A Cruzada de um Peregrino sem passaporte (5)

De Santiago de Compostela a Jerusalém, em busca do Santo Graal interior
SÁBADO, 05 DE AGOSTO DE 2034 - EM TERRAS DE LA RIOJA E NAVARRA
Nos dois últimos dias de julho, a "coppia più originale del cammino" deu bem corda às botas...😄
A expressão é dos italianos com quem tínhamos almoçado em Burgos 😂. "Il nonno e la nipotina, i nostri retro-pellegrini ", acrescentavam eles carinhosamente, referindo-se à nossa diferença de idades e a caminharmos em sentido contrário ao tradicional. "Forza e coraggio! ", desejámo-nos mutuamente!
O rio Arlanzón junto ao Parque de Fuentes Blancas, à saída de Burgos, 30.07.2034, 07h55
Efectivamente, nas duas derradeiras etapas de julho palmilhámos 73 km, 38 no domingo, até Villafranca Montes de Oca, e 35 no dia 31, até Santo Domingo de la Calzada. Mais uma vez segui os conselhos do Gronze e optei por não repetir o percurso de 2016, com a concordância da Sophia. Por Santovenia em vez de Atapuerca e Agés, reduzimos desnível e alguma estrada, apesar de mesmo assim seguirmos muito tempo ao lado da N 120. A meteorologia agora prometia-nos uns dias bons, almoçámos à beira do rio Vena, à entrada de Santovenia. Não nos devemos ter calado um minuto... 😌
Mosteiro de San Juan de Ortega, 30.07, 14h30 ... onde atravessei um portal Espaço / Tempo...
Em San Juan de Ortega entrámos no Mosteiro, já com 25 km percorridos. Tirámos as mochilas, sentámo-nos ... e aí sim, calámo-nos. Fechei os olhos. De repente, eu não estava a Caminho de Jerusalém ... estava a regressar!
Corria o ano de 1114 ... eu era o próprio Juan de Ortega! Tinha participado na 1ª Cruzada à Terra Santa, na conquista de Jerusalém, em 1099, e na formação dos Estados Cruzados. Estava no Mediterrâneo, o barco em que regressava parecia uma casca de noz, a caminho de Itália. No meio da tempestade, orei a S. Nicolau de Bari; prometi construir uma grande Capela, se se desse o milagre de me salvar de um naufrágio que parecia certo. Nisto abri os olhos ... e vi a Sophia ao meu lado, atónita. "Nossa, você está branco! ", exclamou...
Estava tudo bem ... mas passado pouco tempo voltámos a viajar no Tempo, desta vez para os horrores da Guerra Civil Espanhola. No Alto de la Pedraja, entre julho e novembro de 1936 foram executadas ali mais de 100 pessoas pelas forças franquistas. As valas comuns só foram descobertas e exumadas em 2010.
Em Villafranca Montes de Oca, 30.07.2034, 17h05
Ficámos no Albergue San Antón Abad, nos antes temidos Montes de Oca, o "Nemus Oque", já citado por Aymeric Picaud, monge e peregrino francês do século XII, mais conhecido como sendo o provável verdadeiro autor do Codex Calixtinus. No dia seguinte, entrávamos em terras de La Rioja e num dos lugares mais profundamente marcados pelo Caminho de Santiago nessa comunidade: Santo Domingo de la Calzada. E que melhor lugar para nos alojarmos ... do que a Cofradía del Santo?
Rio Tirón, à entrada de Belorado, às 10h45 do último dia de julho
E na Cofradía del Santo, à vista da Catedral
de Santo Domingo de la Calzada
Santo Domingo de la Calzada é uma pérola de ruas medievais, guardando um valioso património de que se destaca a Catedral, as muralhas e o que resta do antigo Hospital de Peregrinos. Mas Santo Domingo também é conhecido pela lenda do galo, que não é muito diferente da do nosso galo de Barcelos. Um jovem peregrino foi acusado injustamente de ter roubado um galo, pelo que foi enforcado. Quando os pais do jovem foram verificar o corpo, não só o encontraram vivo, como o galo, que estava a começar a ser preparado para o jantar do juiz, cantou a bom cantar, provando a inocência do rapaz. Segundo a lenda, foi Santo Domingo que, sabendo-o inocente, assim o salvou.
No dia seguinte, primeiro de agosto, estávamos no Albergue Municipal de Nájera, talvez a maior camarata onde alguma vez fiquei. Mas lembrava-me bem do convívio entre tantos peregrinos ... e do jantar confeccionado pelo Zé Messias 😉
Río Najerilla, em Nájera, 01.08.2034 ... onde a Sophia fez um belo jantar regado a Rioja, pois claro 😅
