Regressado ontem das terras mágicas do
Gerês, apetece-me escrever que vivi (vivemos) intensamente a semana que passou! Primeiro, três dias de autonomia, a dois, bebendo a montanha, quase tocando o céu, dormindo ao som dos chocalhos ou do correr das águas, sentindo-nos parte um do outro mas também parte daquelas montanhas mágicas, daquele
Juriz - Gerês que eu amo, do qual não me canso,
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Ponte da Ribeira do Campesinho, Pitões das Júnias, 12.07.2012 |
no qual descubro novas cores, novos sons, novas sensações.
À autonomia dos três primeiros dias, descrita no
post anterior, seguiu-se na 5ª feira uma jornada a solo completamente diferente, em que a montanha virou bosque, em que os desfiladeiros e os picos rochosos se transformaram numa panóplia de ramos, folhas, sombras e reflexos, em que as águias se transformaram em borboletas e em melros, esvoaçando à minha volta, posando para a minha câmara, em que as águas se precipitam em alvos lençóis de seda pura, saciando-me a sede e a alma.
Intervalando este peregrinar, a
sexta feira 13 de
Montalegre foi, para nós, um banho de espanto! Jamais imaginámos a dimensão daquele acontecimento, daquela autêntica festa do "país" barrosão. Jamais imaginámos o banho de multidão em que nos vimos envolvidos, o esplendor da recriação de rituais profanos e sagrados, cultos e ocultos.
Finalmente, sábado, também a solo … "encontrei" a aldeia quase mítica de
Juriz, a aldeia medieval de
Sancti Vincencii de Gerez, referida já nas Inquirições Afonsinas, onde parece ter havido um castro celta, onde o denso carvalhal camufla e protege os toscos vestígios do povoado, onde se ouvem nas sombras as especulações sobre o seu abandono no século XV, talvez devido à peste, talvez devido a uma praga de formigas … talvez ... talvez!
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Na "igreja" do "castelo" da aldeia velha de Juriz, 14.07.2012
Que turbilhão de sentimentos! |
Sei que é difícil entender estas sensações para quem não as vive.
É a entrega, a comunhão, o êxtase, a partilha, tudo junto num turbilhão de sentimentos de superação, de con-quista … de felicidade! Lá, junto à cruz da "igreja" do "castelo" de
Juriz … eu ajoelhei-me, eu comunguei, eu senti a energia telúrica daquele pétreo "altar". A sudoeste, lá do alto da sua fraga, a
Ermida de S. João parecia dizer-me que eu estava ali bem, que eu estava a fazer parte da paisagem! Mais do que nunca, senti o rosto queimado pelo vento, os olhos em busca do destino no horizonte longínquo, senti-me a escutar a majestade do silêncio ... senti-me incluído num texto que adorei e que, em Janeiro, veio ter comigo por acaso, escrito por um outro amante da montanha que nem sequer conheço pessoalmente...
Gente dura, os montanheiros!
Rostos queimados pelo vento,
Olhos que buscam o destino no horizonte longínquo
... Gente dura, os montanheiros!
Aceitam o sopro gelado da montanha,
Enfrentam o calor do seu abraço nas duras encostas.
Numa quimera inútil e sem fim, palmilham os trilhos!
... Gente dura, os montanheiros!
Gente que escuta a majestade do silêncio, nos grandes espaços,
Gente que explode de alegria com o sucesso conjunto,
Gente que se detém extasiada na imensidão das paisagens,
Gente pronta a dar a mão ao companheiro,
... Gente dura, os montanheiros!
Na quinta feira, a minha pequena "salta-pocinhas" preferiu ficar a descansar da fabulosa autonomia que tínhamos feito nos três dias anteriores. Da Estalagem "
Vista Bela" à aldeia de
Parada foi um salto, e pouco depois das nove da manhã estava a iniciar, a solo, uma caminhada circular que me levaria a
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Parada do Outeiro, 12.07.2012, 9:20h - Início de mais uma jornada pedestre |
Pitões das Júnias. Pela primeira vez chegava a Pitões a pé, através do fabuloso bosque que ladeia a encosta esquerda dos ribeiros do
Beredo e do
Campesinho, cujas águas correm para a barragem de Paradela e para o Cávado. Antes, contudo, já havia passado pelo
Fojo do Lobo de Parada, pouco depois do qual se abriu o "ecrã" magnífico dos
Cornos das Alturas, que coroam a aldeia de Pitões das Júnias.
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Fojo do Lobo
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de Parada
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E abrem-se os horizontes, do S. João da Fraga à Brazalite |
Pouco depois entrava no
carvalhal do Beredo ... e num mundo de cores, sons e sensações mágicas!
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Panóplia de ramos, folhas, cores, sombras, reflexos ... vida! |
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Ponte sobre a Ribeira do Campesinho, 12.07.2012 |
A ribeira do
Campesinho é afluente do
Beredo. As suas águas são as que bordejam o vetusto
Mosteiro de Santa Maria das Júnias, precipitando-se depois na famosa
Cascata de Pitões ... onde perdi a conta às vezes que lá fui nos últimos 30 anos! A menos de 200 metros a poente da cascata e cerca de 100 metros mais abaixo, o conjunto de pequenas cascatas junto à ponte de madeira do Campesinho não é contudo menos belo. É um jogo de verdes, da água e da pedra, da luz e da sombra, desafiando os limites da nossa imaginação criadora e poética.
