Neste início de primavera a lembrar ainda um chuvoso e prolongado inverno, os deuses abriram uma excepção nos dois dias de uma actividade planeada há algum tempo por um grupo de meus habituais companheiros de "aventuras". O destino era o Alentejo profundo, as terras do
Pulo do Lobo e das
Minas de S. Domingos. A minha musa e companheira também ia, para o que desse e viesse...
A partida, sábado, tinha forçosamente de ser madrugadora ... pelo que duas das "aventureiras" desta "aventura" dormiram em nossa casa, sexta feira ... não sem que antes se brindasse, claro, à nossa amizade, construída há quase um ano atrás na "aventura" do
Monte Perdido Extrem.
É preciso brindar à vida e às amizades ... porque certos dias são especiais ... com pessoas especiais...
J
(Fotos de Anabela Rey Esteves) |
Sábado 29: em terras do Pulo do Lobo
Já na companhia do quinto elemento da "equipa", eram seis da manhã quando saímos pela sempre bonita Ponte Vasco da Gama, a bordo de um novo "amigo motorizado" com pouco mais de 15 dias...
J. Ao contrário dos dias anteriores e das previsões de até um ou dois dias antes, o dia acordou esplendoroso. O destino eram as terras de
Mértola, a concentração com os organizadores e restantes participantes era na pequena aldeia de
Amendoeira da Serra, junto ao Café do Centro Recreativo e Cultural, às 9:00h.
Por entre o olival e a esteva, começámos por atravessar uma bonita zona de montado, até ao
Monte do Vento, uma exploração agro-silvo-pastoril, integrada na Associação de Defesa do Património de Mértola.
Do
Monte do Vento seguimos em direcção à
Ribeira de Terges, por cujas margens era suposto todos caminharmos até à confluência com o
Guadiana. Mas ... por vezes há pragas no caminho das fragas...
|
Descida e travessia da Ribeira de Terges ... onde o destino tece pragas no caminho das fragas... |
Na travessia da
Ribeira de Terges, quando nada o faria prever, a minha pequena arraiana escorregou numa rocha, caiu lateralmente ... e desmaiou! Por uns vinte segundos ... fez uma "viagem" por mundos obscuros. Ao voltar a si, enquanto a transportávamos para melhor local, vimos que felizmente estava consciente, embora sem saber o que lhe tinha acontecido. Vómitos e má disposição geral aumentaram a ansiedade, dela e de todos.
|
"Por fragas e pragas" se faz o destino... |
Entretanto, um companheiro saiu disparado, à procura de um sítio onde tivesse rede, que ali não havia, para chamar o 112 … o que só conseguiu na
Amendoeira da Serra, de onde tínhamos saído, ou seja, fez de novo para trás os 8 km que já tínhamos feito até ali!
Quase duas horas depois da queda, felizmente melhor e não conseguindo comunicar com o companheiro que foi a pé chamar a ambulância, resolveu-se que o grupo avançasse para o resto da caminhada, voltando nós dois e outro companheiro para trás. Mas não chegámos a andar 1 km, apareceu a ambulância. Fizeram-lhe logo ali testes de glicémia, tensão arterial, etc., tudo normal. Mas ... era melhor ir ao Hospital, a Beja. O resto do grupo seguiu o curso do
Terges e do
Guadiana ... até ao
Pulo do Lobo.
|
O Guadiana no Pulo do Lobo ... onde o destino não quis que chegássemos (Foto: Ramiro Jorge) |
O atendimento em
Beja foi super impecável. E como este mundo é uma verdadeira aldeia global, é atendida por quem, por mera casualidade? Por um clínico descendente de
Quadrazais e que, ainda por cima ... me chama uma "
figura pública"!!! Sim, a mim ... este humilde e simples mortal ... e isto porque se me declarou logo ... fiel seguidor de um blog chamado "
Por fragas e pragas..."
JJJ!
Exames feitos e confirmado que tudo não passou de um grande susto, rumámos a
Mértola, onde pouco depois nos reencontraríamos com o resto do grupo. Foi apenas uma "praga" no caminho das "fragas", felizmente sem consequências. Obrigado Dr. Pedro Febra, pelo zelo, carinho, competência e simpatia demonstradas. Em tantos e tantos anos de "aventuras", com alunos, só a dois, em grupos de amigos caminheiros por sítios por vezes bem mais complicados … nunca tinha acontecido um incidente destes. Mas é assim … "por fragas e pragas" se faz o destino.
|
Mértola by night ... onde nos esperava um bom ensopado de borrego... J! (Foto: Anabela Rey Esteves) |
Domingo 30: nas Minas de S. Domingos
O programa de domingo era bastante mais leve. Estando felizmente a acidentada bem melhor, depois de uma noite repousante à
Beira Rio, o objectivo era conhecer o velho complexo mineiro das
Minas de S. Domingos. A
Fundação Serrão Martins é a instituição que tem trabalhado na protecção, conservação, valorização e divulgação dos valores patrimoniais da Mina, assim como na promoção das potencialidades dos valores patrimoniais e culturais ali existentes, em prol do desenvolvimento das populações locais.
|
Minas de S. Domingos, 30.03.2014, 10:40h - 2º dia de um fim de semana pela raia alentejana |
Em paralelo com as velhas e abandonadas estruturas mineiras e as terras e águas contaminadas, o que ali encontrámos foi contudo uma bela e atraente envolvência natural, com o Sol a iluminar as margens dos grandes lagos da tapada Grande e Tapada Pequena. Largas dezenas de autocaravanas encontravam-se aliás na Estação que a Fundação e a Câmara ali instalaram.
|
Lago da Tapada Grande, Minas de S. Domingos |
|
Um espólio modesto para uma grande riqueza... |
Visitámos a
Casa do Mineiro e, através de uma pequena caminhada guiada, deambulámos por aquele outro mundo que são as estruturas do Complexo Mineiro de São Domingos (extracção, carregamento, oficinas, armazéns, lagoas, vestígios de mineração romana).
Tanto na
Mina propriamente dita como na
Achada do Gamo, cerca de três quilómetros mais a sul, ao andar pelo meio das ruínas, retendo a mistura de cores de uma Natureza alterada pelos materiais ferrosos e sulfídricos, dá-nos uma sensação simultaneamente de magia e de respeito, respeito pelas vidas e pelo labor de tantas e tantas gerações de famílias, cujas vidas dependiam dos filões que o subsolo daquelas terras continha. Dir-se-ia que caminhávamos pelo meio de uma descida aos infernos...
|
Imagens de uma descida aos infernos... |
|
Será do ferro ou do sangue dos mineiros?!... |
|
Dir-se-ia que, ao mesmo tempo, estávamos a viver memórias perdidas no tempo ... ou imagens de um filme de ficção... |
Depois desta "descida aos infernos", vivida por gente bem real durante décadas e décadas, soube bem voltar a ver o verde, o amarelo e o branco naturais, da esteva ou dos imensos campos de tremoceiro das terras de
Mértola. E no fim deste fim de semana atribulado mas fabuloso, voltámos à
Amendoeira da Serra para um almoço no Café do Centro Recreativo e Cultural.
|
Campos de tremoceiro, entre Amendoeira da Serra e Corte Gafo |
Um ensopado de borrego melhor ainda que o da véspera (ou um arroz de lampreia para os apreciadores...) selaram a despedida. Mas a verdadeira chave de ouro foi o que vivemos e sentimos em mais dois dias de são e alegre convívio, boa disposição, solidariedade, paciência e notável espírito de grupo.
Obrigado, companheiros!