Em Nájera ... a Sophia também quis mostrar as suas qualidades culinárias. Cozinha havia, e um supermercado a uns 250 metros do Albergue também. E das compras feitas surgiu um belíssimo jantar para
Com a Chloé (foto e jantar da Sophia😆)
quatro, acompanhado com dois belíssimos Rioja. A nós se juntaram duas jovens peregrinas francesas, a Anouk e a Chloé, vindas desde Somport, a variante aragonesa do Caminho Francês. Só não houve foi coreanas a quererem tirar fotos às minhas tatuagens, como em 2016... 😂
À boa maneira de qualquer Caminho, aquele jantar deu para falar de tudo e de nada, deu para gargalhadas e lágrimas, para emoções fortes. As francesas, tendo vindo de Somport, fizeram-me acordar para a realidade de que me estava a
aproximar de um Caminho que não conheço, ao contrário dos 24 dias que já vão até aqui. Mas também deu para nos apercebermos, eu e a Sophia ... que se aproxima a nossa separação, depois de 12 dias juntos... 😓
E em silêncio, pois já passava das 22h, deitámo-nos, nostálgicos mas felizes.
Depois daquele belo repasto e convívio ... só podíamos dormir bem 😃
Saímos de Nájera cedo. Naquele enorme albergue ... os típicos ruídos nocturnos redobravam. Mas mesmo assim dormimos bem ... talvez até graças às qualidades do Rioja 😂
Poyo de Roldán, 02.08.2034, 08h05 ... no campo de batalha em que Roldán matou o gigante Ferragut
Nos campos de Alesón, uma vez cruzado o rio Yalde ... a magia do Tempo transportou-nos para os finais do Séc. VIII, início do Séc. IX. O grande cavaleiro Roldán - esse mesmo, o mesmo da Canção de Rolando, sobrinho de Carlos Magno - ia em peregrinação a Santiago.
Numa bela manhã, viram ao longe o Castelo de Nájera, do qual era senhor Ferragut, um gigante sírio com a força de quatro homens. Ferragut desafiou Rolando para o combate, que o cavaleiro francês aceitou sem receios.
Depois de dois dias e duas noites de batalha, Rolando matou o gigante, o que levou os mouros a deixarem Nájera e Rolando granjeou a fama de melhor guerreiro da Cristandade.
A história de Roldán e Ferragut é uma das mais velhas lendas do Caminho de Santiago. O local ficou conhecido como Poyo de Roldán, onde se diz que está enterrado um grande tesouro, proveniente dos donativos da população, em agradecimento pela libertação dos mouros.
Ruínas do Hospital de Peregrinos de San Juan de Acre, próximo de Navarrete, 02.08.2034, 13h55
Com Marcelino Lobato em La Grajera, 04.05.2016
A caminho de Logroño, junto ao pântano de La Grajera, passámos no local onde em 2016 estava Don Marcelino Lobato Castrillo, conhecido pelo "eterno peregrino", um dos peregrinos mais carismáticos, com mais de 50 Caminhos percorridos e outros tantos anos de presença no Caminho. Tinha na altura 75 anos ... ou seja mais novo do que eu sou agora, em que ele terá 93. Não consegui saber se ainda está entre nós.
E chegávamos a Logroño e ao Rio Ebro, 02.08.2034, 16h15
Em Logroño, o Universo esteve mais uma vez do meu e nosso lado. Não reservei o albergue em que fiquei em 2016, por ter lido bastantes más referências actuais. Confiei que conseguiríamos lugar no Albergue Paroquial de Santiago El Real, afecto à Igreja de Santiago
... apesar de saber que não há reservas, tem apenas 30 lugares e abre à uma da tarde. Quando chegámos, quase três horas depois da abertura ... havia três lugares! "Só nós, para darmos um jeito de encontrar um lugarzinho até em um albergue quase lotado! ", disse logo a Sophia ao simpático hospitaleiro. E, virando-se para mim ... "Obrigada, você acreditou sempre que ia haver um lugar pra gente! "
No Albergue de Santiago El Real tudo é pago por donativo: ceia comunitária, dormida e café da manhã, como diz a minha companheira de Caminho. Depois da ceia, os peregrinos foram convidados para uma pequena oração, em que todos participaram. Seja-se o que se for, são momentos que nos marcam!
E atravessamos o Ebro, na manhã de 3 de agosto, a nossa 22ª etapa de Caminho
Pouco depois de cruzarmos o Ebro entrámos em Navarra ... a nossa última província juntos. Dez quilómetros depois estávamos em Viana, onde se destaca a Igreja de Santa María.

