domingo, 12 de fevereiro de 2023

Nos passadiços do Alto Mondego e em terras de Belmonte

Em Setembro de 2013 participei numa memorável travessia da Serra da Estrela, em quatro dias, da pequena aldeia de Vila Soeiro a Louriga, subindo e cruzando os vales dos dois grandes rios da Estrela, o Mondego e o Zêzere. Passados quase 10 anos, era com expectativa que aguardava a actividade de Fevereiro dos Caminheiros Gaspar Correia, projectada para os novíssimos Passadiços do Alto Mondego, que ligam Videmonte a Vila Soeiro e à albufeira da Ribeira do Caldeirão.
Passadiços do Alto Mondego, 11.Fev.2023, 10h30 - Uma "moda" de duvidosa educação ambiental...
Como tantas outras, a "moda" dos passadiços tem alastrado em Portugal como uma praga. Sem incorrer em oposições fundamentalistas, como amante da Natureza e como biólogo não posso ver com bons olhos a proliferação desregrada destes equipamentos. Os primeiros passadiços de que há registo em Portugal foram os das Dunas de S. Jacinto, onde aliás levei largas dezenas de alunos nos anos 80 e 90 do século passado; destinavam-se a permitir o acesso sem pisotear o cordão dunar, evitando a degradação do solo e da flora. Mas a esta função de preservação e de educação ambiental rapidamente se sobrepuseram interesses económicos e uma ausência quase completa de estudos de impacto ambiental e visual ... o que particularmente em áreas montanhosas acaba por inverter os objectivos ligados à preservação e divulgação de uma paisagem "natural" e "imaculada".
Cascata do Ribeiro dos Moinhos, 10h40 - Tínhamos
começado o percurso Videmonte - Vila Soeiro
Ao longo do Ribeiro dos Cabris. Por baixo dos passadiços está o velho trilho pedonal ... para quê a madeira?
Ponte suspensa junto à Quinta dos Cabris, 11h30
Ruínas da Quinta do Fojo, 11h50 - Há 10 anos também aqui passei em sentido contrário
Partindo de próximo de Videmonte, o troço inicial cruza as ribeiras dos Moinhos e dos Cabris, afluentes do Mondego, que passámos a acompanhar desde a foz da segunda daquelas ribeiras. A partir das ruínas da Quinta do Fojo já conhecia a paisagem; em 2013 tinha vindo em sentido contrário, subindo depois para a aldeia de Trinta para continuar a subir o curso do rio Mondego.

Descendo o vale do Alto Mondego, nesta última foto já com Vila Soeiro ao fundo
Final dos passadiços em Vila Soeiro, 15h00
Ao fim de cerca de 10 km maioritariamente "emparedados" ... ao chegar a Vila Soeiro sinceramente já estava farto de madeira. Claro que a paisagem continua a ser fabulosa, claro que as cascatas, os cantos e os recantos do Mondego, as encostas, a luz e as cores, tudo contribuiu para que este dia frio de Inverno, mas de um Sol radioso, tenha sido um óptimo dia, na companhia da minha "família" caminheira de há já mais de 20 anos, com a minha "colega especial" neste ano especial, com a nossa neta caminheira e com os nossos "Manos Velhos" caminheiros ... mas a paisagem era ainda mais fabulosa e, principalmente, muito mais natural e imaculada ... sem as toneladas de madeira que de todo o lado se vêem à distância, "riscando" as encostas como quem risca um belo quadro.
Vila Soeiro - Para alguns, a caminhada terminaria aqui; para outros ... ainda havia que subir à albufeira do Caldeirão
Em Vila Soeiro havia três opções: quem quis foi recolhido pelo autocarro, mas para quem ainda tivesse vontade de percorrer mais cerca de 2 km poderia subir a calçada romana que liga aquela aldeia a Pêro Soares ... ou subir os quase 800 degraus do prolongamento dos passadiços até à albufeira do ribeiro do Caldeirão. O leitor está a ver qual foi a minha opção, não está?
Calçada romana entre Vila Soeiro e Pêro Soares
A meio da calçada romana ... descobri um "trilho"
a subir a bom subir para a albufeira do Caldeirão
Panorâmica sobre Vila Soeiro, de junto à Barragem do Caldeirão
Com a devida comunicação aos organizadores, este troço final da caminhada fi-lo em autogestão: como as fotos acima ilustram, a pouco mais de meio da calçada romana vi à minha direita um trilho que se dirigia à conduta de água vinda da albufeira ... e foi por ela que "trepei" os cerca de 150 metros de desnível, a solo, enquanto o resto do grupo subia o resto da calçada, uns, e a "interminável" escadaria de madeira dos passadiços, outros. Encontrámo-nos todos próximo do Miradouro do Bufo Real, sobre o profundo vale a jusante da albufeira, onde o autocarro nos recolheu.

Albufeira do Caldeirão e o salto por onde a ribeira do mesmo nome se precipitava para o Mondego ... numa panorâmica agora "ornamentada" por mais umas toneladas de madeira...
Mas a actividade dos Caminheiros Gaspar Correia mais próxima do Carnaval é, por tradição do Grupo ... o Carnaval Caminheiro. Assim, aos passadiços do Mondego seguiu-se uma animada noite na Quinta de Santa Iria, próximo de Teixoso, preenchendo a manhã de domingo com uma componente cultural nas terras sefarditas de Belmonte. Acompanhados por uma excelente guia, foi sem dúvida um enriquecimento em termos da história e da cultura da comunidade judaica de Belmonte.
Quinta de Santa Iria, Teixoso, 12.Fev.2023, 8h20 - O dia despertara mais enevoado do que a véspera
Igreja de Santiago ... Belmonte também é Caminho de Santiago!
Imagens de uma bela manhã em Belmonte, com a Serra da Estrela em pano de fundo, à direita
De regresso à capital ... brindados por um belo pôr-do-Sol
(Clique para ver o álbum completo de fotos)
Percurso de sábado no Alto Mondego
(Clique no mapa para ampliar ou aqui para ver no Wikiloc)

6 comentários:

Margarete disse...

Obrigada Zé pela tua descrição e pontos de vista que até colidem com os meus. A atividade fica sempre mais enriquecida depois de ler o teu relatório.
Bjs
Margarete

Zita disse...

Olá Zé Carlos que bela caminhada...
Pela descrição e fotos imaginei-me inserida no grupo.
Um grande abraço aos meus amigos caminheiros.

Paulo Neves disse...

Bom relato Callixto. Subscrevo a tua posição sobre o excesso de passadiços. Neste caso em concreto são especialmente exagerados, criando a sensação de "encurralado". Abraço.

Anónimo disse...

Que maravilha

José vaz disse...

Mais uma excelente reportagem para mais tarde recordar, a magnífica atividade dos Passadiços do Mondego.
Subscrevo a oportuna crítica da existência de passadiços onde não era necessário, acrescentando que oneram a manutenção desnecessariamente.

Ofélia disse...

Mais um texto interessante e bonitas fotos sobre a atividade das caminhadas. Subscrevo inteiramente o teu ponto de vista. Seria bom que se repensasse a construção de passadiços nível nacional.