O abraço que se seguiu foi marcado por uma profunda emoção. Um abraço que
transcendia palavras, carregado de gratidão, de esperança ... e, porque não
dizê-lo, também de Amor e de Fé. Ambos tínhamos pela frente a aproximação aos
Pirenéus ... por Caminhos diferentes. Saímos de
Puente La Reina às 7h, com o Sol a nascer.
Eu escutava-a, maravilhado ... com grossas lágrimas correndo-me pela face. E
só lhe consegui dizer ... que a Vida é Bela ... que o Amor é a força maior que
nos move e rege!
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Através de um belo bosque, próximo de
Salinas de Ibargoiti, 07.08.2034, 07h35
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Segunda feira, a etapa começou pela ponte gótica sobre o rio
Elorz, à
saída de
Monreal. Como todos os dias, a
minha arraiana telefonou-me. Tinha acabado de cruzar o rio e estava a
atravessar um belo bosque de grandes pinheiros e carvalhos. Senti a saudade
nas palavras dela, mas ao mesmo tempo a compreensão, a força e até o estímulo.
"A casa nunca mais foi a mesma sem ti. Sinto muito a tua falta, mas a
alegria de te ver a realizar esse sonho sossega-me. Procuro ocupar o tempo
o mais possível, ainda ontem os nossos Manos Velhos me vieram buscar,
passei o dia com eles. É tão bom ter amigos assim." ... foi-me ela contando, com um misto de emoção e alegria.
Ambos chorámos, ambos rimos... Eu disse-lhe que ela está sempre comigo mesmo
sem estar ... vai na minha mochila, miniaturizada na forma da pequena e
velha ursa de pêlo que transporto sempre que caminho sem ela. Consegui
fazê-la rir a bom rir, quando lhe contei que, nos dias que passei
acompanhado da Sophia, lhe disse que "a ursa tem uma webcam nos olhos, através da qual a Lala vê sempre onde
estou e com quem estou
😂"...
Rocaforte
também é conhecida por
Sangüesa La Vieja, debruçada sobre a
confluência dos rios
Irati e
Aragón. Foram terras de fronteira e de
confrontos entre cristãos e muçulmanos e entre os antigos reinos de Aragão e
de Navarra. Quando em 1213 S. Francisco de Assis passou por ali, na sua
peregrinação a Santiago, a água brotou naturalmente à sua passagem, no sítio
que ficou conhecido por
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Igreja de Santa María La Real,
Sangüesa
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Fonte de S. Francisco. Em sinal de agradecimento, o
poverello de Assis deixou a sua vieira de peregrino, para que outros
caminhantes pudessem mais facilmente saciar a sede. E ali veio a fundar o
primeiro Convento Franciscano fora de Itália.
Antes das três e meia estava a cruzar o
Aragón pela ponte medieval de
Sangüesa, outra jóia histórico-artística de origem medieval, onde se destaca a
Igreja Românica de
Santa María La Real,
junto à ponte, e a
Igreja de Santiago. O
Albergue Municipal
fez ele próprio parte de um antigo Convento. Bem posso dizer que estas
etapas estavam a ser, literalmente, como uma autêntica viagem no tempo ...
sentia-me na Idade Média ... sentia-me talvez Cruzado...
O Albergue não é grande, uma única camarata com 14 camas, mas ficámos apenas
5 peregrinos ... 2 jovens checas, 1 francês, 1 italiano ... e 1 português já
idoso...
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Amanhecer pouco depois de sair de
Sangüesa, 08.08.2034, 06h55 - Sair
cedo, para fugir ao Sol e ao calor, no vale do Aragón
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Depois de
Sangüesa, mais longe ou mais perto, o rio
Aragón ia ser meu companheiro
quase até França. Nesse longo percurso, o marco principal é
indiscutivelmente o Mosteiro de
San Juan de la Peña, berço do Reino de Aragão. Optei por dividir os 70 km desde
Sangüesa em três etapas, marcadas pela melancólica solidão, como
aliás o
Gronze
as define. Em pleno agosto, agradeci aos céus as temperaturas não estarem
muito altas, já que, tal como as povoações, as sombras são escassas. De
qualquer forma ... sair entre as seis e meia e as sete da manhã foi a norma
que ditei a mim mesmo. Além de me permitir assistir à alvorada, nas horas de
maior calor já estava recolhido.
