domingo, 23 de setembro de 2018

De Santarém a Ansião ... no Caminho de Santiago

Percorrido em Maio passado o Caminho Central Português desde Fátima e percorridas inúmeras vezes as etapas Lisboa - Santarém - Fátima, faltava-nos à minha "mana" Paula e a mim o troço entre Santarém e Ansião, dado que é precisamente em Santarém que o Caminho Português de Santiago se bifurca entre o traçado original
Estação CP da Bobadela, 15.Set.2018, 5h32
- por Tomar - e a variante de Fátima, voltando a juntar-se em Ansião. Quando a minha mana me propôs que fizéssemos aquelas etapas em dois fins de semana … aceitei de imediato … e a nós juntou-se uma outra nossa amiga de caminhadas e que recentemente se "converteu" também ao Caminho, bem como dois amigos Santiagueiros com muitos quilómetros nos pés a caminho do túmulo do Apóstolo, um deles que conhecemos bem recentemente. O Universo e Santiago juntam o seu "rebanho"...
Assim, sábado dia 15, às 5h40 da manhã, estava a iniciar o meu fim de semana … com a minha primeira viagem de comboio a preço de terceira idade 😋 E às sete e meia juntávamos a equipa de 5 em Santarém. Que melhor sítio poderia haver para termos combinado o encontro … do que a Porta de Santiago?
Santarém, Porta de Santiago, 15.Set.2018,
7h20
Do lado de lá do Tejo, o Sol tinha nascido quase atrás da Igreja de Santa Iria
A igreja da Ribeira de Santarém é de invocação a Santa Iria, a mártir cristã nabantina cujo corpo, segundo a lenda, aportou a estas paragens após um trágico martírio. Cerca de dois séculos depois, no bosque de Libredón, a descoberta do túmulo do Apóstolo Santiago dava início às peregrinações ... e ali estávamos agora 5 peregrinos, dispostos a percorrer as 4 etapas do Caminho Central Português que levam de Santarém a Ansião, em dois fins de semana de Setembro.

Pelos campos ribatejanos, seguimos as
setas amarelas. Ultreïa!
Paisagisticamente, o troço Santarém - Tomar é menos atractivo do que as etapas por Fátima. Plano, monótono ... e com muito calor. Fizemos uma primeira paragem em Vale de Figueira, aos 11 km, e outra na Azinhaga, a terra natal de José Saramago. Igualmente as marcações do Caminho precisam renovadas. Nesse primeiro sábado, aliás, vimos Peregrinos estrangeiros referindo-se precisamente à imprecisão e/ou inexistência das setas. Peregrinos portugueses ... só nós.

Com José Saramago na Azinhaga, sua terra natal, 15.09.2018, 13h00 (Foto: Luís Martins)
Pelos campos do Ribatejo e seguindo as setas amarelas ...
... antes das duas e meia entrávamos na Golegã, com 30 km percorridos desde Santarém (Foto: Jorge Salgueiro)
Casa-Estúdio de Carlos Relvas, na Golegã ... o "Templo da Fotografia"
Igreja Matriz da Golegã
E na Golegã ficámos no excelente Albergue "Solo Duro" ... nós 5 e dois italianos. Boas instalações, excelente acolhimento por parte dos hospitaleiros, pequeno almoço incluído. Na manhã de domingo saímos ao nascer do Sol, já que a "promessa" de muito calor continuava; um dos italianos ... já tinha saído às cinco da manhã!

E o Sol nasce nos campos da Golegã, 16.Set.2018, 7h25

   
A etapa Golegã - Tomar é menos monótona do que a anterior; começa a haver algum relevo, mais vegetação, também mais motivos de interesse arquitectónico e histórico, como a velha Quinta da Cardiga, doada por D. Afonso Henriques à Ordem dos Templários em 1169.


