasceu e foi criada e que ainda hoje recorda a infância, com muita saudade. E dediquei também aqueles momentos à minha ex-aluna Teresa Maia, para quem o Meimão também diz muito e que sempre comenta, também com saudade, aquela aldeia "perdida" num vale encravado entre a Ribeira da Meimoa (que se devia chamar do Meimão) e o Côa.

Meimão: o Pátio Cerdeira e a Igreja ... saudosas
memórias para a mãe da minha "estrela arraiana"...
E o Meimão fica para trás, cruzada a Ribeira do Arrebentão
Se mantivesse uma média geral de 5 km/h, havia hipóteses de chegar aos 60 km até ao pôr do Sol e de, portanto, poder completar a caminhada circular. Quando saí do Meimão, a média estava nos 5,4 ... mas eu sabia que iria diminuir ... como diminuiu, na longa subida para Santo Estêvão. Subida ... para o alto da Pirraceira, porque depois havia que descer aos vales das Ribeiras da Marquesa e da Azenha, antes de voltar a subir para Santo Estêvão, talvez o mais belo troço de toda a jornada.

Santo Estêvão à vista, na primeira foto com a Serra d'Opa à esquerda
O sino de Santo Estêvão batia as 11h00 quando entrei na aldeia
A seguir a Santo Estêvão ... a subida continuava, rumo ao Alto da Lomba e à Ribeira da Nave, seguindo alguns troços da GR 22, a Grande Rota das Aldeias Histórias ... mas sem fazer as reviravoltas mirabolantes que aquela estranhamente faz. A Serra d'Opa ia ficando para trás, num troço igualmente muito bonito, particularmente junto à Ribeira da Nave e, a seguir ... no "reino" dos barrocos...
Um adeus à Serra d'Opa, à medida que subia de Santo Estêvão para a Ribeira da Nave
Ribeira da Nave, 11h55 - Bucolismo e ruralidade...
No reino dos grandes barrocos graníticos...
E ... Sortelha à vista, 12h50 - Um portal para a aldeia histórica
Entretanto a média baixara para uns "míseros" 4,6 km/h ... e iria baixar mais. É que cada "doido" tem sua mania ... e este "rapaz pacato" tem a mania de não repetir caminho, pelo menos na mesma jornada; ora, para não entrar e sair de Sortelha pelo mesmo caminho, quis subir por um velho caminho virado a sul, que me levaria directamente à entrada das muralhas. E levou ... só que levei o melhor de três quartos de hora para subir a íngreme ladeira, onde o caminho é tão velho que muitos degraus já não existem ... e onde a vegetação tomou conta da maior parte. A forma de regresso estava traçada... 😂

O "assalto" ao Castelo de Sortelha,
pelo velho caminho virado a sul
Eram 14h10 quando entrei na área amuralhada da aldeia histórica ... com as cerejeiras a receber-me
Regressar a pé a Vale de Espinho estava inviabilizado. Por isso, apesar de conhecer bem aquele local histórico e místico ... dei a volta pelas muralhas com calma. Perguntei no posto de turismo se havia autocarro para o Sabugal; a resposta foi um não sem dúvidas, que havia ao fim da tarde mas do Sabugal para lá, trazendo estudantes. Bem ... talvez fosse a pé até ao Sabugal (cerca de 14 km), para isso ainda tinha tempo ... mas mais abaixo veremos que informações presta o posto de turismo...

Sortelha, 28.fev.2024, 14h25 - Muralhas com história ... e junto à Igreja de Santiago
Clique na foto ou aqui para ver o álbum completo de fotos destes 34 km de travessia Vale de Espinho - Sortelha
Clique na foto para ampliar ou aqui para ver no Wikiloc
Descendo das muralhas, os meus "ticos e tecos" pensavam em duas hipóteses: continuar a pé para o Sabugal (onde sabia que tinha autocarro para Vale de Espinho às 17h30) ... ou apanhar um táxi ou um TVDE directamente   para casa 😄
Táxi ou TVDE ... não havia ... nem ninguém que me soubesse indicar onde andaria. Mas nisto ... vejo chegar um autocarro; sem ninguém na paragem, não teria parado se não fossem os meus berros a chamá-lo. Mas o simpático motorista lá parou e, com o autocarro só para mim ... viemos a conversar sobre as minhas caminhadas na raia e não só. Claro que lhe contei a informação que me haviam dado no posto de turismo; "nem se quiseram dar ao trabalho de ver o horário", disse-me. E assim, antes das quatro horas estava no Sabugal ... pelo que agora as duas hipóteses passavam a três: esperar mais de hora e meia pelo autocarro para Vale de Espinho ... ir a pé ... ou apanhar um táxi ou TVDE. Ir a pé já chegaria de noite e não faria muito sentido, seria uma caminhada com um hiato entre a Sortelha e o Sabugal ... esperar mais de hora e meia não me apetecia ... apeteceu-me mais fazer a surpresa à minha menina arraiana e chegar mais cedo do que o previsto. E foi uma menina motorista que me levou a casa 😆. Malcatenha ... viemos também a falar das minhas "aventuras" raianas; "um dia também gostava de fazer o Caminho de Santiago", disse-me quando lhe contei que já fui a pé de Vale de Espinho a Santiago de Compostela...! Gostei deste dia!