03.08.2034, 09h45
Igreja de Santa María, Viana,
Almoçámos em Torres del Río, uma simpática povoação à beira do rio Linares, com Sansol na outra margem, construída à volta da sua Igreja do Santo Sepulcro, uma das mais importantes da arte românica navarra do Séc. XII. Em 2016 ... lembro-me de um dos amanheceres mais espectaculares que alguma vez fotografei, já que tínhamos dormido lá e saído antes do nascer do Sol.

Torres del Río: ponte sobre o Río Linares ... e prosseguimos jornada até Los Arcos
Los Arcos, fim de etapa, 03.08.2034, 15h35 ... confraternização de peregrinos, junto à Igreja de Santa María
A maioria dos peregrinos que se encontravam a gozar a bela tarde na esplanada junto à Igreja, estando naturalmente a Caminho de Santiago, devem ter percorrido ainda os 7 km até Sansol ou os 8 km até Torres del Río. Aliás, dois italianos com quem confraternizámos disseram-nos isso mesmo, seguiam para Sansol. Mais uma vez ... o nosso Caminho al revés foi motivo de admiração. E o Albergue Isaac Santiago, onde ficámos ... estava a meio "gás". Das 70 camas existentes ... ficámos sozinhos numa camarata de oito ... o que até permitiu pôr a Sophia a falar com a minha estrelita arraiana 😇
Naquela noite em Los Arcos ficámos a conversar até tarde. Estávamos só os dois, rimos e chorámos mais livremente até do que hoje ... o nosso último dia juntos. Pela janela entravam ainda as últimas cores crepusculares. As palavras da Sophia ainda me ecoam ... penso que jamais as vou esquecer...
Zé, olha só pra esse céu, parece lindo e triste ao mesmo tempo ... parece que ele tá chorando junto com a gente.
A emoção toldou-me a percepção ... até que apenas me saíram estas poucas palavras:
Pois é, domingo separamo-nos ... lembrar-me disso deixa-me apreensivo, nostálgico...
Eu também tô sentindo muito - respondeu a Sophia, acrescentando: Foram 10 dias incríveis, né? Quem diria que a gente ia se conectar assim?
É verdade, Sophia. Passámos por risos, dificuldades, paisagens ... estes dias vão ficar gravados na minha memória.
E na minha também. Lembra daquela chuvada que pegámos depois de Puente Fitero? E das etapas em que a gente ficou conversando, contando histórias da vida? Falando sério, você me contou histórias tão bonitas sobre a sua vida, sobre a sua família...
Pois, a família ... sabes, Sophia, estou preocupado com o longo Caminho que me espera. São muitos meses longe de casa, longe da minha mulher ... estamos casados há 60 anos...
Eu sei, Zé. Mas você é forte e ela também. Já vi que ela te ama e te compreende. Tenho a certeza de que vocês vão conseguir. E olha, você vai ter tantas histórias para contar pra ela quando voltar!
Espero que sim. Mas a saudade vai ser grande, e sei que a dor é maior para quem fica...
Eu sei como é. Mas a gente se fala sempre, né? Prometemos! Tô aqui pra te ajudar no que precisar! E quem sabe um dia a gente se encontra de novo em algum outro lugar...
Com os olhos marejados, sentimo-nos levados pela doçura de uma Amizade pura e sã, de uma Amizade nascida e cimentada no Caminho. Despedimo-nos, sabendo que tínhamos ainda dois dias juntos ... e adormeci a reflectir sobre o que poderia fazer com que tivesse nascido assim uma Amizade ... entre um velho quase a fazer 81 anos e uma jovem com quase metade da minha idade. No dia seguinte ... a Sophia confidenciou-me que adormecera a pensar o mesmo... 🤔
E no dia seguinte estávamos nos contrafortes da Serra de Montejurra, 04.08.2034, 10h10
As duas etapas seguintes eram curtas, 22 km cada uma. Saímos de Los Arcos quase às 7h30, com o Sol já alto. Aos 9 km de Caminho, optámos pela variante de Luquín e da encosta poente da Serra de Montejurro, rumo a Iratxe, mais uma vez de acordo com as recomendações do Gronze.
Mosteiro de Santa María de Iratxe e Fonte do Vinho
A Sophia sabia da existência do Mosteiro, mas não da Fonte do Vinho. Quando eu lhe falei numa fonte de duas bicas, uma de água, outra de vinho ... pensava que eu estava a brincar com ela. Assim, quando lá chegámos, a admiração foi maior! 😂
Os monges de Iratxe recebiam os peregrinos com uma taça de vinho. Muitos chegavam muito doentes e o vinho era usado como restaurador. Instalada no final dos anos 90 do Séc. XX, a fonte do vinho, das Bodegas Irache, tenta preservar essa memória. Durante séculos, o vinho era oferecido aleatoriamente aos peregrinos; agora são os próprios que se servem à medida que passam.