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Barragem de Yesa, na aproximação a
Ruesta, 08.08.2034, 14h00
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Vale do rio Aragón e ainda a
barragem de Yesa, vista de
próximo de Artieda, 09.08.2034, 08h45
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Nestas etapas ... achei por bem transportar alguns víveres como "
kit
de sobrevivência". Contudo - e o meu "mano" Zé Messias que me perdoe, ele
que é sempre ultra previdente - parte do
kit não era necessário,
comprovando a minha habitual "tese" de que o Caminho nos dá tudo. Na terça
feira almocei junto à
Ermida de Santiago, que chegou a ser albergue de peregrinos, à entrada de
Ruesta.
Dormir em
Ruesta foi uma experiência única no Caminho.
Ruesta é uma aldeia abandonada desde 1959, dado que a barragem de
Yesa inundou os campos de cultivo, que
eram o sustento dos seus habitantes. Em 1988, a CGT aragonesa passou a
encarregar-se do que restava da aldeia, incluindo a recuperação de duas
casas transformadas em
Albergue. Os
hospitaleiros confeccionam o jantar; éramos 10, os 2 hospitaleiros e 8
peregrinos. O Marco, italiano, encantado com o meu projecto, atirou-me com
um "
Ci vediamo a Roma" ... que me deixou a pensar numa opção mil
vezes pensada mas não decidida: na minha Cruzada ... vou por Roma ou pelos
Balcãs? Ainda tenho muito tempo para decidir...
A Sophia entretanto chegara a
Roncesvalles. Faltava-lhe apenas a
Ruta de Napoleón
... a grande travessia dos Pirenéus. Pedi à
Virgem de Biakorri
que a acompanhasse e protegesse, como me acompanhou e protegeu há 18 anos,
na primeira etapa do meu
Caminho Francès, a 28 de abril de 2016 ... no aniversário da partida do pai da minha
estrela para outro nível.
Arrés
é uma pequena aldeia desde sempre ligada às peregrinações. Desertificada
pelo despovoamento, tem recuperado precisamente graças ao Caminho. O
Albergue
foi hospital de peregrinos e é mantido por voluntários da Federação de
Amigos do Caminho. A ceia comunitária, a dormida e o pequeno almoço ... tudo
se paga por donativo ... e ainda temos direito a um dos pores do Sol mais
espectaculares a que já assisti nos Caminhos de Santiago!
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Arrés, 09.08.2034, 21h10 - O Sol põe-se sobre o vale do Aragón e
sobre o Caminho percorrido!
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Depois deste espectacular pôr-do-Sol, estava de regresso ao albergue quando
o ecrã do telemóvel se iluminou. Era a Sophia a enviar-me uma foto ... em
Saint Jean Pied-de-Port. Nas 28 etapas que ela previra,
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A Sophia, que acompanhou 12 das minhas etapas, entra em
Saint Jean Pied-de-Port, 09.08.2034, 17h00
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terminou o seu Caminho Madrid -
Sahagun -
Saint Jean. Estava
eufórica!
Um grupo de brasileiros que iam começar o Caminho Francês, no dia seguinte
... fizeram-lhe uma festa celebrando o final do dela, percorrido
al revés desde
Sahagun.
Ai, Zé, junto à Virgem de Biakorri eu senti que você estava comigo,
mais que em qualquer outro lugar nestes 4 dias. Sua presença me deu
força. E quando entrei em Saint Jean, foi como se todas as minhas
células vibrassem num misto de emoções!
