Finisterra ... o fim da terra ... o
fín do Camiño. Superstições, pedras milagreiras, lendas de cidades sepultadas, como a mítica cidade de
Duio, destruída por Deus como castigo pela indiferença das populações às homilias do Apóstolo Santiago e pelo culto pagão ao Sol.
Finisterra ... o
Monte Pindo ... o Olimpo Celta ... as terras do fim do mundo ... os
camiños do fín da terra !
|
Praza do Obradoiro, Santiago de Compostela, 01.05.2014 |
Depois de uma primeira "peregrinação" a estas terras
há mais de 30 anos, várias vezes a
Fisterra galega foi destino de viagens e passeios. Nunca tinha contudo percorrido a pé estes
camiños do fín da terra. Acontece que, da actividade de verão dos "meus" Caminheiros Gaspar Correia, faz parte uma componente final nestas paragens ... pelo que se impunha um reconhecimento prévio dos percursos a realizar. E assim, juntamente com os grandes e velhos amigos que em boa hora um dia levámos para o grupo, no primeiro dia de Maio partimos de Lisboa para as terras do fim do mundo, não sem passar, claro, pela mítica
Praza do Obradoiro, na mítica e mística cidade de
Santiago de Compostela.
|
Cee, na Fisterra galega, 01.05.2014, 18:50h |
02.Maio - Nos camiños do fín da terra
A primeira jornada pedestre levou-nos à praia de
Rostro, a norte da península de Fisterra, em plena
Costa da Morte. O objectivo era percorrer o alcantilado litoral até ao
Cabo Finisterra, ou
Fisterra, o fim da terra galega, fim também dos
Caminhos de Santiago, nas suas etapas finais. As paisagens de mar e terra são espectaculares; a areia fina e quase branca contrasta com o verde das colinas litorais.
|
Praia de Rostro, 2.Maio.2014, 9:45h |
|
Praia de Arnela, Denle |
Atravessámos as aldeias de
Castromiñán,
Denle e
Vilar de Duio, subindo depois à Veladoiro do
Cabo da Nave, a 234 metros de altitude, onde a península de
Fisterra nos aparece já no horizonte.
|
Próximo de Vilar de Duio |
|
A caminho do Cabo da Nave |
|
A paisagem que íamos deixando para norte ... |
|
... e a Península de Fisterra surge-nos no horizonte |
|
Descida do Cabo da Nave |
|
Praia do Mar de Fóra |
|
San Martiño de Duio,
|
|
nos caminhos de Santiago
|
Do
Cabo da Nave descemos à praia do
Mar de Fóra, na costa ocidental do estreito istmo de
Fisterra. Mas ... era preciso ir buscar o carro; os meus três companheiros ficaram na praia, enquanto este andarilho autor destas linhas fez a inflexão de novo para norte, por
San Martiño de Duio e
Ermedesuxo de Abaixo, rumando de novo à praia de
Rostro.
|
E de novo na Praia de Rostro, 13:35h |
Já de carro, rumei ao
Cabo Fisterra. E ali o deixei de novo, para subir ao
Monte do Facho e ir ao encontro dos três "parceiros". As panorâmicas que se avistam do alto do Facho são sempre sublimes...
|
Reencontro no Monte Facho, com Fisterra ao fundo |
|
Águas de cristal... |
|
Lá em baixo, de novo a praia do Mar de Fóra |
A envolvência no
Cabo Finisterra, ou Fisterra, a ligação aos Caminhos de Santiago, a quantidade de peregrinos ... tudo ali impõe respeito e nos faz sentir pequenos. Pequenos ante um lugar "sagrado" ... pequenos ante a natureza que nos rodeia...
|
Símbolos Santiagueiros, com a |
|
queima dos bens terrenos... |
|
Espero em breve
|
|
chegar aqui ... a pé
|
|
Cabo Fisterra ... onde a terra se acaba e o mar começa ... no fín do Camiño ... nas terras do fim do mundo... |
03.Maio - Quando os deuses do Olimpo cedem lugar ao inferno
O dia seguinte tinhamo-lo pensado para o
Monte Pindo, o Olimpo Celta. Sabíamos do grande incêndio que o assolou
em Setembro de 2013 ... mas não imaginávamos a dimensão da catástrofe.
11 anos depois do Prestige, a costa mártir da Galiza tinha voltado a sofrer!
|
Praia e Porto do Ézaro, 3.05.2014, 9:55h - O paraíso ... às portas do inferno... |
|
O demo varreu de fogo o |
|
Olimpo dos deuses celtas... |
Na encosta norte do
Monte Pindo, o
rio Xallas precipita-se para a pequena baía de
Ézaro na única cascata europeia que se precipita directamente no mar. Não fora, mais uma vez, o panorama negro que dela se avizinha e teríamos ali as imagens de um paraíso. As imagens que contudo se encontram na rede mundial, de Setembro de 2013, com as chamas até ao mar ... são imagens do inferno.
|
Cascata de Ézaro, no Rio Xallas |
03.Maio - Camiños de Muxía
Posta de lado a perspectiva de caminhar por entre as cinzas, virámo-nos para o outro ícone mundialmente conhecido da Costa da Morte: a vila piscatória de
Muxía e a sua
Virgem da Barca ... que o destino quis também que sofresse um trágico
incêndio no Dia de Natal de 2013.