E assim chegamos à bela cidade de Estella e à sua Puente de la Carcel, sobre o rio Ega, 04.08.2034, 14h35
Estella (Lizarra, em euskera, basco) é uma bela cidade nas margens de um grande meandro do Río Ega, que o Caminho de Santiago atravessa pela Puente de la Carcel, originalmente do Séc. XII, reedificada no Séc. XVI, destruída na 3ª Guerra Carlista e finalmente reconstruída em 1873.
Passear nas ruas medievais de Estella é como viajar no tempo, onde as construções românicas e góticas perpetuam o seu esplendor histórico. Alojámo-nos no Albergue da ANFAS, a Associação Navarra a Favor das Pessoas com Deficiência Intelectual, onde já tinha ficado em 2016. Sermos recebidos por hospitaleiros com trissomia 21, ou algum grau de autismo, com toda a generosidade e carinho ... é uma vivência emocionante! Uma camarata ampla ficou bem preenchida, ficaram poucas camas livres. Mas hoje de manhã ... acordámos com o sabor amargo da aproximação da despedida...
À saída de Estella, sobre o rio Ega, 05.08.2034, 07h35
Voltámos a sair de Estella já com o Sol acima das serranias e a iluminar as águas do Ega. Não queríamos que este dia chegasse nunca ... mas sabíamos que ia chegar. Puente la Reina, uma cidade historicamente marcada pelo Caminho de Santiago ... também é o nosso ponto de bifurcação. Aqui se
O rio Irantzu em Villatuerta, 05.08, 08h30
juntam dois Caminhos vindos de França, ou, para mim e para a Sophia ... dois Caminhos de acesso a França: rumo a Saint Jean Pied de Port - de onde vim em 2016 e para onde a Sophia segue amanhã - ou por Jaca e Somport ... para onde seguirei eu amanhã, pelo Caminho Aragonês, rumo a terras tolosanas e ao Mediterrâneo.
Zirauki, entre Villatuerta e Puente La Reina
A paisagem e a música amenizavam a certa angústia que se apoderara dos dois. A música, sim ... a Sophia já tinha sido cativada também pela minha paixão pela música folk. Ao longo destas duas etapas ouvimos bastante Mielotxin e o saudoso Mikel Laboa. A metáfora do pássaro livre de "Txoria txori " é uma obra-prima intemporal, que voa muito para além das fronteiras bascas.
      Hegoak ebaki banizkio                              Se eu lhe tivesse cortado as asas
      Nerea izango zen                                       Teria sido meu
      Ez zuen aldegingo                                      Não teria ido embora
      Bainan, honela                                           Mas, se assim fosse
      Ez zen gehiago txoria izango                     Não seria mais um pássaro
      Eta nik... txoria nuen maite                        E eu... amava o pássaro
Ao som de "Txoria txori " ... a Sophia e eu sentíamos que também nós éramos pássaros livres ... sentíamos a metáfora para a liberdade e a essência do ser, levando-nos a uma profunda reflexão sobre o Amor e a liberdade. E caminhando em reflexão ... entrámos de mãos dadas na Puente de La Reina.
Puente La Reina / Gares, 05.08.2034, 12h45
O topónimo Puente La Reina deve-se à ponte românica sobre o rio Arga, mandada construir no século XI pela rainha Doña Mayor, esposa de Sancho III de Navarra, para facilitar a passagem dos peregrinos rumo a Santiago. Ao avançarmos de mãos dadas na bela ponte românica, parecia-nos ver e ouvir esses milhares de peregrinos, sentíamo-nos testemunhas de séculos de
peregrinações ... mas parecia-nos também ouvir o eco dos nossos próprios passos, como que marcando o fim de uma jornada e o início de outra. A angústia que se insinuava nos nossos corações só era atenuada pelo peso da história, pela beleza do lugar, pelos sons do rio, pelo bucolismo da paisagem. Perdemos um pouco a noção do tempo. A ponte, antes símbolo de união e travessia, naquele momento tornava-se o prenúncio da separação.