E efectivamente senti, nas palavras dela, a euforia da conquista, a paz de
uma missão cumprida, a gratidão por cada passo, num misto de alegria e
nostalgia. Prometemo-nos mutuamente continuarmos em contacto ...
alimentarmos o mais possível esta ligação mágica criada no Caminho.
Eu vou continuar com você, Zé, você vai-me sentir!
Anteontem, quinta feira ... saí do albergue eram seis e meia da manhã. Com o
céu limpo, a
hora azul
criava uma atmosfera mágica e serena, à medida que descia a pequena colina
onde se situa
Arrés.
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Igreja românica de Santa María (Séc. XI-XII) Santa Cruz de la Serós, 10.08.2034, 10h15
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Os primeiros 10 km foram praticamente planos, com o rio
Aragón à minha esquerda. Duas horas depois estava em
Santa Cilia e pouco depois das dez da
manhã, já com 16 km percorridos, em
Santa Cruz de la Serós, bonita localidade
... onde comecei a subida a sério para o sítio mágico de
San Juan de la Peña.
A subida a
San Juan de la Peña
é um bom teste para os Pirenéus, já que decorre por trilhos de montanha,
íngremes e por vezes pedregosos. Dos 760 metros de altitude de
Santa Cruz de la Serós, passei aos 1150 metros do "Mosteiro Velho" em
pouco mais de 2,5 km. A subida foi lenta, mas eu tinha todo o tempo do
mundo. Tinha estado em
San Juan de la Peña
há 39 anos ... na
pré-história em que eu fui professor, com alunos. Já nem sei se esse tempo
existiu mesmo ... ou se é apenas uma lenda, como a lenda do Santo Graal, ou
a dos irmãos
Voto e
Félix que, como eremitas, estariam na
origem do Mosteiro de
San Juan de la Peña, como já vos contarei.
Chegar a
San Juan de la Peña
a pé é uma sensação sublime. De repente senti-me transportado no Tempo e no
Espaço, e para várias épocas e lugares diferentes. Por segundos, pareceu-me
estar a atravessar as
Foreste Sacre e a chegar ao
Sacro Monte della Verna, no
Caminho de Assis, que percorri em 2023. Mas logo de seguida recuei muito mais do que 11
anos...
Aí pelo Séc. VIII, um jovem nobre de nome Voto foi caçar para
aqueles montes. Atrás de um veado, caiu num precipício mas salvou-se
milagrosamente. São e salvo, no fundo do barranco viu uma pequena
caverna na qual descobriu uma Ermida dedicada a São João Batista e, no
interior, encontrou o cadáver de um eremita. Impressionado pela
descoberta, o jovem Voto vendeu todos os seus bens, retirou-se
para a caverna juntamente com seu irmão Félix e iniciaram também eles
uma vida eremita.
Esta seria a origem do Mosteiro, sobre o qual escreveu
Miguel de Unamuno:
… a boca de um mundo de penhascos espirituais revestidos de um bosque
de lenda, no qual os monges beneditinos, meio ermitãos, meio
guerreiros, veriam passar o inverno, enquanto pisoteavam a neve
javalís de carne e osso, saídos dos bosques, ursos, lobos e outros
animais selvagens.
A própria origem lendária do Reino de Aragão também encontra as suas raízes
na caverna de
San Juan de la Peña, quando os guerreiros cristãos, reunidos ao lado
de Voto e Félix, decidem nomear o líder que os conduziria à batalha para
reconquistar as terras de
Jaca e
Aínsa. O rei Garcia Sanches
I, de Pamplona, concedeu aos monges direito de jurisdição, e os seus
sucessores continuaram esta política de protecção. No reinado de Sancho I,
San Juan de la Peña torna-se panteão dos reis de Aragão.
