segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Novos Trilhos ... nos Caminhos de Fátima

"Os dias de caminhada são um tempo para voltar a ter tempo, para partilhar e ajudar, para crescer e chegar mais longe."
Sob o ponto de vista religioso ... não sei o que sou. Costumo dizer que sou um agnóstico sobre a minha própria gnose...! Contudo, considero-me um peregrino, se aplicarmos à palavra um sentido mais lato: um peregrino dos grandes espaços, um peregrino dos trilhos, das fragas e pragas da vida e da Natureza!
Casais de S. Martinho (Malveira), 25.Out.2013, 8:45h
Começou uma longa "aventura" de 4 dias ...
E um peregrino ... faz-se ao caminho! Ao caminho que se constrói a cada momento, a cada curva de um novo trilho. Os Caminhos de Santiago ou os de Fátima claro que já tinham passado pelo meu imaginário, mas foi o desafio dos "Novos Trilhos" que me fez decidir ... a lançar-me ao "Caminho". E assim, durante 4 dias, percorri quase 140 km, partindo dos arredores da Malveira e passando pela Serra do Socorro, pelo sopé de Montejunto, pelos eucaliptais de Rio Maior, o planalto do alto Ribatejo e atravessando, finalmente, o maciço calcáreo estremenho, chegando ao Santuário de Fátima pelo caminho dos peregrinos. Um percurso duro mas pleno de beleza, paisagística e humanamente falando.

A Serra do Socorro ... com ar ameaçador - 25.Out.2013, 10:50h
Esta "peregrinação" claro que não foi pelas estradas, como as dos peregrinos "tradicionais". Como mandam as "regras" dos "Novos Trilhos" e dos caminheiros, o percurso foi maioritariamente pelos campos, por carreiros e caminhos rurais, com muito pouco alcatrão. Eu ... era o mais velho dos 13 presentes à partida. O número iria depois sofrendo flutuações, através da aquisição de mais 2 elementos no segundo dia e outros tantos no último, mas também por uma baixa na manhã do segundo dia; é preciso saber-se tomar as decisões certas, nos momentos certos, com a necessária coragem .

Próximo da Serra do Socorro e no túnel sob a A8 ...
quando os deuses se zangaram connosco...
No primeiro dia, os deuses enviaram-nos uma boa quantidade de chuva da parte da manhã! Estava prevista ... mas não tanta...! Depois, já com Montejunto no horizonte, os céus lá se acalmaram um pouco, não sem que a meio da tarde deixássemos de ouvir ribombar as hostes celestiais por cima de nós, no que viemos a saber ter-se tratado de um tornado na zona da Ericeira.

Com a Serra de Montejunto no horizonte...
Pelos vinhedos da região oeste
E um Solzinho à chegada ao destino? (Casais da Fonte Pipa)
Sol ... no primeiro dia só o vimos à chegada às nossas primeiras instalações, um anexo ao café da aldeia de Casais da Fonte Pipa, próximo de Vila Verde dos Francos, nas terras do Oeste. O que nem os organizadores sabiam era que nesse "tudo ao molho e fé em Deus" … havia mais camas de casal do que camas individuais; ora, no grupo … casais só havia um! Imagine-se, assim, a companheira organizadora, muito atrapalhada quando se apercebeu do facto, a dizer ao pessoal … "olha, vocês vão ter de acasalar"...! E assim foi...; duas camas receberam dois matulões cada, outras receberam duas mulheres … e lá se resolveu tudo.

26.Out.2013 - A Serra de Montejunto envolta na magia
O segundo dia era a etapa maior: sensivelmente 40 km. Ao contrário do primeiro e do último, sábado e domingo foram uns excepcionais dias de Sol, começando contudo por uma manhã mágica a envolver a Serra de Montejunto. À noite, já em Rio Maior, havia um aniversário ... e portanto um jantar especial.


"Os dias de caminhada são um tempo para voltar a ter tempo,
para partilhar e ajudar, para crescer e chegar mais longe."
E já se caminha de noite ... para chegarmos a Rio Maior com 40 km nos pés
Domingo mudava a hora. Por isso, pelo sono ou pelo cansaço ... dois companheiros atrasaram-se um pouco e, tendo o track GPS com o caminho a percorrer, vieram na peugada do resto do grupo ... até se aperceberem que estavam a seguir o caminho de sábado em sentido inverso...! Rapidamente fizeram inversão de marcha e se juntaram.

