De Santander a Ponferrada, pelos Caminhos de Liébana, Vadiniense e Olvidado (2)
Como relatei na crónica anterior, na manhã do meu 5º Dia de Caminho recebi, no
secular Mosteiro de
Santo Toribio de Liébana, o meu certificado
de ali ter chegado em peregrinação, venerando o Lignum Crucis.
Terminava assim o
Caminho Lebaniego
... mas no mesmo dia continuava a minha "aventura" rumo a Espinama,
Fuente De ... e ao coração dos Picos de Europa.
Camino Vadiniense
24.Jul.2021, 10h35 - Próxima de
Santo Toribio de Liébana, a
Ermita de San Miguel, sobre
Turieno e o vale do Deva. Várias vezes aqui subi
com alunos, nos tempos das excursões pelos Picos de Europa
Do Santo Toribio e da Ermida de S. Miguel, desci a
Congarna e à estrada Potes - Fuente De ... que mais uma vez várias vezes
percorri nas duas últimas décadas do século passado; estava de novo a solo, o
meu quase homónimo e o seu amigo espanhol só os voltaria a ver ao fim do dia,
em Espinama. Mas deixaria a estrada antes de Camaleño, para
subir a Redo e a Mogrovejo, esta
última ... um autêntico pueblo de película. O piso? Pois ... o
alcatrão continuava a alternar com muita pedra solta...
O rio Deva e o respectivo vale,
entre Congarna e Camaleño
Quando não são em alcatrão ...
são assim os trilhos...
Mogrovejo ... un pueblo de película ... e de descanso num bar...
De novo junto ao Deva, havia agora que subir
o seu curso até Espinama. Pouco depois de
Cosgaya, o trilho entra felizmente em
frondoso bosque ... onde o piso de terra e erva fofa foi um verdadeiro bálsamo
para os pés. E lá ia eu, ouvindo música cantabra da muita que tenho gravada
... cantando eu ... ou ouvindo o cantar das águas que corriam ao meu lado, o
cantar da passarada alegre ... da Natureza.
Cosgaya ... e depois ... um
bálsamo para os pés, com a erva fofa, as águas do
Deva ... e as sandálias novas
15h40 ... quase em Espinama
Antes das quatro estava em Espinama. À falta
de lugar no Albergue,
tinha reservado previamente o
Hostal Puente Deva, uma boa alternativa ... e com um esplêndido restaurante e bons preços. Os
dois Zés (Calisto e Cabrera, comigo éramos três Zés) chegaram entretanto ... e
lá foram umas
1906.
O dia seguinte era domingo ... mas não era um domingo qualquer ... de um mês
qualquer ... de um ano qualquer. O dia seguinte era 25 de Julho ...
Dia de Santiago ... em Ano Jacobeo ... e o Universo
tinha designado que, por acaso (ou talvez não...) ... a etapa rainha deste
meu Caminho Vadiniense coincidisse com o Dia de Santiago.
É um quadro? É um Sonho? ... Não ... pouco passa das sete da manhã de
25.Jul.2021 e é o maciço central dos Picos de Europa, visto da subida
aos céus de Valcavao
Subida de Espinama (860m alt.)
às Horcadas de Valcavao (1780m
alt.). É preciso legendar este esplendor?...
Nas Horcadas de Valcavao tinha deixado
para trás a Cantabria e entrado em terras leonesas. Há muitos anos, já por
aqui tinha andado com alunos, em veículos todo o terreno que nos foram buscar
a Caín, no final da mítica Ruta del Cares. Lá em baixo, a
poente, estava Santa Marina de Valdeón, no
vale do rio El Arenal, afluente do Cares. Tudo à minha
volta era Montanha, num êxtase que convidava à entrega, à meditação, à
catarse. Nesse êxtase ... aparecido do nada surgiu ao pé de mim um cão ...
grande ... dócil ... sem aspecto de passar fome mas que devorou os 4
sobaos pasiegos que lhe dei...
Santa Marina de Valdeón aos
meus pés, no centro da apoteótica conjuntura dos
Picos de Europa
E quando eu páro para me entregar à Montanha
... do nada surge este amigo patudo e dócil
De onde vieste? Quem és?
Para onde vais?...
Receoso que ele me quisesse seguir até longe, como há uns anos me aconteceu em
Somiedo, arrumei as coisas e comecei calmamente a descer ... mas o estranho e
dócil amigo de 4 patas não manifestou qualquer intenção de me acompanhar.
Ouviu lá longe um outro cão a ladrar ... e desapareceu tão inesperadamente
como apareceu. Até ver...
Rumo ao Puerto de Pandetrave, agora a descer. O meu inesperado
amigo ficou para trás ... de certeza?...
Mais de 1 km abaixo, de novo surgido do nada ... lá estava ele...
Por onde foi, para me surgir de novo no Caminho mais de 1 km à frente? Porquê?
De novo com a mesma calma ... e com a mesma calma ali ficou, deitado no
Caminho ... provavelmente à espera de outros peregrinos. Mais tarde, a Isi e o
Jesus disseram-me que o tinham visto mais ou menos no mesmo local! Seria
aquele cão ... Santiago? ...
Pouco depois do meio dia estava no
Puerto de Pandetrave, a 1566 metros de
altitude. A partir dali, embora continuando no seio da Montanha e de paisagens
fabulosas ... tinha estrada, alcatrão. Ai! Ambos os pés já tinham
Compeeds; o esplendor da Montanha, as alturas de Valcavao, tinham feito
esquecer um pouco a dor ... mas a fastidiosa descida em alcatrão prometia ser
dura ... e foi. Mas Santiago dizia-me ... "tu consegues"...