E o Santo Graal, o cálice utilizado por Jesus Cristo na Última Ceia? Das
muitas lendas acerca daquele cálice místico, fonte da vida eterna, uma das
mais famosas localiza-o precisamente no Mosteiro de
San Juan de la Peña, para onde teria sido levado para o proteger das
perseguições. Os monges tê-lo-iam ali guardado por séculos, até à sua
suposta transferência para a Catedral de Valência, por volta de 1437, por
ordem de Afonso V de Aragão ... e ainda bem, já que terríveis incêndios
devastaram o
Mosteiro Velho, principalmente em 1494 e 1675. Na sequência do último, construiu-se o
Monasterio Nuevo. O Mosteiro antigo, declarado Monumento Nacional em 1889, não mais foi
utilizado, preservando-se como memória do que foi o Mosteiro mais importante
do Reino de Aragão na Alta Idade Média.
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Miradouro de San Voto, debruçado sobre os barrancos a norte do Mosteiro Velho
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Do Mosteiro Velho ao Mosteiro Novo, que distam menos de um quilómetro,
poderia seguir directamente, mas, já que tinha tempo, optei por subir ao
Miradouro de
San Voto e ao imponente
Balcón de los Pirineos, de onde se avista
uma panorâmica fabulosa para a cordilheira.
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Balcón de los Pirineos, uma
soberba panorâmica para a cordilheira. Ao fundo, a leste, o maciço
do Monte Perdido.
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Deixei-me ficar naquele
balcón quase uma hora. Estava a escassos 500
metros do
Mosteiro Novo
e da
Hospedaria
onde ia ficar. Sentia-me suspenso entre o Céu e a Terra, apetecia-me planar
com os grifos que por vezes pairavam no ar. Que sensação de paz e plenitude,
mas ao mesmo tempo sentindo-me ínfimo, parte de algo muito maior. O som do
vento entre as árvores era uma melodia para a alma. Falei com a minha
namorada, partilhei com ela o que via e sentia. Namorada, sim ... namoramos
há 61 anos! "
E já almoçaste?", perguntou-me. "
Não preciso",
respondi ... "
a paisagem e a sensação de estar aqui alimentam". Mas
depois descansei-a, lá lhe disse que já tinha comido, ali mesmo, o resto de
um enorme
bocadillo que tinha comprado em
Santa Cruz de la Serós. Passava já das
duas da tarde quando deixei aquele mágico balcão e me dirigi ao
Monasterio Nuevo
de
San Juan de la Peña.
Os peregrinos, com Credencial, têm 50% de desconto no bilhete de ingresso
nos dois mosteiros ... mas não na hospedaria. Reservei o meu lugar há dias,
quando optei por dormir no Mosteiro, sabendo embora que o preço é quase
quatro vezes mais que a média dos albergues de peregrinos ... mas não sabia
que, quando dizem que "
la clave de su oferta hostelera es la comodidad
" ... se referem a níveis de luxo fora dos padrões, tanto peregrinos como
monásticos. A
Hospedaria, situada na ala sul das antigas dependências monásticas, esteve encerrada
vários anos, mudou várias vezes de gestão, passou por sucessivas obras, até
que reabriu no verão de 2025 ... pelos vistos como hospedaria de luxo. É
claro que, um mês depois de sair de casa, me soube muito bem ter um quarto
privado, com WC privado, uma banheira privada (onde ia adormecendo em
imersão em água bem quente), tudo ... mas preferia sentir-me como me senti
em
la Verna, em 2023. Do misticismo de
San Juan de la Peña, ficar lá foi a
experiência menos mística ... mas compensada durante um pequeno passeio
depois do jantar...
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San Juan de la Peña, 10.08.2034,
21h00 - A hora dourada em San Juan de la Peña foi
simplesmente mágica, compensando a desilusão com a magia do Mosteiro
Novo ... ou com a falta dela...
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No dia seguinte, ontem de manhã ... acordei eram 4 e pouco! Ao fim de um mês
de Caminho ... que sensação estranha, sozinho num quarto, sem ouvir outros
peregrinos, ter uma cama larga, com lençóis brancos, um roupão de banho,
gel, shampoo, sabonetes ... que parafernália, que eu já nem sabia que
existia. Ainda tentei voltar a dormir ... mas não fui tocado pelo ceptro de
Hipnos, deus do sono... 😂
Às cinco da manhã estava por isso de novo de molho na banheira, com água bem
quente. Todo o corpo agradeceu estas benesses, mas principalmente os pés.
