quinta-feira, 20 de maio de 2021

De Valença do Minho a Santiago … no Caminho do meu renascer (2)

De Pontevedra a Padrón
Padrón, 20 de Maio
19 de Maio, 4ª feira: de Pontevedra a Caldas de Reis, era a maior etapa do nosso Caminho, 23 km. Por isso e porque a previsão era de um esplêndido dia de Sol ... saímos do Albergue uns minutos antes do nascer do astro-rei, que logo proporcionou belas imagens na travessia do Río Lérez, pela medieval Ponte do Burgo. Poucos quilómetros depois é a bifurcação do Caminho Central pelo percurso mais antigo ou pela Variante Espiritual, que segui em 2018; implicando maior distância e mais montanha, com a minha estreante peregrina optámos pelo percurso tradicional, por Caldas de Reis, o que quis dizer também, portanto, que a maior parte desta etapa e da seguinte eram novas para mim.

Pontevedra, 19.Maio.2021, 7h20: cruzando o Río Lérez pela Ponte do Burgo, ao nascer do Sol
Desde a bifurcação da variante espiritual, o Caminho segue o eixo da linha de comboio, com belos troços de bosque e zonas rurais, sem atravessar praticamente aglomerados urbanos. E embora ligeiramente fora do Caminho, um dos atractivos do dia era o Parque Natural do Rio Barosa, para o qual se desvia ao km 15,3 desde Pontevedra. Esperávamos encontrar ali umas belas cascatas, mas a imponência da água, da vegetação e da pedra ultrapassou largamente as nossas expectativas.

Ao longo dos belos bosques a norte de Pontevedra, entre a linha do comboio e a N-550
As espectaculares Cascatas do Rio Barosa, pouco mais de um quilómetro a nascente do Caminho
Propositadamente, tínhamos levado almoço volante para as cascatas. O dia estava quente, mas mesmo assim a minha pequena peregrina preferiu o Sol, junto à água. Eu, sempre "com molas" que me impedem de estar parado ... fui dar a volta ao alto das cascatas, ao longo dos sinuosos trilhos que levam ao que resta de velhos moinhos de água.
Era uma da tarde quando deixámos aquele paraíso ... mas estávamos a pouco mais de seis quilómetros de Caldas de Reis, atravessando alguns vinhedos.
19.Maio.2021, 14h30 - Através de belos vinhedos, chegamos ao Rio Umia e a Caldas de Reis
O principal atractivo de Caldas de Reis são as suas nascentes termais, as Burgas. Depois de nos instalarmos, os pés agradeceram os 50ºC das águas termais ... que a minha parceira dificilmente conseguia manter "de molho". Para alojamento, tínhamos optado pela Pensión Augas Quentes ... uma bela opção, a preço de albergue privado, no centro da cidade, perto de tudo.

As Burgas, nascentes de águas
termais em Caldas de Reis
Mas em Caldas de Reis ... um Rey tinha-me aconselhado a não perder uma certa taberna. Obrigado, Zé Rey! À beira do Umia, a Taberna "O Muiño" é realmente um lugar muito aprazível e típico, onde jantámos uma bela grelhada de carnes. Por lá estavam vários peregrinos que já conhecíamos ... e connosco veio beber um copo o amigo Ales Vazquez, da também Taberna "Mesa de Pedra", que eu conhecera no Caminho de 2018 e onde no dia seguinte iríamos almoçar, em Pontecesures.
Taberna "O Muiño", Caldas de Reis.
Obrigado, Zé Rey!
Caldas de Reis, 20.Maio.2021, 8h05 - Ponte romana sobre o Rio Bermaña, afluente do Umia
Gradualmente, ao passo da minha peregrina especial ... o Sonho continuava. Ao sexto dia de Caminho, saímos de Caldas de Reis pelas oito horas, cruzando o Bermaña. E se as etapas anteriores foram marcadas pela água, pelo Sol, pela chuva, pelo verde ... esta sexta etapa, não sendo paisagisticamente a mais bonita ... senti-a como a "etapa rainha" deste meu Caminho de "renascimento".