domingo, 4 de fevereiro de 2024

Regresso aos vales suspensos do barlavento algarvio

Em dezembro de 2020, no auge da covid, este "rapaz pacato" e a sua pequena arraiana comemoraram uma data especial em terras algarvias, embora seja muito mais frequente rumarmos a norte do que a sul. Os famosos "sete vales suspensos" cativaram contudo a nossa atenção ... tal como agora levaram duas "gasparitas" a organizarem a actividade de fevereiro dos Caminheiros Gaspar Correia naquelas terras do barlavento algarvio. E assim, embora repetindo os já conhecidos "vales suspensos" no percurso de sábado, claro que alinhámos com a nossa família caminheira; aliás, no próximo mês o grupo comemora a bonita idade de 39 anos ... com fundadores do grupo ainda no activo, a participar nas caminhadas e no são convívio que sempre foi uma das principais imagens de "família".
Ponta e Capela de Nossa Senhora
da Rocha, 03.fev.2024, 10h50
Antes das onze horas de sábado, estávamos na Ponta da Senhora da Rocha, a sul de Porches e a poente de Armação de Pêra. O percurso iniciava-se ali, em sentido nascente / poente, ao longo dos acantilados daquele maravilhoso litoral. Entraríamos nos "7 vales suspensos" na Praia da Marinha, até ao Vale de Centeanes, onde tínhamos feito base em dezembro de 2020.

Ao longo da paisagem cársica de Porches à Praia da Marinha
O rendilhado da costa leva-nos a um permanente sobe e desce, cruzando barrancos que quase sempre desembocam acima do nível do mar - os "vales suspensos". Cada vale esteve associado à foz de uma ribeira, devendo-se a sua formação a um recuo rápido do litoral, não acompanhado pelo entalhe da linha de água. A erosão modelou uma diversidade geológica que se sucede ao longo de todo o percurso: arcos, grutas, algares e leixões, das quais a gruta de Benagil é a mais conhecida.
Gruta de Benagil e a respectiva aldeia piscatória, 14h45
De Benagil ao Farol de Alfanzina
E de Alfanzina ao Vale Centeanes e Vale Covo
Eram quase cinco e meia quando chegámos ao Algar Seco ... just in time para um espectacular pôr do Sol naquele local sempre mágico e no pequeno troço que nos faltava para o Carvoeiro. que marcaria o final da "primeira etapa" deste fim de semana algarvio.

Pôr do Sol sobre o Algar Seco e a praia e vila do Carvoeiro, 17h45
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A base de pernoita foi em Lagoa, onde também decorreu o habitual Carnaval caminheiro ... uma semana antes do Carnaval. Mas nem o desfasamento de calendário, nem os 12 km percorridos e nem sempre fáceis desmotivaram os habituais aficionados. Por acaso ninguém se mascarou de princesa moura ... a princesa que, segundo rezam velhas lendas, ainda hoje chora a morte do seu amante, originando com as suas lágrimas o rendilhado tão característico da rocha calcária do litoral... 😏
E domingo ... tínhamos nova caminhada. Embora em sentido contrário (poente / nascente), com ela completaríamos praticamente a ligação até Ferragudo, onde começámos, na foz do Arade.


A foz do Arade em Ferragudo, destacando-se o Forte de S. João e a Praia Grande, 04.02.2024, 09h50
De novo com um dia primaveril, como na véspera, a visibilidade estendia-se até terras de Lagos e de Sagres, enquanto da barra do Arade, entre Ferragudo e a Praia da Rocha, zarpavam umas largas dezenas de canoas em regata. A partir do Farol da Ponta do Altar, seguimos rumo ao Carvoeiro, num percurso com características semelhantes ao da véspera.

Praia do Pintadinho, à saída da barra do Arado, do qual saía uma regata de muitas dezenas de canoas à vela
"Ninguém é dono do mar" ... mas a minha tradicional entrega à Natureza, ao Universo, também era, aqui, uma entrega ao mar...
Sempre com o mar à nossa direita, a jornada prosseguiu para nascente, até à Praia dos Castelos
Já almoçados, antes das duas horas estávamos quase no Carvoeiro e a inflectir para o ponto onde o autocarro nos recolheria. Aproximava-se o final das actividades ... e a viagem de regresso a Lisboa.

No final do percurso ... um cheirinho de bosque, quando deixámos o litoral
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Apesar de eu ser mais "lá dos montes que medem o céu ... das frias serras onde primeiro o Sol nasceu" ... também gosto - e muito - das paisagens litorais ... principalmente quando se trata de fabulosas paisagens como estas da costa do barlavento algarvio.
Obrigado às organizadoras!
Obrigado Caminheiros Gaspar Correia 💖

As paisagens e o chamamento do mar ... até deram para editar um pequeno vídeo, baseado nas fotos desta "crónica", mas também noutras e em diversos clips animados. Obrigado também ao Sebastião Antunes, pela música magistral que compõe 💕