Felizmente sem problemas de maior, nem ampollas dignas desse nome ao
longo de 30 dias, mas claro que os ditos são a parte mais sofrida.
As mordomias da
Hospedaria
permitiram-me o pequeno almoço no quarto, deixado de véspera ... e às seis e
meia da manhã estava a sair, com o céu ainda estrelado e a assistir ao
nascer de um novo dia.
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17 km depois estava de novo no vale do
Aragón - Cidadela de Jaca, 11.08.2034, 10h40
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Jaca
foi a primeira capital do Reino de Aragão, entre 1035 e 1096, quando a
capital foi transferida para Huesca. No meu Caminho, destaquei três
monumentos de entre o extenso legado histórico e artístico da cidade: a
Igreja de Santiago, construída no século XI;
a grande
Catedral de S. Pedro, também dos Séc. XI-XII e uma das primeiras construções românicas de
Espanha; e a
Cidadela, magnífica fortificação militar pentagonal, que começou a ser construída
no final do século XVI, por ordem de Filipe II, que temia uma invasão
francesa que não se deu.
Jaca é hoje uma cidade dinâmica, apelidada
por vezes a "Pérola dos Pirenéus", importante etapa do Caminho de Santiago
por Aragão.
Junto à Catedral, almocei na "
Casa Fau ", com três peregrinos húngaros.
"
Shall we walk together to San Juan de la Peña?", perguntou o Lajos.
Deixei os três espantados com a minha resposta: "
No, I'll arrive tomorrow at Somport
" ... e ainda mais com o meu projecto de Cruzada. E seguimos os nossos
Caminhos opostos, continuando a subir o curso do rio
Aragón, no meu
caso. Até
Castiello de Jaca, nove
quilómetros mais a norte, ainda me cruzei com mais alguns peregrinos,
causando sempre a admiração por estar a caminhar em sentido contrário.
França estava cada vez mais perto...
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Castiello de Jaca, 11.08.2034,
16h10 ... e entrara nos Pirenéus profundos...
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Castiello de Jaca é uma bela aldeia
localizada numa colina sobranceira ao vale do
Aragón. Na parte mais
alta, destaca-se a
Igreja de San Miguel (Séc. XII), de origem
românica. Tinha optado por pernoitar no
Albergue A' Noguera, que se veio a revelar uma excelente escolha. A maioria dos peregrinos,
descendo os Pirenéus, vão ficar a Jaca, pelo que em
Castiello apenas
fiquei com
due coppie de italianos vindos de
Oloron Sainte-Marie. O albergue não é barato (para ir preparando a
bolsa para os preços em França...), mas alia de forma extraordinária a
beleza da paisagem ao bom gosto e comodidade das instalações. Acabei por
ficar de novo sozinho numa camarata de quatro, já que, naturalmente, os dois
casais ocuparam uma das outras idênticas. E o jantar e pequeno almoço, em
conjunto com a simpática hospitaleira, foram muitíssimo bem servidos. Só a
paisagem já alimentava...
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Pequeno almoço panorâmico ... e completíssimo! Albergue
A' Noguera, 12.08.2034, 07h30
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E hoje ... último dia em Espanha! A sensação é estranha. 24 km de subida
quase permanente ... quase mil metros de acumulado positivo ... 864 km
percorridos desde Santiago! Estou em
Somport ... a mais de 1600 metros de
altitude. Saí de casa há 32 dias! Tudo é uma sensação estranha. Sinto-me a
viver num Universo paralelo ... numa espécie de
twilight zone entre a realidade e o sonho ... como se tivesse
atravessado um portal Espaço / Tempo ... como se estivesse a viver numa
outra dimensão!