|
A Praia de Lourido, Muxía, a Ria de Camariñas e o Cabo Vilán, do cume do Monte Facho de Muxía |
E a nossa segunda jornada pedestre começou no cume de outro
Monte Facho, sobranceiro à praia de
Lourido e com a fabulosa panorâmica que a foto documenta. Facho é um topónimo que aqui se repete nos cumes estratégicos próximos da costa, onde se acendiam os
fachos para orientar a navegação ou para comunicar a chegada de embarcações piratas.
|
Descida do Monte do Facho |
|
Aldeia de Lourido: ruralidade a menos de 1 km do mar |
|
Praia de Lourido |
O carro ficou no cume (alguém o iria buscar mais tarde...
J) e descemos para a praia, de magnífica areia clara, ao fundo da pequena baía de
Lourido. Dali a
Muxía seguimos ao longo da costa, escarpada. O rumo era agora o Santuário da
Virgem da Barca, na Ponta da Barca, ou de
Xaviña.
|
Entramos em Muxía |
|
Em Muxía ... e no lugar |
|
mágico da Virgem da Barca |
A história mais primitiva de
Muxía está ligada a esta ponta rochosa e a cultos mágico-religiosos que ali se praticaram ao longo dos séculos. Um conjunto de rochas originou grande número de ritos e crenças pré-Cristãs, que perduraram até aos nossos dias; a mais célebre é a famosa
Pedra d'Abalar, à qual se atribuem múltiplas propriedades, desde adivinhatórias a instrumento de justiça. A fúria do mar deslocou-a e quebrou-a por diversas vezes, seguidas de outras tantas tentativas de restaurar as suas faculdades.
|
Sobre a Pedra d'Abalar, frente ao Santuário da Virgem da Barca |
|
Pedra dos Quadrís
Escultura "A Ferida", simbolizando a ferida aberta em 2002,
na Costa da Morte, pelo naufrágio do Prestige e consequente
catástrofe ecológica
|
Juntamente com o
Cabo Fisterra,
Muxía e a Ponta da Barca constituem os objectivos finais de todo e qualquer peregrino, como epílogo do Caminho seguido até à Catedral de Santiago. Conta a lenda que, depois da submersão da cidade de Duio e do desaparecimento de todos os seus habitantes, o Apóstolo retirou-se para esta
Punta de Xaviña, para rezar e suplicar ao Senhor que as populações recebessem as suas palavras.
|
Cruzeiro da Ponta da Barca |
De repente, o Apóstolo vê uma barca misteriosa que se aproxima e nela contempla a formosa Virgem, que lhe comunica o êxito das suas homilias e lhe ordena que retorne a Jerusalém, que a sua missão nesta terra estava cumprida.
A barca em que chegou a Virgem era de pedra, tal como a respectiva vela e o leme, que ali ficaram depositadas para sempre. A barca é a
Pedra de Abalar e a vela é a
Pedra dos Quadris...
A pedra dos quadrís tem também a forma de um rim, atribuindo-se-lhe propriedades curativas para as dores de rins e reumáticas. Mas, para que estas enfermidades se curem ... é preciso passar nove vezes por baixo dela...
Contornada a
Ponta da Barca, o nosso percurso continuou ao longo da costa leste, passando também junto da bela igreja de
Santa Maria de Muxía. O porto piscatório, as praias da
Cruz e de
Espiñeirido convidavam ao descanso, no belo dia de Sol com que, mais uma vez, os deuses nos tinham agraciado.
|
Ao longo da costa leste da península de Muxía, sobre a ria de Camariñas. Ao fundo o Cabo Vilán. |
Mas ... era preciso ir buscar o carro ao
Monte Facho. Mais uma vez ... este andarilho dos caminhos ofereceu-se para o fazer, enquanto os três parceiros ficaram em
Muxía, a gozar as delícias da tarde...
J
Por
Vilar de Figueiras e
Oruxo, "ataquei" os 300 metros de desnível do Facho pela aldeia com o curioso nome de
Xurarantes; não deve ter a ver, mas dá para
xurar ...
antes da subida...
J!
|
Praia da Cruz, Muxía |
|
Na pequena aldeia de Xurarantes ... antes de atacar a subida ao Facho de Lourido |
E assim, com 13 km percorridos, antes das cinco da tarde estava a recolher o carro no cume do
Facho, onde havíamos começado. Ainda deu para partilhar um bom gin tónico com os meus companheiros, em
Muxía...
J!
|
A caminho do Facho de Lourido |
E estávamos também a terminar este périplo pelas terras do fim do mundo. Domingo foi dia de regresso a casa ... esperando voltar a estas terras dentro de não muito tempo ... nos
Caminhos de Santiago...
E o regresso foi ainda parcialmente ao longo da costa, entre
Cee e
Noia. De Noia, conta-se que foi fundada por uma neta de Noé, Noela, de quem derivará o seu nome. Num monte próximo, a sul do
Monte Pindo ... estará enterrada a arca construída pelo avô, para sobreviver ao Dilúvio.
Sem comentários:
Enviar um comentário