terça-feira, 7 de maio de 2019

De Vale de Espinho a Santiago ... pelo Caminho das Estrelas (3)

Ao nosso 9º dia de Caminho, com quase 300 km percorridos desde Vale de Espinho, estávamos a entrar na Galiza, entre a lusa Vilarelho da Raia e a aldeia galega de Rabal, nas margens do Tâmega.
Travessia do Tâmega próximo de Rabal, Galiza, 3.Maio.2019, 11h00
Da raia de Chaves a Ourense ... ou do Tâmega ao Minho
Ourense, 7 de Maio
Ao cruzar o Tâmega em Rabal, faltavam-nos apenas 12 km para Verín, fim de etapa. E em Verín ... íamos finalmente poder conviver com mais Peregrinos, vindos do Caminho Sanabrés, ou mesmo da Via da Prata pela variante Sanabresa. O Castelo de Monterrei surgia no horizonte.
Castelo de Monterrei, como que anunciando a proximidade de Verín. Meia hora depois estávamos lá
O Tâmega em Verín, 13h25
Para quem nas 8 etapas anteriores tinha ficado uma única vez num Albergue (e sozinhos), o Albergue Municipal de Verín, na Casa do Escudo … foi uma dádiva dos céus. Um monumental edifício em pedra, com boas instalações, máquinas de lavar e secar roupa, etc.; cozinha também … mas sem quaisquer utensílios. "Infelizmente levam tudo", dizia o hospitaleiro. Fomos os primeiros a chegar!
Albergue de Peregrinos de Verín, na Casa do Escudo, ou do Asistente
Instalados, roupa a lavar ... e rumámos à Casa do Pulpo. Tínhamos saudades de um bom pulpo á feira...
Quando voltámos ao Albergue, já havia mais Peregrinos ... entre eles um português, sozinho, vindo do Caminho Português do Interior, desde Farminhão (Viseu). "Como é que te chamas?"; "Carlos Duarte", respondeu. Pois ... era o português que tinha ficado no Albergue de Parada de Aguiar na noite anterior à nossa! O Universo tem destas coisas. Iríamos encontrá-lo mais vezes...
Into the light... - Entre Arcucelos e Retorta, no vale do Tâmega, 4.Maio.2019, 10h20
A partir de Verín existem duas variantes, por Laza ou por Xinzo de Limia. Esta última é um pouco mais curta, mas também, ao que previamente tínhamos lido, com muito mais alcatrão. O nosso 10º dia de Caminho teve assim como eixo o vale do Tâmega, rumo a Laza e Vilar de Barrio. E finalmente o nosso Caminho tinha vida, tinha Peregrinos, que encontrávamos no percurso ... ou nos bares existentes.
Matamá, típica aldeia atravessada pela ribeira da Auga Alta, afluente do Tâmega
Río Cereixo, afluente do Tâmega, pouco antes de Laza, 12h15
Bar "Descanso do Peregrino", em Laza
Pedras no Caminho...
No vale do Tâmega, rumo a Tamicelas, 14h15
Até Tamicelas, a jornada tinha sido uma suave subida do alto Tâmega. Mas depois daquela aldeia "perdida" ... tínhamos 400 metros de desnível para subir em pouco mais de 4 km. Mas a envolvência da paisagem fazia-nos esquecer os 25 km que já tínhamos nos pés e o calor daquele início de tarde. Antes das quatro estávamos em Alberguería e no Bar "Rincón del Peregrino" ... que não é um bar qualquer.
O vale do alto Tâmega, com a aldeia de Tamicelas ao fundo, da subida para Alberguería
No "Rincón del Peregrino", em Alberguería ...
um "oásis" no "deserto"...
O "Rincón del Peregrino" também é um Albergue, frente ao bar, no qual inicialmente planeáramos ficar. Tudo era apelativo: um Albergue rural, de donativo, ocupando duas casas da aldeia, respeitando a arquitectura popular; mas o Luis, o proprietário, explicou-nos que o obrigaram a incluir instalações para deficientes, pelo que se encontra encerrado para obras. E lá tivemos de fazer os 8 km que nos separavam de Vilar de Barrio.
Cruz e milladoiro no alto do Outeiro dos Fariñeiros
Descida para Vilar de Barrio, 17h00
Apenas a 3,5 km de Villar de Barrio, umas apelativas placas levaram-nos ao engano. Aparentemente, tratava-se de uma alternativa; a aldeia onde haveria a suposta asociación e cama estava no mapa - O Veredo - e, segundo o esquema, o desvio era pequeno e havia caminho de saída para ligação.
Indicações, pouco antes de Vilar de Barrio ... que apenas
servem para enganar e cansar os Peregrinos... 😪
Fomos ver ... e qual não é o nosso espanto quando vemos um carro português e outro espanhol ... junto a uma casa decrépita. A receber-nos ... apenas um cão ... e segundos depois uma senhora com aspecto de sul-americana, dizendo-nos ... "aquí no hay nada"; nem caminho! E a solução foi voltar a subir os 350 metros que tínhamos descido. Meia hora depois estávamos no Albergue de Vilar de Barrio, onde já estavam vários Peregrinos, muitos deles que conhecêramos em Verín, ou no Caminho.
11º dia de Caminho, 5.Maio.2019, 9h20 ... nos campos entre Vilar de Barrio e Xunqueira de Ambía
Ao 11º dia ... demo-nos a nós próprios um dia de quase descanso: apenas 14 km. Uma etapa curta, Domingo, Dia da Mãe ... e também o dia em que, a mais de 40 km de distância, na Galiza profunda ... eu via as minhas amadas terras do Gerês (os Cornos das Alturas, na zona de Pitões das Júnias).
Próximo de Vilar de Gomareite, na Galiza profunda
... vejo as minhas amadas terras do Gerês
Antes das dez da manhã ... mais um carimbo nas credenciais, no bar da Asociacion de Peregrinos Bo Camiño, numa terra com o nome de ... Bobadela. E depois ... bosques encantados, ruralidade, espigueiros (hórreos, em galego), paisagens de cortar a respiração ... inspiradoras.