E de mãos dadas entrámos também na Igreja de Santiago, de origem românica. É certo que Puente La Reina não é Compostela, mas estávamos a viver estes momentos como se fossem uma chegada ao Obradoiro, como se tivéssemos completado um Caminho. Só depois nos fomos registar e deixar as mochilas, no Albergue de los Padres Reparadores, junto à Igreja do Crucifixo. Tínhamos reservado duas camas, ontem de manhã pelo telefone, mas voltámos a ficar só os dois numa camarata de seis. Talvez a minha provecta idade seja a razão destas benesses...
Albergue de los Padres Reparadores, Puente La Reina, 05.08.2034, 13h25
Eram quase duas horas quando fomos almoçar. Talvez por ser o nosso último almoço juntos, ou talvez porque o ambiente do Bar / Restaurante "Eunea Jatetxe" nos cativou, com outros peregrinos na esplanada e próximo do albergue ... sentimos que merecíamos um almoço mais especial 💓
Almoço no "Eunea Jatetxe" ... o último
almoço de dois peregrinos, neste Caminho
Não encontro palavras para descrever a nossa tarde, hoje, em Puente La Reina. Nostalgia? Tristeza? Alegria? Ansiedade? Talvez uma estranha combinação de todos esses sentimentos e de muitos outros. A Sophia está apenas a quatro etapas de cruzar os Pirenéus e de chegar a Saint Jean Pied de Port. Eu ... estou a seis etapas de entrar em França, pelo Col de Somport ... e a muitas mais de Jerusalém.
A ponte românica de Puente La Reina, vista da ponte da estrada NA1110 ... durante o nostálgico passeio
de dois peregrinos, na tarde de 5 de agosto de 2034
Passeámos pelas ruas medievais, voltámos a cruzar o Arga pela ponte nova e a fotografar a secular ponte românica. Perdemo-nos a olhar o Tempo, ao longo da Cañada Real, nas margens do Robo, afluente do Arga. Doze dias passados a dois parecem-me doze anos ... parecem-me toda uma vida!
Amanhã separamo-nos, pouco mais de dois quilómetros depois de começarmos. Só então nos despediremos ... depois de um gin que ainda não tínhamos bebido nestes 12 dias ... de um gin que foi muito mais do que um gin...
Vamos aproveitar os últimos momentos juntos? - perguntei, sentindo os olhos brilhantes...
Vamos! Um brinde à nossa amizade, ao que Vivemos e construímos juntos!
Voltámos ao Eunea, sentámo-nos de novo, pedi dois gins. Com os olhos marejados, balbuciei...
Obrigado por tudo, Sophia. Tu fizeste destes 12 dias uns dos melhores dias da minha vida.
Obrigada você, Zé. Levarei você para sempre no meu coração.
Um abraço longo e apertado selou aqueles instantes, carregados de emoção ... mas o abraço mais forte, mais profundo, mais repleto de promessas de nos mantermos em contacto ... será amanhã de manhã, ainda no albergue, na nossa última partida juntos ... para a nossa primeira etapa separados.

Publicado em 23.10.2024 ... ao viajar na grande Máquina do Tempo e dos Sonhos...
A maioria das personagens são ficcionadas. Qualquer semelhança com pessoas ou eventos reais é mera coincidência.
Algumas imagens foram criadas e/ou editadas por Inteligência Artificial.
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2 comentários:

Graca disse...

Acabei agora de ler, gostei muito . Há muito trabalho de pesquisa a suportar tanta informação, um verdadeiro historiador.
Continuação de um bom Caminho, sem a Sofia. Em breve encontrarás outro peregrino para alegrar o teu Caminho.

José Carlos Callixto disse...

Não sei se a "obra" está realmente a sair jeitosa ou não ... mas sei que me tem estado a dar um gozo muito, muito grande.
Implica muita investigação, sim (e daqui para a frente ainda mais, entro em Caminho que não conheço), mas tenho-me sentido mais rico, ao investigar, ao inventar, ao escrever...