quinta-feira, 23 de julho de 2020

Um pôr-do-Sol no Atlântico ... imaginário...

Com bom tempo, ou até com umas nuvens a pintar belos quadros naturais, um pôr-do-Sol ou um nascer-do-Sol é sempre um espectáculo mágico. Que o digam as cores e as sensações já várias vezes vividas em Fisterra ... em Santorini ... na Nazaré ... em Santa Cruz ... no Cabo da Roca ... no cume da ilha do Pico ... ou em tantos outros locais. Mas assistir a um pôr-do-Sol ... e a seguir ficar a ver a luz a declinar,
Nascer do Sol sobre o Tejo, 22.Jul.2020
A intenção era ir vê-lo pôr-se no Atlântico...
as estrelas a aparecerem no firmamento ... adormecer a sonhar com Sirius - de onde a humanidade pode ter vindo... - acordar com os primeiros alvores do novo dia ... não é para todos ... nem todos os dias. Mas foi ontem e hoje ... para três almas que se juntaram à beira do Atlântico: uma estrela arraiana, o autor destas linhas ... e a "Sacerdotisa" do fogo e da luz... 🙂
Só que ... nem sempre os astros se alinham no sentido previsto. Contra todas as previsões do Windguru, do FreeMeteo e de outros, segundo os quais não haveria nebulosidade na "frente ocidental" ... assim que nos começámos a aproximar da costa começámos a ver um espesso e cinzento "capacete" sobre o mar. Mas, eram 17h30 ... faltavam três horas e meia para o espectáculo ... e a esperança é a última a morrer. Tanto mais que um amigo das lides caminheiras me havia falado de umas horas mágicas, a hora azul e a hora dourada, conceitos de que, inacreditavelmente ... eu nunca ouvira falar! Depois, para somar à magia, a Lucy, como boa sacerdotisa ... tinha visto há dias uma panóplia de cores e de sensações ao "comer o Sol", uma prática conhecida por Sungazing que consiste em olhar fixamente para o Sol durante o amanhecer e o anoitecer. O meu júnior mais sénior ... perguntou-me se isso foi antes ou depois dos cogumelos... 🤣

Sem cogumelos mas com esperança num espectáculo mágico ... dois irmãos e uma "cunhada" desceram à praia e esperavam pelo Sol... 🙂
A esperança tínhamos ... ou melhor ... eu tinha; a minha estrela e a minha irmã Lucy in the sky ... não tinham muita. E o calor quase insuportável de onde tínhamos saído ... também se evaporou como que por encanto. Eu e a Lucy fomos fazer um reconhecimento da área ... enquanto de 5 em 5 minutos olhávamos para o céu...; a minha Lalita preferiu o descanso ... e a camisola!

19h55 ... ainda faltava uma hora para o pôr-do-Sol ... mas apenas 20 minutos para o início da "hora dourada"
De repente ... "Zé ... céu azul! Agora já tenho mais esperança" ... dizia-me a Lucy eufórica. E sim ... havia pedaços de céu tenuemente azul ... do lado de terra ... em contraste com o cinzento cerrado sobre o mar. De quando em vez ... caíam borrifos; "é a maresia" ... acreditávamos. E os ténues laivos de céu mais claro esbateram-se. Afinal, o Windguru, FreeMeteo, etc. ... estavam errados ... pelo que optámos por ir jantar. E que jantar! A minha irmã é afinal também sacerdotisa ... de belas refeições!

O Sol decididamente não se vê ... as gaivotas começam a recolher ... não há hora dourada nem azul ... mas nós brindamos à Amizade ... à juventude ... à Alegria ... à VIDA! E brindamos ... com "Quinta dos Termos Vinhas Velhas", pois claro!
Tínhamos imaginado um pôr-do-Sol magnífico. A Lucy ia-nos ensinar o Sungazing ... mas o Universo trocou-nos as voltas e ofereceu-nos um nevoeiro místico. Levantada a "mesa" onde jantámos, foi nessa twilight zone cinzenta e densa que vagueámos um pouco ao sabor da alegria de estarmos vivos e bem ... tentando captar nas fotos a mística desta nossa "aventura". "Sinto-me de novo adolescente", disse eu para esta minha tão boa Amiga. Conhecemo-nos há 7 anos, mas, quase repentinamente, neste estranho ano de 2020, o Universo fez questão que descobríssemos ... que somos irmãos... 👫🙂.