Puerto de Pandetrave (1566m
alt.). A partir de aqui, seguindo o vale do Puerma ... era
alcatrão...
O almoço foi junto a esta pontesinha ... com os pés na frescura da
erva verde
Mas antes das três da tarde estava em
Portilla de la Reina e no
respectivo
Albergue
Os dois dias seguintes seriam a ligação a Cistierna, eixo comum ao
Caminho Vadiniense e ao Camino Olvidado. Duas etapas de 28 km cada, a
primeira caracterizada em grande parte pelas belas paisagens do rio
Yuso e da Barragem de
Riaño ... mas também pela muita estrada
... muito alcatrão.
Igreja de Barmiedo de la Reina,
26.Jul.2021, 8h30
A hora matinal permite ver o que
provavelmente não via a outras horas...
Próximo de Boca de Huérgano e
Ermida de Santo Tirso
As paisagens alteradas pela Barragem de Riaño, espelhando nas águas as
montanhas em redor
Espigueiro e Igreja Românica de Nossa
Senhora do Rosário, Riaño
Tanto alcatrão ... e
os pés a pedirem tréguas...
A jornada iria acabar em Horcadas, pequena
aldeia entre dois braços da barragem de Riaño, entre os rios
Yuso e Esla. Prevendo que não houvesse nada em
Horcadas, em Riaño comprei uma tortilla pronta
a aquecer ... que foi o meu jantar na
Casa Rural "Nevada". É uma casa rural que, não estando a ser utilizada para turismo, dá apoio a
peregrinos ... e que luxo de casa! Cheguei pouco depois das duas,
alone; a chave estava numa caixa junto à porta ... e
alone fiquei durante grande parte da tarde.
A hipótese de alojamento nesta Casa Rural tinha sido acertada pela simpática
hospitaleira do
Albergue de Portilla de la Reina. Sabia, por isso, que a Isi e o Jesus iriam partilhar comigo este belíssimo
local de repouso; e assim foi; chegaram a meio da tarde ... e foi a partir
deste dia que passámos a conversar e a conviver mais.
Já sabia que vinham desde Irún, que andavam portanto no Caminho há
bastante tempo; fiquei a saber que depois do Lebaniego / Vadiniense iriam
percorrer o Caminho do Salvador (pela 3ª vez!) e o Primitivo! Verdadeiros
Peregrinos, respirando Amor e entrega ... verdadeiros
ángeles del Camino.
No dia seguinte saí mais cedo ... e deixei-lhes a mensagem à esquerda ...
escrita em papel de cozinha. Quando nos voltámos a encontrar ... agradeceram
do fundo da Alma ... que nunca lhes tinha acontecido nada semelhante ... que
guardaram religiosamente o papel e o guardarão nas suas recordações dos
Caminhos 💖!
27.Jul.2021, 7h35, junto ao Rio Esla e ao paredão da Barragem de
Riaño
O meu 8° Dia seria entre Horcadas e Cistierna: 28 km quase sempre a acompanhar o Esla. Todos os dias são especiais, mas uns eu já previa que o fossem. Este 8º dia
... foi uma agradável surpresa; e nem eu sei explicar porquê; talvez porque
não contava com uma envolvência tão esmagadora da Natureza ... talvez porque o
Universo me estivesse a dizer algo ... talvez...
Ao longo do Esla, a sul
da Barragem de Riaño
Caminho Real do Esla, que
acompanharia quase toda a etapa
Não foi o único dia, mas várias vezes ao longo desta manhã cantei a plenos
pulmões o velho
Cântico dos Peregrinos de Santiago: "Tous les matins nous prenons le chemin / Tous les matins nous allons plus
loin / Jour après jour, la route nous appelle / C’est la voix de Compostelle
/ Ultreïa! Ultreïa! Et Suseïa!"
Tudo me parecia grande e alto. E eu, pequeno e frágil, entregava-me às
forças do Universo. Ultreïa 🙏
Ermida de Santa María de Pereda, próximo de
Crémenes
Nascente de águas férreas,
próximo de Aleje
Imagens de uma jornada inesperadamente mágica, descendo o
Esla
Mais para sul, à medida que me aproximava das antigas cuencas mineras,
a paisagem tornou-se mais monótona, mas antes das três da tarde estava em
Cistierna. Os meus pés precisavam destas
horas de descanso ... e o dono dos pés prefere sempre chegar a tempo de gozar
um pouco o albergue, ou hostal, e a terrinha onde fica. Em
Cistierna ... o albergue estava em quarentena, devido a um peregrino
alemão ter acusado positivo para a covid. A alternativa foi o acolhedor
Hostal Moderno ...
onde nos juntámos todos: os três Zés, a Isi, o Jesus e o Luis, um peregrino
espanhol a percorrer o Camino Olvidado desde a sua origem, em Bilbau.
Antiga cuenca minera antes de chegar a
Cistierna, acompanhando o rio
Esla
Cistierna, 27.Jul., 14h40, em fim de
etapa ... e, para mim, em fim do Caminho Vadiniense
Quanto à minha "aventura", em Cistierna deixaria o
Camino Vadiniense, que vai ligar ao Francês em Mansilla de las Mulas, para onde
continuaram o Calisto e o seu amigo, a Isi e o Jesus. Eu ... viraria a agulha
para o Camino Olvidado. Nos cerca de 230 km
percorridos ... estava com mais de 5500m D+...
Espetacular a sua crónica do caminho , já fiz santander a sto toribio e agora queria fazer o vadeniense . Obtpela partilha . Ps: se puder partilhar albergues preços agradecia .
1 comentário:
Espetacular a sua crónica do caminho , já fiz santander a sto toribio e agora queria fazer o vadeniense .
Obtpela partilha .
Ps: se puder partilhar albergues preços agradecia .
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