Um dia, no longínquo ano de 1980 (isso mesmo, há 37 anos...) tirei a foto abaixo, no
Cabeço da Aguieira, o esporão rochoso que domina, a sul, a riquíssima
Várzea de Loures e do
Trancão.
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Cabeço da Aguieira. Abril de 1980 ... há 37 anos |
Quem está na foto, para além da minha estrela de sempre, é o meu filho mais velho, na altura com 2 anos e meio ... agora a caminho dos 40!
A viver há quase 44 anos no Concelho de Loures, nunca mais voltei ao
Cabeço da Aguieira. Nas minhas múltiplas jornadas pedestres, a várzea do Trancão já foi inúmeras vezes percorrida, mas sempre pela margem esquerda do rio ... o
Caminho de Fátima e de Santiago. Ora, ligar as duas margens e voltar à
Aguieira estava na gaveta mental dos meus planos há já algum tempo. O
Trancão é transposto entre o Caminho de Fátima e
Santo Antão do Tojal, onde já tantas vezes passei. Mas, para passar da várzea para sul, a única ligação é a chamada "
Ponte Américo", sobre a
Ribeira de Frielas, entre o Bairro do
Olival Queimado e
Unhos. E assim se foi desenhando um plano para uma caminhada que seria, de certo modo, uma volta à várzea do Trancão.
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Ao longo do Aqueduto do Alviela na zona de S. João da Talha, 8.02.2017, 8h25 |
À semelhança da longa jornada ao
Cabeço de Montachique, há quase um mês, o início foi na
Bobadela. Na fase inicial, atravessando zonas densamente urbanizadas, tentámos acompanhar o mais possível o velho aqueduto do
Alviela, até ao
Castelo de Pirescouxe. Erguido em posição dominante sobre uma espécie de promontório de onde se descortina o curso do
Tejo, o "Castelo" é na realidade uma mansão senhorial que remonta ao século XV, quando Nuno Vasques de Castelo Branco instituiu um morgadio naquele local, até então uma quinta da família. Desde 2001, o conjunto foi recuperado, revitalizado e requalificado como espaço cultural.
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Castelo |
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de Pirescouxe |
A tradição local afirma que se oculta, nas caves do Castelo, o tesouro de D. Sebastião. A última proprietária ter-se-á mudado por não suportar ser incomodada por curiosos em busca dessa riqueza. António Godinho, um historiador local, afirma que pode haver um fundo de verdade na lenda, uma vez que um dos antigos proprietários acompanhou aquele soberano na fatídica batalha de Alcácer Quibir. Como o Castelo estava ainda encerrado ... não fomos em busca do tesouro... 😊. E atravessámos a
Portela da Azóia.
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A Várzea do Trancão, vista da Portela da Azóia. Na foto de baixo, a Quinta do Monteiro Mor |
Pouco depois das nove e meia estávamos junto ao
Parque Urbano de Santa Iria da Azóia, com a
várzea de Loures aos nossos pés. E foi para lá que descemos, cruzando o
Caminho de Fátima e de Santiago junto à velha
Quinta do Monteiro Mor.
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No Caminho de Fátima / Santiago ... sempre! |
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Várzea do Trancão, com o Cabeço da Aguieira ao fundo |
Rumo a
Santo Antão do Tojal, cruzámos o
Trancão, para logo a seguir virar a sul. O nosso destino estava cada vez mais à vista: o esporão rochoso do
Cabeço da Aguieira. Apesar do caos urbanístico que invadiu toda esta zona nos anos setenta e oitenta do século passado, o geodésico da Aguieira já se divisava no topo ... mas não imaginávamos a pequena "aventura" para lá chegarmos...
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Na Ponte Américo, sobre a Ribeira de Frielas |
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Bairro do Espinhal, sobre |
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a Várzea de Loures |
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Várzea do Trancão, do Cabeço da Aguieira. Ao fundo, a Ponte Vasco da Gama |
Chegar ao marco geodésico da
Aguieira (138m alt.) ... foi quase uma odisseia. Subindo o Cabeço do lado de
Frielas, como subimos ... demos de caras com uma propriedade privada. Ao fundo, lá estava o geodésico ... mas como que no quintal da propriedade! Como o portão estava aberto, entrámos, batemos a uma porta ... mas ninguém nos apareceu. Apesar do insólito da situação, procurando o mais possível não invadir a propriedade, contornámos as casas pelo lado nascente ... e lá chegámos!
