Três amigos dos Caminheiros Gaspar Correia, numa bela quinta feira, combinámos fazer um reconhecimento de caminhada na zona do
Sardoal. Tratava-se de parte da GR44, a
Rota da Prata e do Ouro, um percurso de grande rota que liga os concelhos de
Vila de Rei e do
Sardoal.
Depois de um dia cinzento e de chuva, esta quinta feira acordou fria mas soalheira. E às nove e meia da manhã já estávamos perto do centro geodésico de Portugal - o vértice da
Milriça - e sobre a
Ribeira de Codes, onde a mesma se aperta no sítio do
Penedo Furado, que se admira da antiga estrada N2, entre Brescôvo e Milreu. O sítio é um espectacular Miradouro, de onde se admira uma fabulosa panorâmica sobre a ribeira e as encostas.
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Ribeira de Codes, no Miradouro do Penedo Furado, Vila de Rei, 18 de Fevereiro de 2016, 9:37h |
Lá em baixo, a ribeira corre fresca e cristalina. Para lá chegar, uma passagem no meio da rocha valeu ao sítio o nome de "
Penedo Furado". Mas antes, no miradouro, de tempos idos guardaram-se em azulejos as lendas perdidas de mouras e pastoras...
Em passo ligeiro, de pé descalço, uma jovem pastora caminhava atrás das ovelhas e das cabras. Entre assobios, toques com o cajado e latidos dos cães, encaminhou o rebanho para os lameiros verdejantes. Saboreando o dia lindo e soalheiro
- como o nosso... - deixou-se estar sentada, a ouvir o canto da água e dos pássaros. É então que distingue, no meio de todas as melodias naturais, o canto de uma mulher, afinado, exótico, numa língua que ela não conhece e não percebe. Levanta-se; devagar, dirige-se para de onde lhe parece vir o canto, melodioso e triste. Aproxima-se sem ruído, quase com medo, e espreita por entre as ervas e as árvores. Vê-a.
Sentada numa laje, com uma pele morena e dourada, cabelos negros como carvão, vestida de sedas e cetins, enfeitada com jóias preciosas ... uma moura!
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A pentear os seus lindos e longos cabelos com um pente de ouro. Tamanha maravilha a pastora nunca vira! Cobiçou o objecto, dourado e brilhante, que deslizava nos cabelos macios da Moura. Aproximou-se um pouco mais, pé ante pé. Um pau que estala, uma pedra que resvala, ela não se apercebe, mas a Moura dá conta dela. E olha na direcção dela, com os olhos grandes, escuros e tristes, como se lhe entrasse no profundo da Alma. Em silêncio, fitam-se. A jovem e alegre pastora pobre, a Moura rica e triste.
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Perante o olhar da Moura, a pastora enche-se de coragem e estende a mão, pedindo-lhe o pente. A Moura sorri, tristemente, e diz-lhe: "Queres o pente, não é?... Pois terás de te converter à minha fé. E se mais quiser,
um bezerro dourado estou a guardar, para quem por bem vier e me souber amar...". A pastora, cansada de pobreza e beatices, de padres bem vestidos e bem alimentados pelas ofertas forçadas dum povo pobre e inculto, aceita sem hesitar. A ideia do bezerro dourado aguçou-lhe a coragem, pensando no irmão que poderia amar a bela Moura. Acena com a cabeça, aceitando. A Moura levanta-se, as pernas esbeltas e morenas a vislumbrarem-se sob os véus de seda que a cobriam. Sorri e diz-lhe: "Para a minha fé poderes rezar, o céu da boca tenho de te beijar...". E, perante os olhos da pastora, a bela Moura transforma-se numa serpente, para lhe ser mais fácil entrar na boca dela. Assustada, a pastora grita e faz o sinal da cruz, virando costas e fugindo. Com um silvo, amaldiçoada e presa no encantamento, a Moura esgueira-se e desaparece por entre as rochas, deixando um sulco gravado e pintado com pó de ouro, que o tempo se encarregou de levar. A pastora, essa, fugiu a sete-pés para junto da família e, mais tarde, recuperada a coragem, voltou armada e acompanhada. Desceram pela passagem do Penedo, procuraram atrás de cada árvore e erva, vasculharam nas rochas ... mas nada. Nem sinal de Moura, de bezerro ou de tesouro. Apenas o sulco ficara como recordação da aventura e prova do medo da pastora...
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Ribeira de Codes junto ao Penedo Furado ... na senda da Moura encantada e do Bezerro dourado... |
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Cascatas da |
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Ribeira de Codes |
Sem encontrarmos vestígios da Moura encantada ou do Bezerro dourado ... subimos o curso da
Ribeira de Codes, que depois deixámos rumo a sul. E ... subimos a bom subir, rumo a
Salgueira e a
Santiago de Montalegre. Esquecida nos actuais percursos dos Caminhos de Santiago, esta freguesia atesta ainda a passagem dos Santiagueiros medievais rumo à cidade do Apóstolo.
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Ponte de Codes |
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Lameiros junto à Ribeira de Codes |
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Poços dos Mouros (ou Minas romanas?) |
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Estará aqui enterrado o Bezerro dourado?... |
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Santiago de Montalegre |
Seguiram-se as aldeias de
Lameiras,
Lobata e
Mivaqueiro. De uma parte inicial muito bonita, fomos contudo subindo e descendo depois através de eucaliptais mais monótonos, pelo que optámos por cortar alguns troços do traçado original do GR44. Já junto à
Ribeira de Andreus, eram já quase duas da tarde, com 14 km percorridos, quando chegámos a uma certa casa já nossa conhecida, rural, no meio da quietude daquele lugar tranquilo. E um dos caminhantes até tinha a chave...
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Junto à Ribeira de Andreus ... |
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o almoço foi nesta bela casinha rural! |
Foi sem dúvida um belo percurso, num belo dia de Sol de inverno. Terminada em
Andreus, da jornada pedestre ainda fariam parte mais cerca de 2,5 km junto à aldeia de
Valhascos, num pequeno troço do PR4. A câmara do
Sardoal está sem dúvida de parabéns pelo desenvolvimento dos seus percursos.
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Andreus, em fim de percurso |
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Campos próximos de Valhascos |
2 comentários:
Olá. Encontrei este relato, enquanto procurava a localização do "poço dos mouros", referida nos panfletos de percursos no Sardoal. Penso que se trata de uma antiga exploração de prata (estanho?). A fotografia do poço é muito interessante mas não encontrei mais nenhuma referência na internet. Sabem onde fica exactamente?
Obrigado. Frederico
Caro Frederico
A localização do "poço dos mouros" é a que está referida no placard fotografado, junto a Santiago de Montalegre (Sardoal). Na altura também não encontrei mais referências, mas a localização é fácil. Como diz no texto da foto, existem diversas galerias horizontais e poços verticais, devidamente assinalados no local.
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