Nos bosques que acompanham o vale do Río Bermaña, com a luz que nos enche a Vida
Porquê a "etapa rainha"? Não sei ... o Caminho não se explica ... sente-se! "O Caminho não é o chão que pisas". Algum cansaço acumulado da minha pequena/grande peregrina ... o procurar transmitir-lhe força e ânimo ... o senti-la receber e procurar por ela essa força e esse ânimo ... o ter sido a etapa em que convivemos com mais peregrinos ... tudo isto e muito mais fez com que, mais do que nas anteriores ... eu me tenha sentido ... no Caminho. Obrigado Universo! Ultreïa! 🙏
Uma das histórias deste Caminho, vivemo-la quando estávamos a tirar a última foto acima. Passou o grupo de portugueses que já conhecíamos, ofereceram-se para nos tirar uma foto aos dois ... e nisto aproxima-se uma outra peregrina, sozinha. "Olá Callixto! Lembra-se de mim?". Pois ... não me lembrava ... mas era a Tânia ... que até já saltou comigo e com o meu filho em Skydive! Mistérios do Caminho...
No mesmo local da última foto ... agora com a Tânia ... que pareceu caída dos céus. Não a voltámos a encontrar...
Igreja de Santa
Mariña de Carracedo
Passo a passo ... por entre o silêncio das pedras ... vamo-nos aproximando de Santiago...
Etapa predominantemente rural, a poente percebia-se já o vale do Ulla. Aproximávamo-nos de Pontecesures e de Padrón, e portanto também da junção da variante espiritual com o Caminho principal. Uns metros antes da "Mesa de Pedra", voltava a ser Caminho já percorrido, para mim.
À porta da "Mesa de Pedra", em Pontecesures, 20.Maio.2021, 13h20
À semelhança de 2018, em Pontecesures "apareceu uma casa com uns muros muito altos .... No cimo dos muros, como se de um castelo moderno se tratasse, diversas bandeiras ondulavam ao vento - estandartes com a Cruz de Cristo e Templária desenrolavam-se lentamente, criando uma atmosfera única.". "Bem-vindos à Mesa de Pedra" ... pareceu-me ouvir no ar enquanto entrávamos. Tal como o Pedro e a Sofia do "Entre o Silêncio das Pedras" ... fomos recebidos naquele espaço único pelo seu único hospitaleiro, Ales Vazquez, com quem estivéramos na véspera em Caldas de Reis ... e por ali estivemos umas duas horas à conversa sobre o que o Caminho nos ensina, sobre a Vida ... sobre tudo e sobre nada, ao mesmo tempo que íamos saboreando um gaspacho, uma jardineira, regados com um vinho tinto artesanal, um café preparado ao ritmo de uma ampulheta...
Na "Mesa de Pedra" ... um ícone do Caminho Português em Pontecesures
WiFi eiquí ... só o can 🙂
Na "Mesa de Pedra" éramos nós, os quatro peregrinos portugueses, uma checa, o Ales ... e o WiFi. WiFi? Sim ... o WiFi é o cão. A Joana perguntou se não havia WiFi ... e o Ales respondeu ... "WiFi eiquí só o can"... 🤪
Eram duas horas quando deixámos a "Mesa de Pedra". Cruzámos o Ulla, acompanhámos o Sar ... e entrámos em Padrón. Padrón era um dos poucos concelhos galegos em nível máximo de confinamento. Sabíamos que não íamos encontrar restaurantes nem bares abertos, mas a maioria dos albergues privados estavam a funcionar normalmente. Escolhêramos o Albergue Rossol, situado mesmo em frente à Igreja de Santiago; sem dúvida um dos melhores em que ficámos ... e o mais barato! Uma vez instalados, fomos visitar a Igreja, que guarda o pedrón, a pedra a que terá sido amarrada a barca que transportou o corpo de Santiago, na sua trasladação desde a Terra Santa.
Padrón, 16h00 - O Rio Sar e o Convento do Carme
Igreja de Santiago de Padrón,
com o pedrón a que terá sido
amarrada a barca de Santiago
Ponte medieval sobre o Sar e Fonte e Convento do Carme
No Albergue Rossol, frente à Igreja de
Santiago
No morro sobre o Convento do Carme situa-se a Capela e o Cruzeiro do Santiaguiño do Monte. A minha pequena peregrina ficou no albergue, mas eu ainda subi ao monte, com esplêndidas panorâmicas sobre Padrón. Reza a lenda que o Apóstolo Santiago ali terá pregado a Fé Cristã.
Subida ao Santiaguiño do Monte
Capela e Cruzeiro do Santiaguiño do Monte e panorâmica sobre Padrón ... à luz do Sol poente
Em Padrón estávamos a cerca de 25 km de Santiago de Compostela. O nosso Caminho aproximava-se do destino traçado. Numa única etapa, chegaríamos a Santiago pela tarde dentro, pelo que, na planificação deste Caminho, optámos por uma etapa prévia que nos deixasse quase às portas do campo das estrelas ... até porque ainda havia uma "prova de superação" para vencer...
(Escrito e composto em casa, a 28 de Maio)

1 comentário:

Manso disse...

Dos poucos caminhos que conheço, a Variante Espiritual é a que guardo no coração.