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Cabeço da Aguieira ... com o geodésico ao fundo de uma propriedade privada... |
A foto de há 37 anos seria impossível de reconstituir, mas claro que fizemos ali a foto de grupo dos cinco "intrépidos aventureiros" que "conquistaram" a
Aguieira e a vasta panorâmica que dali se domina, de oeste a sudeste. E, precisamente quando estávamos a fazer a foto ... apareceu o dono da propriedade. Que o caminho para o marco não era por ali, que ali era privado ... mas lá lhe explicámos de onde viéramos, que tínhamos batido à porta, que tínhamos rodeado a casa ... e o diálogo tornou-se perfeitamente cordial e pacífico! Até lhe referi, precisamente ... que ali tinha estado há 37 longos anos ... referindo-me ele ... que até já ali habitava nessa altura 😊
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Foto de grupo, no Geodésico da Aguieira (138m alt.) e panorâmicas sobre a várzea de Loures e do Trancão |
O caminho de acesso ao geodésico (que obviamente não pode ser propriedade privada) era portanto afinal pelo lado nordeste ... através de estendais de roupa das múltiplas habitações que por ali proliferam, no quadro do caos urbanístico que a Câmara de Loures permitiu no último triénio do século passado. Por lá descemos ... e por lá entabulámos diálogo com alguns habitantes ... desde a senhora que nos pede para aliviar o travão de mão do carro (porque "
o meu filho me trava isto de tal maneira que ninguém o tira") até à senhora que nos pergunta de onde vínhamos. "
Do marco geodésico", respondemos; "
ai o Marco agora é médico?", recebemos como observação... 😛
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Ao longo do Cabeço da Aguieira, rumo a sul ... e a velhas quintas |
Passava entretanto do meio dia. Procurando o mais possível desviar das zonas urbanizadas, cruzámos o eixo central do esporão natural da Aguieira, onde ainda se mantém o verde ... e as ruínas de velhas quintas, como a
Quinta do Granjal, que elegemos para nosso local de almoço.
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Quinta do Granjal |
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Cabeço da Aguieira |
Almoçados, descemos à muito antiga vila de
Unhos, debruçada sobre o
Trancão e provavelmente anterior à nacionalidade. A sua
Igreja de São Silvestre é de fundação medieval, reedificada em 1668.
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Sobre Unhos e a sua antiquíssima Igreja de S. Silvestre (Igreja Matriz) |
Faltavam-nos duas "etapas" no programa que havia delineado para esta quarta feira: percorrer a margem direita do
Trancão, à vista do
Caminho de Fátima e Santiago na margem oposta, e subir ao Bairro da
Quinta do Mocho e à sua cada vez mais célebre
Galeria de Street Art. Em
Unhos descemos assim até aos caminhos rurais que ladeiam o rio, à vista de numerosos exemplares de raça equídea, nos terrenos da também antiga
Quinta da Boiça. Pena é que, mais à frente, não se possa seguir o trilho de beira rio que ainda é referido nas cartas topográficas; os terrenos foram completamente drenados e entulhados.
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Ao longo dos terrenos adjacentes à margem direita do Trancão, com passagem pela Quinta da Boiça |
Sensivelmente ao nível da antiga
Fábrica Nacional de Margarinas, abandonada, fomos assim obrigados a utilizar a estrada N506, a estrada Sacavém - Unhos, e 5 minutos antes das três da tarde estávamos junto ao viaduto da auto-estrada A1, à entrada de
Sacavém. Tudo me indicava que seria possível subir directamente dali para a nóvel Urbanização
Terraços da Ponte, onde se situa a
Quinta do Mocho ... e foi. Um íngreme caminho de pé posto, inclusive com alguns socalcos, vence em pouco tempo aqueles 30 metros de desnível ... e menos de dez minutos depois estávamos nos Terraços da Ponte.
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Subida para a Urbanização Terraços da Ponte e vista sobre o Trancão e a Auto-Estrada do Norte |
Quinta do Mocho. Só o nome do bairro suscitava apreensão e desconfiança. Como uma nuvem negra, havia um estigma associado àquele Bairro de Sacavém: crime, droga, violência. Hoje, contudo, a Quinta do Mocho - integrada nos
Terraços da Ponte - tem uma Alma nova.
A criação do Festival de arte urbana
O Bairro i o Mundo – feito com dezenas de pinturas nos prédios de habitação – foi um ponto de reviravolta na história da Quinta do Mocho. Hoje, a
GAP -
Galeria de Arte Pública - permite mostrar o que de melhor se faz em
street art em Portugal e no Mundo, sendo já a maior galeria de arte urbana a céu aberto da Europa. Ocorrem visitas guiadas com periodicidade mensal, apresentadas por quatro jovens moradores do bairro e o número de visitantes tem crescido ao longo do tempo. Ali há de tudo. As pinturas ultrapassam já a meia centena, nas fachadas e nas empenas dos prédios. O projecto tem obras de artistas portugueses e estrangeiros, e a iniciativa acabou por constituir uma nova forma de olhar o Bairro, juntando intervenção artística, requalificação e cidadania. Kali, um dos guias ... foi também o nosso cicerone durante as quase duas horas em que percorremos as ruas da
Quinta do Mocho ... a merecer uma visita mais específica.
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Algumas das mais de 50 obras de arte expostas
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na Galeria de Arte da Quinta do Mocho
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Às cinco da tarde estávamos a atravessar
Sacavém. Cruzado o
Trancão, restava-nos subir de regresso à
Bobadela, pelos passeios pedonais da Quinta da
Parreirinha. Sem dúvida uma bela jornada, que para três "manos" ainda se prolongou por uma feliz e bela confraternização ... quase até às onze da noite... 😊
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Sacavém, 17h15 ... e a jornada estava a terminar |
1 comentário:
Gosto sempre de ler e ver as fotografias destas lindas caminhadas, sobretudo quando são por terras portuguesas.
Obrigada por estes momentos de leitura.
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