Quinta da Cardiga, em S. Caetano,
Golegã, 16.Set.2018, 8h20
E o Caminho segue o seu curso, sempre para Norte
Passada a zona da Barquinha e Entroncamento, cruzamos por cima da A23 e rumamos ao Grou e à Asseiceira. Pronuncia-se "Grou" ou "Gru"? A dúvida estava instalada ... até perguntarmos a um autóctone. "Como é que se chama esta aldeia?"; "É Grou", logo veio a resposta esclarecedora 😊. E, uma vez esclarecidos ... diz o Luís que na Asseiceira há um café com um vinho branco muito bom! Hmm ... creio que até andámos mais depressa! O dito café estava lá ... mas fechado. Mas felizmente havia outro e, com o fito no vinho branco bom e fresquinho naquela manhã quente ... vem uma rodada de um néctar geladinho e delicioso ... e uma segunda ... e uma terceira rodada. "Agora até voamos direito a Tomar"... 😋! Mas não voámos antes de alguma emoção minha e do Jorge na Igreja da Asseiceira. Momentos que não se explicam ... momentos que se sentem ... momentos do Caminho!

Cinco Peregrinos junto à mensagem de Isaías, em Asseiceira: "Nós somos o barro ... tu és o oleiro..."
A temperatura devia rondar os 32 ou 34ºC ... e sabíamos que agora era só estrada, até Tomar. A minha mana Paula fala com a mãe ... e sabe que está a almoçar ... ali a poucos metros de nós! Apesar do nosso aspecto "andrajoso" lá entramos pelo restaurante dentro ... e assim, do nada e naquele instante, surgiu um agradável encontro familiar e amigo! Momentos do Caminho!

Às duas horas de uma tarde abrasadora estávamos a entrar em Tomar, junto ao Nabão! (Foto: Luís Martins)
Em Tomar, o rumo continuou a ser sempre em frente, sempre para norte ... sempre em direcção à "Taverna Antiqua". Tínhamos acordado terminar ali o primeiro dos dois fins de semana no Caminho Santarém - Ansião. E assim foi. Aquele espaço atrai e cativa por todas as razões.

Praça da República, Tomar, 16.Set.2018, 14h20
Igreja de São João Baptista, Tomar ... e a "Taverna
Antiqua", onde terminámos o primeiro fim de semana
Duas horas depois e depois do merecido descanso, estávamos a apanhar o comboio na estação de Tomar ... onde uma semana depois estaríamos de novo a chegar!

No comboio, a caminho de Tomar, 22.Set.2018, 7h25
Praça da República, Tomar, 22.Set.2018, 09h00
E assim foi. Ontem, sábado, lá estávamos de novo em Tomar ... embora reduzidos a três, o autor destas linhas, a "mana" Paula e o Jorge. O Nabão foi nosso companheiro nos primeiros quilómetros.

O Nabão em Tomar, para um belo (re)início de caminhada
(Foto da direita: Jorge Salgueiro)
Com menos estrada, mais sombras, mais troços de caminhos de pé posto, logo de início o Caminho revelava-se mais atractivo. E em Soianda, com 9 km percorridos, surge-nos o primeiro Café ... e que Café! O Café Balrôa merece uma referência. Cativou-nos logo a placa à porta: "Bom Caminho"! E que exemplo de simpatia e de hospitalidade ali encontrámos. Um exemplo a seguir pelos comerciantes que podem, sem explorar os Peregrinos, cativá-los para os seus pequenos comércios locais. Após umas bebidas que pedimos, à pergunta sobre o preço das bananas expostas a resposta foi ... "leve à vontade, não é nada"!

