sábado, 6 de abril de 2024

Pelas Fragas do Eume ... entre Vermilhas e San André de Teixido

A Amizade, as afinidades mágicas que se estabelecem entre as pessoas ... são dádivas do Universo ... de um Universo que tendo a acreditar que é Inteligente. E o Universo Inteligente deu-nos, a este "rapaz pacato" e à minha arraiana, amigos que vêm quase da noite dos tempos ... "manos velhos" que conhecemos desde que nos conhecemos um ao outro.
Represa da Lapa da Meruje, Vermilhas, 01.04.2024
Em mais de 50 anos de uma sã e profunda Amizade, pode-se dizer que "crescemos" juntos, que partilhámos e partilhamos alegrias e tristezas ... por fragas e pragas...
Vem esta introdução a propósito de mais uns dias intensamente vividos a quatro, em contacto com a Natureza ... até porque o contacto com a Natureza não implica obrigatoriamente percursos pedestres, embora estes dias também os tenham incluído. Desde segunda feira passada e como o título desta crónica indica, entre as terras do concelho de Vouzela e as terras galegas da Coruña, descobrimos e recordámos maravilhas naturais ... e passando por Santiago de Compostela, claro; seria impensável passarmos perto e não irmos abraçar o Apóstolo.
Santiago de Compostela, 02.04.2024, 14h30 - Santiago ... é sempre Santiago...
Foi num dia de chuva e frio que passámos em Santiago. Mas a chuva em Santiago é Arte! Daqui a pouco mais de dois meses espero lá chegar mais uma vez a pé! Desta vez, contudo, foi só de passagem para norte, para o Parque Natural das Fragas do Eume, um paraíso que não conhecíamos, apesar das múltiplas incursões na Galiza, desde os já longínquos anos 80 do século passado.

Fragas do Eume, descida de A Capela para o vale do Eume, 03.04.2024, 09h50
Parque Natural das Fragas do Eume são mais de 9000 hectares nas encostas abruptas do rio Eume, que desagua em Pontedeume, na ria de Sada e de A Coruña, a sudeste de Ferrol.
O parque alberga uma das florestas atlânticas ribeirinhas melhor conservadas da Europa. Fraga em galego significa bosque denso, com árvores de diferentes espécies, como carvalhos, castanheiros, bétulas e amieiros, freixos e teixos, avelãzeiras e árvores de frutos silvestres; de folha perene surgem os loureiros, azevinhos e medronheiros. Todos juntos formam uma selva heterogénea em que cada espécie ocupa o seu lugar. Os sobreiros, por exemplo, têm nestas ladeiras orientadas a sul o seu limite setentrional na Galiza. E nas margens húmidas e sombrias conserva-se uma ampla variedade de líquenes, musgos e fetos, herança da Era Terciária.
Fizemos base no Concello de A Capela, na encosta norte das fragas, no excelente Hotel "Fraga do Eume". O Caminho Inglês de Santiago, a partir de Ferrol, não passa longe ... e quase logo no início do Camiño Vello tínhamos a Igrexa de Santiago da Capela a abençoar-nos, antes de o trilho começar a descer para o profundo vale onde corre o Eume. Um pouco antes, surgem as ruínas do Muiño de Senín, como que a relatar memórias perdidas no tempo.

Ruínas do Muiño de Senín, junto à confluência do rio do mesmo nome e do Eume...
Mas o Parque Natural das Fragas do Eume não é caracterizado só pelos aspectos naturais. Escondido no coração da floresta, sobranceiro ao rio, de repente surge-nos o Mosteiro Beneditino de San Xoán de Caaveiro, com mais de dez séculos de história, verdadeiro monumento de arte românica em plena Natureza, cujas origens remontam ao sec. X e à vida de S. Rosendo e S. Bieito.

Na magia dos dez séculos de história do Mosteiro de San Xoán de Caaveiro
Nestas fragas não há verde ... aqui
há paisagens de mil verdes...
Às onze horas estávamos a cruzar o Eume na Ponte de Santa Cristina, ou de Caaveiro. O carro tinha ficado n'A Capela, claro, pelo que alguém teria de lá voltar. Assim ... os meus três acompanhantes seguiram a chamada estrada do rio, uma estreita estrada mais pedonal do que viária, acompanhando o curso das águas ... enquanto eu também o acompanhei, sozinho, mas para montante, pelo Camiño da Ventureira, para que mais a leste pudesse subir de regresso ao ponto inicial.

Ponte de Santa Cristina, sobre o rio Eume, próximo do Mosteiro de Caaveiro
E a partir da Ponte de Santa Cristina, a solo, segui o Camiño da Ventureira
O Camiño da Ventureira sobe o curso do rio Eume até à central hidroeléctrica do mesmo nome, por um trilho ribeirinho que tem tanto de belo como de sinuoso. Sozinho, aumentei contudo a passada; ao meio dia estava a cruzar de novo o Eume ... e a subir a bom subir a estrada alcatroada da dita central.

