|
Vale de Espinho, 10.08.2015, 17:45h
Vamos partir para uma autonomia muito especial... |
Ao longo de quase meio século, tenho percorrido as fragas e pragas dos muitos "paraísos perdidos" da Península Ibérica e não só. Percorri serras e vales, planícies e rios, dormi em palheiros, dormi ao relento, dormi no fundo de grutas por vezes inundadas de lama, dormi entre caixotes no porão de traineiras, ou em tendas armadas no alto de serras, no meio de matas luxuriantes, por vezes sob um céu repleto de estrelas, em silêncio ou ao som de velhas baladas. Ao longo dessas "aventuras", liguei-me a
Vale de Espinho e às terras raianas há mais de 40 anos, percorri-as de ponta a ponta, desbravei as velhas
bredas do contrabando, mostrei cantos e recantos destas paragens que adoptei e me adoptaram àquela que me tem acompanhado na maior aventura de todas ... a da Vida! Trouxe amigos, trouxe família, com quem partilhei as belezas do retiro onde um dia erguemos o "objecto" que mais quis ter desde sempre ... uma casa em
Vale de Espinho ... do retiro onde repousam os restos mortais e as memórias do meu saudoso Zé Malhadinhas, meu sogro.
|
Entre a Có Pequena e a Serra Madeira ... |
Mas, ao longo de tantas e tantas "aventuras" ... nunca tinha provado o sabor da noite nas "minhas" terras de
Vale de Espinho. Tendo uma casa próxima ... dormir na serra foi sendo sempre relegado para mais tarde, para outra ocasião. Essa ocasião ... chegou ontem e hoje! E que local escolheria para esta primeira autonomia em terras raianas? Não poderia ser outro ... se não o meu "santuário" das
Fontes Lares...! Lá onde o carvalho e o freixo seculares, o barroco "sagrado", as ruínas da velha casa cantam e contam histórias e estórias ... lá "
nas terras de onde se contam velhas lendas, quase negras" ... como canta o Sebastião Antunes na sua e minha "Fraga".
Uma autonomia curta, já que as
Fontes Lares distam apenas uns 4 km da aldeia, mas o objectivo não era desta vez deambular e desbravar caminhos ... o objectivo eram os sons do silêncio da noite, as cores do pôr e do nascer do Sol, o fresco que sucedeu ao calor abrasador do dia, a contemplação da eternidade no firmamento virgem ... lá ... onde "
contam velhas lendas, quase negras" ... que a minha pequena arraiana terá sido concebida...
|
19:20h - A caminho das Fontes Lares ... o Sol vai descendo no horizonte ... |
Saímos de casa ontem antes das seis da tarde. Subimos à
Có Pequena pelo carvalhal dos
Urejais, para fugir ao Sol abrasador. Sem pressas, com a minha estrela a saborear amoras selvagens, fomos subindo o velho caminho que leva ao
Cabeço Melhano, para cortarmos à direita na base da
Serra Madeira, com as espectaculares cores do Sol a começar a mergulhar no poente. Pelas sete e meia ... estávamos a entrar no "santuário".
|
... e já se avista o local "sagrado"! |
Lá estavam as "
minhas velhas botas, cardadas", que palmilharam "
léguas sem fim", descansando para a eternidade nas ruínas da velha casa que um dia ainda conheci de pé; umas desde
Maio passado ... outras
há mais de um ano.
|
Lá estão as "minhas botas velhas, cardadas"... |
A tenda ... montámo-la ao lado mesmo do barroco "sagrado". Os
fieitos foram o nosso colchão, por baixo do chão da tenda. Jantámos a ver o Sol pôr-se, o dia a esfumar-se, as sombras a preencherem o que o velho carvalho ainda não cobria. Receber aquela energia, beber aquele cheiro acre da terra, lavar as mãos e os braços na parca água da fontinha que nunca desaparece por completo, assistir ao cair da noite ... foi sublime. Rede telefónica e internet ... foram desligadas à partida.
|
Entregamo-nos às forças do barroco "sagrado"... |
|
No reino da magia... |
|
20:25h ... vai anoitecer ... |
|
21h ... e o Sol
|
|
já se pôs...
|
O dealbar do céu estrelado foi igualmente sublime. Em frente de nós estava
Arcturus, a supergigante alfa da constelação do Boeiro. Segundo algumas teorias ... os habitantes do seu sistema planetário são uma das civilizações mais adiantadas da
Via Láctea; estariam eles a observar-nos?
|
E o céu era todo nosso, como o víamos para oeste, da porta da tenda...
(Foto de Stellarium.org, para a localização das Fontes Lares e para as 23:08h de 10.08.2015) |
Os deuses - ou os Arcturianos... - enviaram-nos uma noite calma e serena, na fresquidão dos mil e poucos metros de altitude das
Fontes Lares ... até que a noite começou a dar lugar ao dia, ao som dos primeiros trinados dos pássaros que igualmente iam acordando para novos voos.
|
11.08.2015, 6:52h - Não é um pequeno almoço buffet ... mas é o melhor dos buffets... |
|
7:05h - O Sol já brilha por entre os ramos do freixo ... |
|
Estas um dia também para aqui virão descansar? ...
Água da fontinha das Fontes Lares ... água da Vida!
|
|
7:25h - Adeus barroco "sagrado" ... até à volta! |
O regresso foi pelo caminho dos
Nheres (ou Linhares), mais curto que o da ida. Os campos, outrora cheios de gente e de vida, descansavam ainda da noite, preparando-se para novo dia de braseiro. Ao fundo ... lá estava o meu
Xalmas mártir; as nuvens de fumo já se dissiparam ... mas nunca sabemos quando as mãos criminosas voltam a atacar, lá, cá, em tantos paraísos que o fogo tem destruído.
|
Mariolas ... made by me há já mais de um ano... |
|
Descendo para os Nheres |
|
E Vale de Espinho de novo à vista, entrando pelo Cabeludo |
Antes das nove da manhã estávamos em casa, já com o dia a preparar-se para a canícula ... revigorados pelo fresco da noite na serra ... lá ... no meu ... no nosso "santuário" das
Fontes Lares.
4 comentários:
Os meus parabéns ao casal, pela singela mas forte na convicção da descrição.
Um grande abraço para o Zé e um beijo à Lala.
Ana e Anacleto
Como estão felizes!
Um beijinho
Edite
É berço, leito e pegada que nada ousa apagar. O guião tem por certo nome de felicidade. Abraço LV
Um casal em "Sintonia pessoal e com a natureza" Que a saúde vos permita continuar ainda por muitos anos!... e eu que veja! Um abraço e beijo.
Enviar um comentário