Café Balrôa, em Soiandas, com a respectiva proprietária ... uma referência no Caminho Central Português
Calvinos, Chão das Eiras, Ceras, Vila Verde ... sucedem-se pequenas povoações ao longo de um acentuado sobe e desce mais ou menos contínuo. Com quase mais 14 km em cima dos 9 iniciais, descemos para o Tojal, na perspectiva de um segundo café ou bar onde descansássemos pela segunda vez. Um simpático casal que nos deixou reabastecer de água deu-nos a referência ... e a Cervejaria Tojal Douro lá estava efectivamente, próximo do cruzamento da EN110 com a EN248. E decididamente estávamos num dia bom.
Em Alvaiázere, brindando à Vida, 22.Set., 18h05
Aqui, foi a simpatia da funcionária que nos atendeu que nos cativou ... e nós cativámo-la para os Caminhos de Santiago. Prometeu-nos que para o ano estará connosco... 😊! Voltaríamos a encontrá-la em Alvaiázere ... quando estávamos já a brindar à Amizade ... ao Universo ... à Vida! "Olá, boa tarde! Então agora já não me conhecem?" ... e realmente vestida "à civil", não a tínhamos reconhecido de imediato.
Antes de Alvaiázere existem actualmente duas ou três opções de alojamento para Peregrinos ... mas nós queríamos conhecer a célebre Albergaria Pinheiros. Célebre pela simpatia do casal que a gere ... mas também pela autêntica obra de arte que é o selo (ou selos...) deste Albergue icónico do Caminho Português ... e de algumas outras obras saídas das mãos do Carlos, que abraçou os Caminhos de Santiago sem nunca os ter feito! Um dia será...
Com o Carlos Pinheiro na sua Albergaria, hospitaleiro
como poucos ... cujo selo é um motivo de orgulho
em qualquer Credencial Peregrina
Em Alvaiázere ... estávamos a menos de 14 km de Ansião. Aproximavamo-nos de novo gradualmente do Nabão e do Caminho percorrido em Maio. Hoje era portanto a quarta e última etapa desta "variante" ... etapa que se revelou, como a de ontem, igualmente bastante bonita paisagisticamente. Estávamos em terras de Sicó.


Conheço este Peregrino...
(Foto: Jorge Salgueiro)
Percorrendo os belos trilhos das terras de Sicó, entre Alvaiázere e Ansião
Ainda não eram dez da manhã estávamos a entrar em Ansião. Em Maio tínhamos vindo da casa do Steve e da Rosa, próximo de Albarrol. Entre Santarém e Ansião, já conhecíamos agora as quatro etapas originais do Caminho Central Português e as quatro etapas por Fátima e Caxarias. E se ontem saímos do Nabão ... hoje acabaríamos igualmente no Nabão, na Ponte da Cal ... que em Maio nos tinha lançado para norte, para terras de Condeixa ... e de Santiago.

E assim entramos em Ansião e na sua Igreja



⏬   Ponte da Cal, Ansião, 23.Set.2018, 10h00
Cumprido o objectivo que nos havíamos proposto, chegava a hora do regresso. De Ansião, a melhor forma é apanhar um transporte para Pombal, onde há comboio. E assim fizemos. Dois peregrinos vivem em Santarém e o outro na grande Lisboa ... mas como havia que almoçar saímos os três em Santarém, onde tínhamos começado há uma semana estas 4 etapas do Caminho Central Português.
Santarém, Casa Condeço, 13h30 ... para
almoçar e brindarmos ao Caminho!
(Clique para ver o álbum completo)
Aqui fica o meu obrigado aos quatro companheiros destes dois belos fins de semana ... em especial à mana Paula, que os idealizou para completarmos pelas duas vias o Caminho Central Português percorrido em Maio. Paula, falta-te agora apenas ... Lisboa - Santarém. Um dia...

2 comentários:

Paula Francisco disse...



De facto foram dois fins de semana de sonho. Já tenho saudades, mas o passado é passado e há-que pensar no futuro e nos Caminhos que ainda virão. No entanto vou saborear o presente para que quando chegar essa altura a emoção ser maior. e tenho a certeza que daqui a 1 ano estarei a Caminhar para Santigo poder abraçar :). Ultreya

Raul Fernando Gomes Branco disse...

Extraordinária e didática reportagem! Um abraço.