Pelos eucaliptais e olivais
de Rio Maior, 27.Out.2013
Próximo de Alcanede
A caminho de Amiais de Baixo, 27.Out.2013 ... com a Serra d'Aire no horizonte
Para o quarto e último dia ... a previsão meteorológica era negra, pelo menos da parte da manhã. E como mandava a previsão ... os céus soltaram as águas durante quase todo o percurso até Minde, onde chegámos encharcados ... nalguns casos até bem aos pobres pés e à roupa interior. Tínhamos entretanto entrado no tradicional Caminho de Fátima, enquanto que até ali tínhamos percorrido velhos caminhos rurais, veredas por vezes abandonadas, trilhos descobertos ... pelos "Novos Trilhos".

Caminho de Fátima, 28.Out.2013

Caminhos da Serra d'Aire ... à chuva...
Minde à vista
Para quem ainda tinha roupa seca, a hora do almoço foi também hora de troca de roupa; a segunda parte da última etapa seria felizmente mais seca. Subimos ao Covão do Coelho ... e descemos gradualmente para a Cova da Iria, numa tarde cinzenta mas que se manteve sem chuva.

Reina a boa disposição, a caminho do objectivo final!
Pouco antes das quatro e meia de uma tarde cinzenta de Outubro ... entrámos no recinto do Santuário de Fátima. Seja-se o que se seja do ponto de vista religioso, entrar em Fátima mexe com o íntimo de qualquer mortal. Sem que naturalmente tenhamos combinado nada, das conversas e galhofadas que caracterizaram todo o percurso passámos ao silêncio meditativo ... ou à meditação silenciosa.

28.Out.2013, 16:25h - Com 138 km nos pés, entramos no recinto do Santuário de Fátima
Foto de grupo. "Não tenhais medo" ... e não, não tivemos medo!
O objectivo estava cumprido. Tínhamos percorrido 138 km nos quatro dias, ao Sol, à chuva, ao vento, ao frio. Pés doridos, calejados ... mas almas cheias de uma experiência que nunca mais se esquece, de uma partilha de emoções, de entreajuda, de convívio.
Fé, misticismo, devoção? Não sei ... talvez tudo isso e muito mais. Só agora refiro, no final deste post, que esta "peregrinação" a Fátima contou com a presença daquela a quem me tenho referido, em artigos anteriores, como a "rainha" do Gerês. Verdadeira White Angel de um tempo carenciado de amor e de dádiva, a Dorita esteve connosco nesta "corrida" pela luz que ilumina as fragas e pragas de uma vida conturbada. Parafraseando um outro meu já habitual companheiro dos Caminhos da Natureza ... numa "Cova" chamada "da Iria", onde se cruza o tempo e se reacende a "Alma" ... espero ter de alguma forma contribuído para conduzir à luz o negrume que, numa altura difícil, parece querer dominar uma "alma" tão sã e tão pura ... uma "alma de montanhista"...
Caminhos de Fátima
(Álbum completo)
Obrigado "Novos Trilhos", por estes quatro fabulosos dias. Alguns dos participantes já os conhecia, mas tanto sobre eles como sobre os que não conhecia ... continuo a dizer o mesmo que tenho dito várias vezes: esta paixão pelas caminhadas tem-me dado a conhecer pessoas interessantíssimas, quer como experiências de vida quer como pessoas! No primeiro dia claro que já todos nos tratávamos por tu e todos participámos e alinhámos na verdadeira "cowboyada" que foi todo o caminho, entendendo-se aqui "Caminho" num sentido mais lato, ou seja não só as horas a pé como também o convívio e as brincadeiras generalizadas, o espírito de grupo, tudo. Bem hajam, companheiros!

2 comentários:

Miguel Bento Lopes disse...

Belissimo texto, amigo Callixto.

Unknown disse...

Belíssimo texto, vou fazer em maio do próximo ano e vou sozinho! Obrigado pela partilha! Há 7 anos que vou num grupo muito grande! Mas é só por estrada!