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Jogo de verdes, de água e de pedra, de luz e de sombras, junto à ponte do Ribeiro do Campesinho |
À ponte do Campesinho seguiu-se a subida para
Pitões das Júnias, onde claro que não podia faltar à visita à "
Casa do Preto" ... a "minha" casa em Pitões há mais de 30 anos! As duas senhoras Marias, mãe e filha, fizeram-me mais uma vez uma festa ... e obrigaram-me a prometer que lá voltaria com a minha parceira. Em boa hora o fizeram, adiante se perceberá porquê...
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Pitões das Júnias à vista, 12.07.2012 |
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outros dois pontos "míticos" em Pitões das Júnias!
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O regresso de Pitões a Parada do Outeiro programara fazê-lo pelo vale da ribeira das
Aveleiras e encosta da
fraga de S. João. Nunca gosto de ir e vir pelo mesmo caminho, além de que esta alternativa me permitiria procurar a quase mítica aldeia velha de
Juriz, "perdida" nos carvalhais, algures entre aquele vale e o do
Beredo. Em tantas e tantas vezes em Pitões, há muito que ambicionava sentir o peso da história e das estórias daquela aldeia. Passei-lhe perto quando da travessia
Pitões - S. João da Fraga - Cornos de Candela - Portela do Homem, em Junho de 2010, mas a dimensão da jornada não permitia a procura dos vestígios de Juriz. Seria agora que ia finalmente encontrá-la?
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Descida para SW, para o vale das Aveleiras e do Beredo: abrem-se os horizontes sobre a barragem de Paradela |
Já no vale, sob o denso arvoredo, pouco passava das duas da tarde de 5ª feira quando iniciei a busca. A carta 18 assinala o lugar do "
Castelo" ligeiramente acima da ponte sobre a ribeira do Beredo, pelo que foi aí que tentei, em vão, encontrar a mítica aldeia. Um pouco a norte, subindo o Beredo, um pouco a leste ... mas nada. Mais de hora e meia depois e de alguns declives acentuados e silvados ... desisti. Até porque ainda tinha de regressar a Parada do Outeiro. Mas, como toda a luta tem um prémio, esta primeira procura inglória do
Juriz deu-me o privilégio de ver uma corça em plena liberdade! Curiosa, parou à distância a olhar-me ... ou a pedir para que a fixasse na fotografia!
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Na senda da aldeia velha do Juriz ... tive o privilégio
de fotografar uma corça (Capreolus capreolus) |
Em cerca de duas horas regressei a
Parada, pela base do
S. João da Fraga e cruzando de novo o
Beredo já próximo da barragem de Paradela.
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Na base da Ermida de S. João, que me
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vigiava do cume da sua Fraga
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Numa floresta de fetos, no percurso de regresso a Parada do Outeiro |
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Nas Voltas do Pala Serra, rumo à barragem de Paradela, 12.07.2012 |
Mas o destino e a minha amiga "
White Angel ", responsável pelo
blog "
Alma de Montanhista", quiseram que eu voltasse a
Juriz ... e encontrasse a aldeia "perdida"! Efectivamente, na sexta feira 13 encontrámo-nos na "
Noite das Bruxas", em Montalegre, o tal monumental evento que nos levou ao Barroso. Aquela que é, muito provavelmente, a pessoa que actualmente melhor conhece a Serra do Gerês, deu-me as preciosas indicações que me guiaram e levaram ao Juriz perdido no tempo! Como tinha prometido às Sr.as Marias voltar a Pitões e à "
Casa do Preto" com a minha parceira ... sábado lá estava eu de novo na senda daquela que foi, provavelmente, a primitiva aldeia de Pitões e a que deu origem ao nome da própria Serra:
Gerês! Verificando que o erro de quinta feira foi ter avançado demasiado para o vale do Beredo, concluí também que tinha estado ... a escassos 100 metros da aldeia!!!
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"Casas" e "ruas", na aldeia velha do Juriz, 14.07.2012 |
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E de repente, por entre a ramagem ... surge a cruz da velha "igreja" do Juriz |
No "castelo" da aldeia velha de
Juriz, o turbilhão de sentimentos é avassalador. Coroando a rocha onde se terá localizado um castro celta, a cruz assinala a "igreja" de
Sancti Vincencii de Gerez. Dela se divisa Pitões, ao fundo, dela se dominam os vales das ribeiras das
Aveleiras e de
Beredo. Na aldeia propriamente dita, são visíveis os restos de vetustas casas de pedra, dos muros que ladeavam as ruas! Imagens perdidas na noite dos tempos ... imagens gravadas na memória dos tempos!
E como se os amantes do Gerês estivessem pré-destinados a cruzarem-se naquela serra mágica, quando no sábado estava a descer de
Pitões de novo na senda do Juriz ... encontro-me com outro casal de caminhantes, com quem igualmente já havíamos estado na véspera, na "festa das bruxas". Vinham da
Fraga de S. João e das alturas da
Fonte Fria ... onde a "
White Angel " e um pequeno grupo se encontrava igualmente no sábado, em autonomia, a caminho do galego
Prado Seco. O Gerês não só atrai como une os seus amantes!
Como habitualmente, aqui ficam os percursos realizados na quinta feira e no sábado ... retirando do de 5ª feira as voltas e voltinhas na inglória busca pela aldeia perdida ... e encontrada.