True happiness is a set of blinking moments...
Friorenta - apesar de ser ela a da terra do frio - a minha estrelita já tinha recolhido à tenda, quando eu e a Lucy também recolhemos. Ainda nem dez horas eram ... mas a "hora azul" - imaginada a seguir ao pôr-do-Sol - também já tinha passado.
Em absoluto confinamento... 🤣
Não havia Lua ... a Lua nova tinha sido 2 dias antes. Com o nevoeiro ... também não havia estrelas ... mas havia 7 outras tendas na praia! Espanhóis, pelo menos alguns; afastados de nós ... teoricamente não nos iriam incomodar...
O som das vagas a rebentarem na praia entrava-nos pela tenda. Mas, tal como na cabana de Pinhô na autonomia do Solstício, a música surgiu. Desta vez era uma espécie de "Quando o telefone toca" ... escolhíamos um de cada vez a faixa seguinte ... dentro da disponibilidade no meu telemóvel. Sim, porque lá em baixo, junto ao Atlântico "enfurecido", não havia rede nem internet. Por entre a Brigada Victor Jara, os Luar na Lubre, Sebastião Antunes e outros ... a minha donzela adormeceu ... deixando escapar declarações indecifráveis. Os dois irmãos ... esses ficaram de conversa ... sobre tudo e sobre todos. Quando pensámos que seria quando muito meia noite ... era 1h15 da madrugada! Era preciso dormir ... e lá adormecemos. Pelo menos ... até às quatro da manhã...
Efectivamente, pouco passava das quatro quando a Lucy me chamou; "Zé, anda gente aqui à volta da tenda, com luzes". Ouviam-se vozes perto ... espanhóis. E as luzes passeavam-se para um lado e para outro. "Estarão drogados?", perguntava a minha "sócia". Bem, abri a tenda ... pelo menos à nossa frente não havia nada nem ninguém ... apenas o mar bravo e o céu ... no qual a Lucy dizia ver estrelas ... que eu não via; o nevoeiro persistia ... mágico e místico. Mas realmente uma luz forte emanava à esquerda da tenda. Teria pousado ali um OVNI ... e os alienígenas seriam espanhóis? Saí da tenda. Um pouco atrás e à esquerda da nossa estava outra tenda; junto dela uma forte luz led acesa ... e ouvi um sonoro "¡Hola!" de uma jovem junto à dita tenda.
23.Jul.2020, 7h00 - Um despertar...
sem o desejado Sol...
Não me pareceu "ameaçadora"; fui às minhas precisões para o lado contrário e voltei à tenda. Nosso raciocínio: no grupo das sete tendas ... alguém desertou ... alguém se chateou com alguém ... e migrou durante a noite... 🤣
Quando voltámos a acordar ... já era dia. Na costa atlântica (portuguesa) claro que nunca veríamos o nascer do Sol ... mas o nevoeiro denso e cinzento persistia. Roguei pragas ao Windguru e FreeMeteo...! Tomámos o pequeno almoço na tenda; excelente, o "serviço de catering" da Lucy! Abstraindo da música das ondas e do vento, nada se ouvia em redor ... mas o "OVNI" espanhol lá estava ... completamente em silêncio ... inclusive com um "alienígena" cá fora, a dormir na areia, num saco cama tipo múmia. Sim ... porque o vento e o frio não convidavam a aventuras ao relento!
Desmontar a tenda foi uma aventura. Há bastante tempo que esta "casa" não era utilizada e, embora a tivesse ensaiado ... já sabia que estas tendas levam 2 segundos para montar e 30 minutos para arrumar... 🤣
Às oito da manhã, sensivelmente, iniciámos a debandada. A "nossa" praia ficava para trás ... e para trás ficava também uma "aventura", um pôr-do-Sol imaginário, uma "aventura" que temos de repetir, para ver a "hora azul", o Sungazing ... e tudo o mais a que tivermos direito. Para trás ficavam também os nossos "vizinhos" espanhóis, migrantes às quatro da manhã. Quando acordaram e olharam em redor ... deve ter sido a vez deles de pensar que éramos nós os alienígenas ... e que a nossa nave nos recolheu durante a madrugada...

23.Jul.2020, 8h10 ... adeus águas do Atlântico ... adeus pôr-do-Sol que não vimos ... adeus aventura...
Como é típico deste litoral ocidental e selvagem ... pouco depois estávamos com Sol e calor. Em Lisboa ... duas horas depois a temperatura passava dos 30ºC. As memórias de um pôr-do-Sol imaginário ... dos fenómenos "místicos" e coloridos a ele ligados ... as memórias de um fim de dia e de uma noite passados a três numa tenda de dois ... a três num saco cama de dois ... ficarão para sempre escritas ... no nosso "Book of Secrets" ... no "Book of Secrets" de cada um de nós três. Voltaremos!

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