A caminho de Xunqueira de Ambía, numa manhã encantada ... e inspiradora
Este Caminho foi dedicado ao pai da minha estrela ... mas, em Dia da Mãe, ambos dedicámos estas fotos às nossas mães.
A minha, onde quer que esteja, há-de gostar de me ver no meio da Natureza, de que também tanto gostava...
A umas matinais onze e meia estávamos no Albergue de Xunqueira de Ambía, que funciona no regime livre: entramos, instalamo-nos ... e quando a hospitaleira vier fazemos o registo.
As muito boas instalações permitiram cozinhar, dando-nos também ao luxo de um bom descanso, antes de irmos à vila. Uma agradável surpresa: uma vila cosmopolita, com vários bares, um deles com albergue privado, em torno da monumental Colegiata de Santa María la Real, onde inclusivamente fomos encontrar a obra de Mestre Mateo (o artífice do Pórtico da Glória, da Catedral de Santiago); além da Virgem Peregrina ... cuja sombra projecta Santiago (à direita, em baixo).
Jantámos num dos bares da vila ... incluindo uma divinal sopa de lentilhas.
No dia seguinte saímos cedo. Não porque a etapa fosse longa, mas queríamos chegar cedo a Ourense. As previsões meteorológicas apontavam para uma mudança de tempo e o nevoeiro matinal acusava já a anunciada alteração. Com cerca de 40 minutos de caminho, um bom chocolate quente no Café Bar Torre, em A Pousa, deu-nos energia para a etapa ... e quase logo a seguir teríamos seguido a estrada alcatroada, se não tivéssemos o registo GPS de amigos que já fizeram este percurso. No respectivo cruzamento faltam as setas indicadoras desta pequena variante, por Armariz e Armea ... que se traduz numa jornada através do paraíso, em vez do inferno do asfalto. Obrigado, amigos Henrique e Graça!

Imagens de uma manhã mágica, através dos mágicos bosques de Armariz e Armea ... rumo a Ourense
Mas como todo o paraíso acaba, nos últimos km atravessámos um fastidioso polígono industrial. Pelas onze horas tínhamos Ourense à vista, entrando pelo lugar de San Breixo de Seixalbo.
Ourense à vista, à saída de Seixalbo
Albergue de Peregrinos de Ourense
O Albergue de Peregrinos de Ourense situa-se agora no centro da cidade, perto das famosas termas de As Burgas e da Catedral. Abria às 13h, chegámos às 12h30 ... quando se estava a começar a formar a habitual fila de mochilas, a lembrar-nos Lugo, ou Ponte de Lima. Um Albergue novinho em folha (tem 2 meses), com óptimas instalações ... mas cuja cozinha nem um garfo tem...
À medida que chegavam Peregrinos, queixavam-se da muita estrada que tinham feito ... e ficavam de boca aberta quando a Paula lhes mostrava as fotos dos bosques mágicos por onde tínhamos vindo. Não é só em Portugal que há falhas na sinalização dos Caminhos...
No casco histórico de Ourense é fácil encontrar menus completos na casa dos 10 a 15 euros. Por lá almoçámos e jantámos, intervalando algum descanso com um passeio pelas velhas ruas, a Praza Maior, a Catedral (externamente, porque mesmo os Peregrinos pagam, ali... 😪), As Burgas e a Igreja da Santíssima Trindade, construída entre os finais do sec. XII e início do sec. XIII, junto ao antigo Hospital de Peregrinos de S. Roque.
Ourense: a Catedral e As Burgas
Fontes de águas termais de As Burgas, Ourense, de onde brotam águas termais a uma temperatura entre 64 e 68 °C
Entretanto, no Albergue, para além de duas Peregrinas eslovenas e várias outras e outros que já íamos conhecendo ... chegava um português: o "nosso" Carlos Duarte. Andava mais devagar do que nós, dizia ele, gosta de sair mais tarde, também chega mais tarde ... e também ficou de boca aberta com as fotos dos bosques de Armariz e Armea. À semelhança dos outros ... tinha vindo pela estrada.

O Rio Minho em Ourense, 7.Maio.2019, 7h30
No dia seguinte cruzávamos o Minho, ainda em Ourense; a Avenida de Santiago lançava-nos para as etapas finais. Pela 4ª vez cruzávamos o grande rio luso-galaico em Caminhos de Santiago: em 2016 em Portomarín, em 2017 em Lugo, em 2018 entre Valença e Tui e agora em Ourense. No Caminho "da Aventura" também o tinha cruzado, em 2014, pouco antes de Ribadavia.
Clique para ver o álbum completo
(Escrito em casa, depois do Caminho, ao longo dos dias 17 e 18 de Maio)       
Continua

2 comentários:

Zé Pereira disse...

Simplesmente maravilhoso. Ao ler tenho a sensação de estar também a fazer o percurso

Raul Fernando Gomes Branco disse...

Maravilhoso! Obrigado callixto!