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Ponte medieval de
Canfranc, ou
de los Peregrinos, 11h10
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Saí de
Castiello de Jaca já passava
das oito horas, depois daquele belo pequeno almoço. Com o rio
Aragón no vale, sempre à minha direita, fui subindo para
Villanúa, primeiro, e depois para
Canfranc, acima já dos mil metros de
altitude. Entre
Canfranc e
Canfranc-Estación, o
percurso transforma-se num delicioso trilho, através de um extenso bosque de
faias.
Canfranc-Estación ... curioso nome
para uma povoação a 4,5 km de Canfranc. O nome deve-se à
impressionante Estação Internacional de Canfranc, inaugurada pelo Rei
Afonso XIII em 1928, uma vez terminada a construção do túnel ferroviário de
Somport, entre Espanha e França.
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Estação Internacional de Canfranc,
desactivada em 1970 e transformada em Hotel de luxo em 2023
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É contudo possível chegar à Estação de
Canfranc de combóio. A nova
estação, bastante mais pequena, situa-se ao lado do Hotel em que se
transformou a antiga e monumental Estação
Art Nouveau. Aliás, para
retemperar forças para a continuação da subida, uma negrinha "
Pirineos Bier " acompanhou um bom
trozo de
tortilla, no bar da nova estação
😄
Durante mais de 50 anos, o túnel e a linha ferroviária de
Somport caíram no abandono, sendo portanto a nova estação de
Canfranc a estação terminal. A situação foi no entanto revertida em
2026, voltando a histórica linha a ser internacional e ligando Jaca a Pau.
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Candanchú, 14h55 - Ruínas do
Hospital de Peregrinos de Santa Cristina, importante centro de acolhimento na Idade Média
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E às 15h10 de 12 de agosto, ao 31º dia de Caminho ... chego a
Somport, na fronteira francesa.
Sim ... foi dali que eu vim... 😲
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O
Col de
Somport, situado a 1640 metros de altitude, marca a fronteira entre Espanha e
França. Uma fronteira é, quer queiramos quer não, um marco significativo, um
limite, uma etapa, especialmente num Caminho de Peregrinação ... numa
Cruzada. Uma fronteira diz-nos que realizámos uma parte da missão que nos
propusemos. Chegar a
Somport foi um momento de grande emoção,
a primeira fronteira deste vasto projecto em que me lancei ... desta
aventura "louca" de um octogenário "louco"...
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Col de Somport (1640m alt.) e
Albergue Aysa, na fronteira ... mas entrar em França fica para amanhã...
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No
Col de
Somport, ainda do
lado espanhol, o
Albergue Aysa aloja uma diversidade de amantes da montanha e dos caminhos, ou
Caminhos: peregrinos, montanhistas, simples turistas, a pé, de moto, de
carro. Tinha reservado uma cama ... e ainda bem, já que os 40 lugares
estavam esgotados. Na camarata de dez que me "saiu na rifa", só eu e três
catalães somos peregrinos, claro que eles para começarem amanhã o
Caminho Aragonês. "Bombardearam-me" com perguntas sobre a minha experiência. Eu também
inicio amanhã ... mas inicio amanhã a minha Cruzada em terras dos
Pyrénées-Atlantiques,
Nouvelle-Aquitaine ...
afastando-me cada vez mais do meu "ninho"... 😕
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A Cruzada de um Peregrino sem passaporte (Espanha): 31 dias,
864 km, 15200m de desníveis acumulados. Veja
aqui
as
31 etapas
desde Santiago. Pode aceder ao mapa de cada uma delas clicando em
cada etapa.
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3 comentários:
Mais uma bela lição de História.
O que significa C G T aragonesa?
Com que então os hotéis fornecem pequenos almoços no quarto às 6 da manhã?
Continuação de um bom caminho e das interessantíssimas informações que nos vais dando.👏👏👏
Obrigado, Graça 😊
CGT quer dizer o mesmo que cá, Confederação Geral de Trabalhadores.
As próximas crónicas já serão em França, em terras occitanas.
Se esses manos velhos formos nós é sinal de ainda estamos vivos e a mexer😂😂😂😂
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