Fragas do Eume ... subindo o rio pelo Camiño da Ventureira
E regresso ao Concello de A Capela ... para ir buscar a viatura rolante... 😄
Clique para ampliar ou aqui para ver no Wikiloc
Com 12 km percorridos, antes da uma da tarde estava ao volante do T-ROC ... enquanto os meus três companheiros continuavam na margem esquerda do Eume, a caminho de Chao de Ombre. Houve que dar a volta por Pontedeume ... e lá vinham eles ao meu encontro. Com muito menos desnível, mas todos acabámos por fazer sensivelmente a mesma distância. E, à hora espanhola, o almoço foi precisamente em Pontedeume, muito bonita cidade ... no Caminho de Santiago 🙏
Ao contrário da chuva da véspera, quarta feira esteve um óptimo dia para caminhar, apenas algo ventoso. No dia seguinte, a partir das Fragas do Eume ... iríamos mais para norte...

Pontedeume, 03.04.2024, 15h40 ... onde espero voltar daqui a não muito tempo ... em Caminho de Santiago
E o "mais para norte" era a zona de Cedeira e de San André de Teixido, na Coruñesa Costa Ártabra, por onde eu e a minha moçoila peregrinámos, em julho de 2017.
San André de Teixido, 04.04.2024, 11h00 - A San Andrés de Teixido vai de morto o que non foi de vivo...
"A San Andrés de Teixido vai de morto o que non foi de vivo..."; como já referi em 2017, este ditado popular deriva de uma lenda que conta que Santo André estava triste, porque o seu templo era pouco frequentado, ao contrário do de Santiago. Santo André pediu então ajuda ao Senhor ... e um dia apareceu-lhe o Todo poderoso, acompanhado por S. Pedro. Ao ver Santo André tão desanimado, prometeram-lhe que ao seu templo acudiriam todos os mortais ... e aquele que não o fizesse em vida, faria depois da morte, reencarnado num animal. E assim o Santuário de Santo André de Teixido converteu-se no segundo centro de peregrinação de toda a Galiza!
Igreja de San André de Teixido,
local de culto e de peregrinação
Não percorremos o Camiño de Santo André de Teixido ... mas fomos e somos peregrinos...
Frente à brava Costa Ártabra, Teixido cativa pela singularidade do seu quase isolamento
O motivo principal para estes dias galegos foi a preparação logística para a próxima actividade de verão da "família" caminheira Gaspar Correia. E se nas Fragas do Eume essa preparação passou essencialmente pelo reconhecimento dos percursos pedestres ... em Teixido o reconhecimento foi particularmente orientado para os locais onde um autocarro poderá largar e recolher meia centena de caminhantes ... o que naquelas estradas sinuosas e estreitas não é fácil. Com pena, concluímos que não será possível levar o grupo a um outro local mágico que em 2017 me tinha ficado na memória: a Ermida e o miradouro de San Antón do Corveiro, próximo de Cedeira, onde almoçámos ... mas de onde o vendaval nos fez bater rapidamente em retirada.

Ermida de San Antón do Corveiro ...
... fotografados e filmados por
um certo brinquedo novo 😂
Pontedeume pola noite, 04.04.2024, 22h00 ... em jeito de despedida.
Pontedeume é Caminho de Santiago 💗 Mas não é um adeus, é só um até breve...
Pontedeume pola noite marcou o final destes reconhecimentos. No dia seguinte regressaríamos a Portugal e a Vermilhas, terra natal da "mana velha" Maria degli Angeli. E com o "mano velho" Mousinho ... ainda houve pernas e tempo para uma caminhada serrana ... em romagem à Ermida de S. Barnabé.

Ermida de S. Barnabé, na Serra de Vermilhas, 05.04.2024, 17h45
São Barnabé é santo de vontades fortes. Segundo reza a lenda, foi o próprio que escolheu o local da sua capela, ali onde se diz que os ventos são ininterruptos ... e onde uma linha invisível separa as paróquias e as freguesias de Alcofra e Silvares, bem como os concelhos de Vouzela e de Tondela.

Com 7,5 km percorridos, regressamos à Lapa da Meruje ... e a casa, em Vermilhas (Vouzela)
E da casa em Vermilhas ... regressámos à casa na "capital do Império". Foram 6 dias passados a quatro ... entre quem se conhece há mais de meio século. Obrigado, "Manos Velhos" ... venham mais anos e mais "aventuras Vividas! E temos várias no horizonte próximo... 😜

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